Dar poder às áreas metropolitanas "não é fazer a regionalização"

Eduardo Cabrita diz que o país tem um “pesadíssimo custo com o caos administrativo, de desorganização e opacidade na gestão do território” e critica processo da reorganização das freguesias.

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Miguel Manso

Reforçar o poder das áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, passando o presidente e a assembleia metropolitana a serem eleitos pelos cidadãos já nas autárquicas de 2017, “não tem nada a ver com a questão da regionalização”, vincou esta quarta-feira o ministro-adjunto Eduardo Cabrita.

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Reforçar o poder das áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, passando o presidente e a assembleia metropolitana a serem eleitos pelos cidadãos já nas autárquicas de 2017, “não tem nada a ver com a questão da regionalização”, vincou esta quarta-feira o ministro-adjunto Eduardo Cabrita.

“O que está em causa é ter um nível autárquico que fale com legitimidade no espaço correspondente à sua área. Ganhamos eficiência, transparência na decisão e também responsabilização”, justificou o governante, durante um almoço-conferência subordinado ao tema “Descentralização e reforma do Estado” promovido pelo International Club of Portugal, depois de questionado se o modelo de organização defendido pelo Governo “não estará a criar mais uma estrutura de job for the boys”.

Eduardo Cabrita recordou que este nível supramunicipal é admitido pela Constituição, que “prevê expressamente a existência de modelos de autarquias locais nas grandes áreas urbanas – e só temos duas: Lisboa e Porto”. E argumentou com outra vantagem: “Se alguns destes senhores decidirem mal, nós temos uma grande arma, a do voto, e podemos substituí-los nas eleições seguintes. Hoje não temos esse poder sobre nenhuma das instituições que em nosso nome gerem milhares de milhões de euros [como é o caso dos fundos comunitários]”.

O governante lembrou que um dos pilares da reforma do Estado preconizada pelo actual Governo é a descentralização e esta “passa, antes de mais, por uma reorganização do modelo de organização do Estado”. Há, por isso, que contrariar a “tradição cultural de matriz centralista, que não é necessariamente nem de direita nem de esquerda”, mas que se tem revelado negativa porque vive de uma “cultura de capelinha”, de “minifúndio e de defesa do seu pequeno espaço de intervenção”. E isso “tem um efeito terrível sobre a eficácia dos poderes públicos”, realçou Eduardo Cabrita.

Ora, o reflexo do “cruzamento do centralismo com a lógica da capelinha” faz com que, em Portugal, ao contrário de Espanha ou França, haja uma “total ausência de coerência no modo de organização territorial do Estado”. O modelo definido pelo Governo assenta na estrutura das cinco áreas de planeamento de coordenação regional – as CCDR – e nas duas áreas metropolitanas. Eduardo Cabrita salienta ainda a questão da transparência. “Hoje ninguém sabe quem são as pessoas que decidem todos os dias milhões de euros em nosso nome. Nem são responsabilizáveis democraticamente nem administrativamente neste caos que é este mecanismo de decisão com ineficácia.”

“O que está em causa é preparar com tempo e sustentadamente o que nos permita ultrapassar a pesadíssima irracionalidade da multiplicidade de matrizes territoriais, com despesas elevadas”, disse o ministro, já olhando para a negociação do próximo quadro comunitário, que se inicia em 2018. Nessa altura, o Governo quer já ter o novo modelo de descentralização arrumado para que o país se apresente em Bruxelas com “coerência territorial”.

Tanto no caso do reforço das áreas metropolitanas como das CCDR – Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional, o Governo tem ainda o desafio da proximidade, que tem que ser enfrentado através da elaboração do plano de acção para a descentralização, já aprovado em Conselho de Ministros há um mês, que engloba grande parte dos ministérios – da Educação, Saúde, Mar, Cultura, Solidariedade - que estão a “identificar o que tem mais sentido que seja gerido a nível local”.

Eduardo Cabrita considerou também que a reorganização das freguesias foi uma “obsessão para troika ver”. “Teve pouco sentido porque a poupança foi nenhuma, a eficácia acrescida pouca e o efeito externo limitadíssimo”, apontou, acrescentando que se perdeu uma “grande oportunidade” para distinguir as freguesias com funções totalmente diferentes. E aproveitou para deixar outra crítica: “Aquilo que num só dia os contribuintes colocaram no fundo de resolução para financiar o funcionamento do Novo Banco equivale a 21 anos de transferências para todas as freguesias.”

“Aprofundar a democracia local”, diz o programa
No seu programa, o Governo prometeu “reforçar e aprofundar a autonomia local, apostando no incremento da legitimação das autarquias e das CCDR, abrindo portas à desejada transferência de competências do Estado” para níveis de decisão mais próximos das pessoas, acompanhadas do devido cheque.

Para “aprofundar a democracia local”, o programa de António Costa prevê que o órgão de gestão das CCDR seja eleito por um colégio eleitoral formado pelos membros das câmaras e das assembleias municipais (incluindo os presidentes de juntas de freguesia) da área de intervenção de cada comissão. Nas duas áreas metropolitanas (AM) de Lisboa e Porto, “para reforçar a sua legitimidade”, tanto a assembleia metropolitana como o presidente da AM passam a ser eleitos pelos cidadãos, nas eleições autárquicas (as próximas são no Outono do próximo ano). Além disso, as assembleias municipais terão os seus poderes de fiscalização política reforçados.