Numa discussão sobre as empresas alemãs, quem ganha são as PME

Portugal deve apostar nas PME e não em “gigantes globais”, defende especialista em gestão alemão.

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O modelo Mittelstand garante dois terços das exportações da Alemanha CHRISTIAN CHARISIUS/Reuters

A curiosidade que o “modelo económico alemão” desperta em economias menos competitivas não é de agora, mas continua a suscitar interrogações sugestivas. A realidade das empresas alemãs e portuguesas esteve nesta terça-feira em debate na Universidade Católica, em Lisboa, com uma pergunta de partida: o que podem as empresas portuguesas aprender com o Mittelstand, a rede de Pequenas e Médias Empresas (PME) inovadoras que servem de motor às exportações da maior economia do euro?

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A curiosidade que o “modelo económico alemão” desperta em economias menos competitivas não é de agora, mas continua a suscitar interrogações sugestivas. A realidade das empresas alemãs e portuguesas esteve nesta terça-feira em debate na Universidade Católica, em Lisboa, com uma pergunta de partida: o que podem as empresas portuguesas aprender com o Mittelstand, a rede de Pequenas e Médias Empresas (PME) inovadoras que servem de motor às exportações da maior economia do euro?

Coube ao gestor alemão Hermann Simon ensaiar uma resposta. Simon, autor do livro Hidden Champions (Campeões Escondidos) e professor honorário da University of International Business and Economics em Pequim, falou da experiência da rede de empresas competitivas que a Alemanha conseguiu construir e deixou um conselho: Portugal deve apostar na rede de PME e não em “gigantes globais”.

Não se trata de importar um modelo da Alemanha, mas de partilhar experiências. Primeira observação: “Os países, os Estados não exportam. São as empresas que exportam – e apenas a empresas mais fortes”. Mas mais fortes não é o mesmo que dizer “grandes empresas” e disso exemplo são a China e a Alemanha.

“O elevado nível de exportações é um indicador da grande competitividade a nível global. Agora, a maioria das pessoas pensa que as grandes empresas explicam o desempenho exportador de um país”. Se esta é a realidade da maioria dos países exportadores que têm empresas na lista das maiores companhias do mundo, “há duas excepções, a China e a Alemanha”. E na maior economia da zona euro, enfatizou, dois terços das exportações vêm do Mittelstand. “Sim, é preciso grandes empresas para ser um bom [país] exportador, mas, além disso, para se ser excelente, é preciso um forte segmento de médias empresas”, aconselhou.

É neste campeonato que Hermann Simon enquadra as chamadas “campeãs escondidas”, empresas nem sempre conhecidas, mas que estão num dos lugares do pódio no seu segmento de actividade no continente onde estão sediadas e que têm receitas inferiores a cinco mil milhões de euros. Portugal também as tem, sublinhou o gestor da consultora Simon-Kucher & Partners, dando como exemplo a Corticeira Amorim, a “maior empresa mundial de produtos de cortiça”, controlada pelo empresário Américo Amorim, o homem mais rico do país.

Há características transversais que, segundo Hermann Simon, distinguem estas empresas. No caso da Alemanha, a liderança é “participativa e flexível nos detalhes”. Há mais mulheres em posições de topo. Os líderes chegam ainda novos a posições de poder, havendo uma grande cultura de continuidade. Em média, nas grandes empresas os líderes permanecem naquela posição durante 5,2 anos, enquanto nas “campeãs escondidas” a longevidade chega aos 20 anos. Outra característica é o volume de oferta. Há “mais trabalho do que cabeças” para lhe dar resposta.

“Portugal deve construir o seu futuro apostando no Mittelstand e não em gigantes globais. Não vão ter gigantes como conseguiu a China ou os EUA, vaticinou.

O caminho passa por encontrar “nichos de mercado, mais do que grandes mercados”. O gestor dá uma recomendação: “Não deslocalizem a produção industrial para mercados mais baratos, procurem ficar no país”. Ao mesmo tempo, entende, “a capacidade de inovação tem de ser melhorada radicalmente, o que implica mais e melhor educação e formação”. Essa é uma realidade que Niclas Rüffer, do centro de investigação e empreendedorismo da Universidade de Mannheim, reconhece na economia alemã. “As PME investem fortemente na educação e na formação ao longo da vida dos seus recursos humanos”, vincou, na mesma conferência.

Simon regressa ao seu pensamento inicial, quando disse que quem exporta são as empresas, não os países. “A criação de empresas Mittelstand competitivas a nível global e de empresas campeãs escondidas depende dos empresários com ambição global ou, pelo menos, europeia”.