Durante dois dias o pai de Prasamsah pediu um milagre que não aconteceu

O drama de uma família de Katmandu que perdeu uma jovem de 14 anos, soterrada na própria casa depois do sismo de sábado.

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Prakash Mathema / AFP

“Ela era tudo para mim, ela não tinha feito nada de mal”, soluça.

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“Ela era tudo para mim, ela não tinha feito nada de mal”, soluça.

Na tarde de sábado, Mohat estava no emprego, quando o sismo de magnitude 7,8 que arrasou Katmandu e os seus arredores destruiu a casa onde estava a sua família, no bairro densamente habitado de Balaju.

Assim que os muros começaram a ruir, grande parte dos moradores tentou fugir rapidamente. Mas nem todos conseguiram. Só alguns minutos mais tarde é que perceberam que Prasamsah, assim como a sua tia Chandrawati Mohat, faltaram à chamada.

“Aconteceu tudo muito depressa… a casa começou a desabar a partir de um lado”, explica o pai. “Toda a estrutura tombou no chão. Durante quase dois dias, não parámos de gritar os seus nomes a partir do exterior, porque não havia qualquer possibilidade de entrar ou ver através dos escombros.”

Mohat implorava às equipas de socorro para encontrarem Prasamsah, recusando abandonar a esperança e as imediações da sua casa. As suas súplicas não foram atendidas, os socorristas temiam os riscos por causa das réplicas.

Na segunda-feira de manhã, por fim, as operações de resgate puderam começar no seu bairro, combinando a força brutal das retroescavadoras com o trabalho mais delicado de remoção dos escombros à mão.

Proteger-se das réplicas
“Alguns edifícios nas imediações apresentam fissuras e podem desabar sobre vocês”, preveniu um agente da polícia para afastar a população dos edifícios ainda em pé.

Chegados à casa da família Mohat, uma retroescavadora limpou uma parte vacilante que arriscava tombar sobre os socorristas.

A golpes de martelo e depois com a força dos seus braços, os socorristas abriram um caminho entre os escombros para poder penetrar naquilo que outrora servia como rés-do-chão da casa. Uma multidão compacta reuniu-se em redor da equipa de resgate, embora alguns vizinhos já não tivessem grandes esperanças.

“Não ouvimos nenhum barulho vindo do interior da casa desde que ela caiu”, dizia à AFP Sangeeta Mahat, outra tia de Prasamsah, enquanto um dos seus familiares a tranquilizava dizendo-lhe que tudo iria acabar bem.

“Não sei se ela está viva. Pode ser que sim, mas não percebo por que é que ela, nesse caso, não respondeu aos meus apelos.” Enquanto um dos socorristas desliza pela abertura estreita, a multidão fecha-se num silêncio profundo.

O socorrista começa a tirar alguns objectos dos escombros, entre os quais álbuns de fotos de família. “Veja esta, é a minha filha”, explica Dayaram, soprando sobre o vidro ainda intacto do retrato para afastar a poeira. “Olhe para a cara dela. Mas por que é que eu não estava lá para a fazer sair a tempo?”, interroga-se em desespero.

Assim que o pai começa a lembrar os estudos seguidos pela sua filha, um dos socorristas aproxima-se e sussurra-lhe ao ouvido. “Eles trouxeram-na. Está morta. Morta. O que é que vou fazer agora sem ela?”, diz, gemendo.

Os outros membros da família Mohat aproximam-se todos do pai.

Cerca de duas horas depois do início das operações de resgate, tudo está terminado: o corpo de Prasamsah é retirado dos escombros.

E enquanto as discussões entre os homens da família passam rapidamente para a organização da cremação, o pai tenta lidar com o choque. “Ela foi-se”, chora ele, com as lágrimas quentes a deslizarem pelo seu rosto.