Quase 17% das mulheres nunca fizeram um rastreio ao cancro do colo do útero

Exame permite detectar lesões a tempo de serem tratadas. Todos os anos surgem 1000 novos casos deste tumor em Portugal.

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A concentração no computador é uma das críticas feitas na relação médico/doente Rui Gaudêncio

Os dados, apresentados nesta segunda-feira no Instituto Português de Oncologia de Lisboa para assinalar a Semana Europeia da Luta Contra o Cancro do Colo do Útero, foram recolhidos através de um inquérito de carácter nacional, concluído em Dezembro de 2014 junto de 800 mulheres com idades entre os 30 e os 64 anos. O objectivo, adiantou Nuno Miranda, foi conhecer melhor a cobertura nacional, seja através do rastreio nacional ou de outras formas, e perceber a redução da adesão aos convites para rastreio ao cancro do colo do útero – um dos três rastreios de base populacional que se fazem em Portugal, juntamente com o do cancro da mama e cancro do colón e recto.

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Os dados, apresentados nesta segunda-feira no Instituto Português de Oncologia de Lisboa para assinalar a Semana Europeia da Luta Contra o Cancro do Colo do Útero, foram recolhidos através de um inquérito de carácter nacional, concluído em Dezembro de 2014 junto de 800 mulheres com idades entre os 30 e os 64 anos. O objectivo, adiantou Nuno Miranda, foi conhecer melhor a cobertura nacional, seja através do rastreio nacional ou de outras formas, e perceber a redução da adesão aos convites para rastreio ao cancro do colo do útero – um dos três rastreios de base populacional que se fazem em Portugal, juntamente com o do cancro da mama e cancro do colón e recto.

“Preocupou-nos nos dados que apresentámos em Novembro passado haver alguma diminuição da taxa de adesão das mulheres ao rastreio organizado e decidimos realizar uma sondagem a nível nacional”, adiantou o médico. De acordo com os dados disponíveis, ainda relativos a 2013, nesse ano foram convocadas para o rastreio um total de 185.335 mulheres e 116.408 aderiram à convocatória. Ainda assim, este número caiu em mais de 18 mil em relação a 2012, apesar de terem sido convidadas mais mulheres em 2013 do que no ano anterior.

Este rastreio é organizado no âmbito do Serviço Nacional de Saúde e dirige-se a mulheres entre os 30 e os 64 anos que são convocadas por convite. A taxa de cobertura nacional ronda os 40%. Paralelamente há mulheres que fazem o mesmo exame, solicitado directamente pelo médico de família ou no sector privado, mas estes casos são contabilizados fora do rastreio. Ainda assim, entre rastreio e outras alternativas, a cobertura do país chega aos 83%. Em quase 40% dos casos os exames são feitos no privado.

Nuno Miranda defendeu que o mais importante é fazer o exame, mas considera que o rastreio de base populacional é a solução ideal. “Assegura todo o circuito, ou seja, sei o que vai acontecer se tiver um positivo, os tempos de actuação, o método de referenciação… tem todo o circuito de tratamento organizado e já planeado e é uma ferramenta muito mais poderosa em termos de qualidade”, acrescentou.

A sondagem agora conhecida, com dados “muito positivos”, permitiu perceber precisamente que 83% das mulheres já realizaram pelo menos uma vez o exame em causa e que destas “quase todas o fazem regulamente”. Em termos de prazos, quase 60% das mulheres fazem a citologia anualmente, mas há 4% a fazerem de seis em seis meses, 24,8% de dois em dois anos e 8,5% de três em três. Nuno Miranda esclareceu que a repetição a cada seis meses é “excessiva”, recomendando que o prazo varie entre um ano e três anos, consonante a técnica utilizada no exame – pelo que as mulheres devem aconselhar-se directamente com os médicos assistentes. Quem nunca fez o rastreio argumenta que nunca foi convidada, mas também há 20% a 35% de mulheres que não querem fazer, sobretudo nas faixas etárias mais avançadas. É também entre as mais velhas que cerca de 20% das inquiridas disseram não saber como proceder.

Norte com melhor cobertura

“Temos ainda alguma população por cobrir e preocupa-nos particularmente a população mais desfavorecida do ponto de vista social, porque serão as que terão mais dificuldade em chegar a meios fora do rastreio organizado”, insistiu Nuno Miranda, que também destacou “algumas diferenças entre regiões”. A melhor taxa, de 89,8%, é encontrada no Norte, seguido por Lisboa, com 85,1%, Centro com 79,5%, Alentejo com 72,7% e Algarve com 61,8%. O rastreio nacional apenas não existe em Lisboa, mas a região consegue na mesma bons resultados, que Nuno Miranda atribui ao “esforço dos médicos de família”.

Em relação aos dados nacionais sobre a incidência da doença e a mortalidade, Nuno Miranda destacou que ambas têm melhorado mas que ainda “podemos reduzir a mortalidade quase a zero”. “Mais importante do que termos a redução da incidência é termos uma redacção da mortalidade por cancro do colo do útero. Esses dados devem-se a longos anos de esforço dos médicos de medicina geral e familiar, das administrações regionais de saúde e dos médicos privados, que ao fazerem o rastreio do cancro do colo do útero e o diagnóstico precoce de algumas lesões podem transformar lesões não curáveis em lesões curáveis”, reforçou o coordenador nacional das doenças oncológicas. Todos os anos surgem cerca de 1000 novos casos e há 300 mortes, um valor que está em linha com outros países da Europa, com a Finlândia, Reino Unido e Suécia a conseguirem os melhores resultados.

Questionado sobre se a redução da mortalidade já está a beneficiar dos efeitos da vacinação contra o cancro do colo do útero iniciada em Portugal em 2008, Nuno Miranda explicou que ainda não e que esses efeitos só serão sentidos dentro de cinco a dez anos, devido às idades de quem foi vacinado e a altura em que a doença se costuma manifestar. A vacina contra o cancro do colo do útero foi introduzida no Plano Nacional de Vacinação em 2008. Nessa altura decidiu-se arrancar a vacinação pelas raparigas que tinham nascido em 1995 e que tinham então 13 anos, por se pressupor que nessa idade ainda não teriam iniciado a vida sexual e a imunização ser, assim, mais eficaz.

A partir dessa altura foram vacinadas cerca de 50 mil raparigas por ano, num total de mais de 450 mil desde essa altura. A Direcção-Geral da Saúde fez campanhas também para as nascidas em 1991, 1993 e 1994. Entretanto o plano foi alterado e a vacina, que antes era dada em três doses, passou a ser dada em duas. A idade também recuou dos 13 anos para os 10 anos, para fazer coincidir o processo com o de outras vacinas e evitar mais deslocações ao centro de saúde.