Dificuldades financeiras da Moviflor precipitam novo pedido de insolvência

Empresa de mobiliário continua sem dinheiro para cumprir o plano de recuperação aprovado em Dezembro. Enquanto o futuro permanece uma incógnita, clientes e trabalhadores desesperam.

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Moviflor, agora denominada de Albará, tem vários pedidos de insolvência no tribunal PÚBLICO/Arquivo

Questionada sobre o novo pedido de insolvência, Teresa Albuquerque, directora-geral, sublinha que a empresa “ainda não foi citada”, mas espera resolver em breve os problemas que enfrenta.

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Questionada sobre o novo pedido de insolvência, Teresa Albuquerque, directora-geral, sublinha que a empresa “ainda não foi citada”, mas espera resolver em breve os problemas que enfrenta.

De acordo com o Sindicato dos Trabalhadores do Comércio e Serviços (Cesp), no final de Julho os trabalhadores ainda tinham em falta parte do salário de Maio. A estes valores somam-se os créditos incluídos no PER, um mecanismo alternativo à insolvência mas que também corre nos tribunais.

“A situação é incomportável”, diz Célia Lopes, dirigente do Cesp. Sem ordenado, vários funcionários “têm suspendido os contratos e há lojas que encerraram por falta de pessoal, nomeadamente em Coimbra, Aveiro e Vila Real”, continua. A concretização de um novo pedido de insolvência era, por isso, expectável. “Com o incumprimento do PER é normal que os credores ou avançassem com pedidos de insolvência ou avançassem com acções executivas. Não sabemos se este pedido foi o único, sabemos que entrou no Tribunal do Comércio de Lisboa”, continua Célia Lopes.

Aprovado em Dezembro de 2013, o plano foi assessorado pela sociedade de advogados PLMJ que, na sua página online, se refere ao processo como um dos maiores em Portugal, que iria “permitir a revitalização económica” da empresa. Incluía o pagamento dos salários em atraso, com um período de carência de seis meses depois da homologação do PER e em seis prestações “iguais e sucessivas”, o que não sucedeu até agora. Previa também um investimento de quatro milhões de euros na empresa, que também ficou por concretizar.

Desespero de clientes e trabalhadores
Enquanto o futuro permanece uma incógnita, clientes e trabalhadores desesperam. Esta semana, no site Portal da Queixa, uma reclamação de uma cliente desencadeou uma discussão, com os utilizadores a alertarem para a falta de pagamentos e a ausência de stock nas lojas. “Estou muito desiludida por me terem dito que vinham trazer o móvel em meados de Julho e, depois, terem-me ligado a dizer que não tinham móveis disponíveis. Ficou para 29 de Agosto e até agora ninguém me disse nada. A loja está fechada sem qualquer aviso e dei a entrega de 140 euros”, lamentava uma cliente. Nos comentários, trabalhadores lamentam os subsídios e salários em atraso. “Temos pena que se tenha deixado enganar...a única solução que tem é procurar um advogado pois a Moviflor não tem dinheiro nem para pagar a água e luz”, lê-se.

Na loja de Corroios, há alguns produtos com desconto e pouco mobiliário exposto. Uma família transporta o sofá preto que acabou de comprar, enquanto outro casal se dirige à recepção. Questionada sobre a situação da empresa, uma das trabalhadoras preferiu não fazer declarações. “Nós aqui não vamos falar. Como vê a loja está aberta e estamos a trabalhar e é assim que esperamos continuar”, disse.

Inácio Peres, presidente da Associação Portuguesa de Administradores Judiciais, admite “há muitos PER aprovados que, depois, não são cumpridos”. “Seguramente que é uma questão de financiamento. Continua a haver algum receio da banca em financiar as empresas nesse estado”, comenta.

A Moviflor tem mais de 1400 credores e as dívidas ascendem a 147 milhões de euros, com o fisco e a Segurança Social a encabeçarem a lista. Recorreu ao PER para recuperar financeiramente e tentar manter os 865 postos de trabalho em Portugal. Contudo, a solução prevista no plano, aprovado por 80% dos credores, passava pelo despedimento de 320 trabalhadores e pelo encerramento e substituição de cinco a seis lojas de um total de 24, bem como pelo redimensionamento das restantes.

O processo de despedimento colectivo arrancou a 14 de Janeiro deste ano e a saída de 200 trabalhadores foi formalizada um mês depois. Quando o PER foi aprovado, a empresa assegurou que seria feito “um reforço da estrutura financeira com capitais próprios, amortização do passivo, financiando meios libertos negativos” entre 2013 e 2015. O aumento de capitais próprios seria concretizado através da doação em espécie de imóveis detidos pelos accionistas, no valor de quase 1,1 milhões de euros. Catarina Remígio, que fundou a empresa aos 19 anos, é a principal accionista, detendo uma participação de 81,9%.

De fora do plano de recuperação, ficaram as operações em Angola e Moçambique, onde a Moviflor está em regime de licença e como fornecedora de produtos. No PER, a situação da empresa portuguesa é atribuída a um “acentuado desequilíbrio financeiro estrutural”, provocado por um “forte investimento e correspondente a uma deficiente cobertura do activo não corrente por capitais permanentes”. Ao mesmo tempo, foi prejudicada por “fortes restrições na obtenção de crédito, agravado pelo reembolso de várias linhas de crédito a bancos estrangeiros e impossibilidade de renovação e reforço do financiamento”.