A guerra já não mora aqui!

Ir a Sarajevo é sobretudo não esquecer a guerra. Há ainda edifícios cravados pelas balas e uma chama acesa 365 dias para lembrar as milhares de vítimas

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Cátia Castro

A guerra já não mora aqui, apenas as armas. Armin, nome fictício, comprou uma Kalashnikov numa noite de bebedeira por 250 euros. Não é que se orgulhe da aquisição, mas a AK-47 foi o símbolo da guerra na Bósnia. Conheci-o num bar, juntamente com dois turistas da Nova Zelândia e dos Estados Unidos, que lembravam a famosa música de Goran Bregovic: Kalashnikov. Desafiado a mostrar a reputada arma leva-nos até ao seu pequeno apartamento onde preserva o fuzil no quarto. Não está carregada e parece não ser usada há muito tempo, dado o estado de conservação. Passa de mãos em mãos. São tiradas fotografias. Há ânsia de materializar o momento. Afinal, qual é a probabilidade de numa viagem aos Balcãs acabar o dia a segurar uma Kalashnikov?

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A guerra já não mora aqui, apenas as armas. Armin, nome fictício, comprou uma Kalashnikov numa noite de bebedeira por 250 euros. Não é que se orgulhe da aquisição, mas a AK-47 foi o símbolo da guerra na Bósnia. Conheci-o num bar, juntamente com dois turistas da Nova Zelândia e dos Estados Unidos, que lembravam a famosa música de Goran Bregovic: Kalashnikov. Desafiado a mostrar a reputada arma leva-nos até ao seu pequeno apartamento onde preserva o fuzil no quarto. Não está carregada e parece não ser usada há muito tempo, dado o estado de conservação. Passa de mãos em mãos. São tiradas fotografias. Há ânsia de materializar o momento. Afinal, qual é a probabilidade de numa viagem aos Balcãs acabar o dia a segurar uma Kalashnikov?

Armin parece estar familiarizado com o funcionamento e explica como posicionar o corpo e usar a mira. É estranho segurar uma arma tão mortífera. Notando o meu ar pouco à vontade, pergunta-me se não serei uma espia e tranquiliza-me: "A guerra já acabou! Agora só há corrupção." A palavra que anda na boca de todos, sobretudo dos mais jovens que acusam o Governo pelo estado da nação. A Bósnia possui três presidentes e 14 ministros. Um número generoso para um país de dimensões tão pequenas.

Mas ir a Sarajevo é sobretudo não esquecer a guerra. Há ainda edifícios cravados pelas balas e uma chama acesa 365 dias para lembrar as milhares de vítimas. O Túnel da Esperança, única forma de abastecer a cidade durante do cerco de 92/95 e a cidade olímpica, palco de batalha, são reminiscências de um passado assustadoramente recente.

Não obstante à importância de cada esquina, numa cidade com as medidas certas, a Galeria Memorial de Srebrenica é indubitavelmente um dos locais mais comoventes. A 11 de Junho de 1995, nesta localidade que faz fronteira com a Sérvia, ocorreu um dos piores genocídios depois da II Guerra Mundial. O massacre de mais oito mil bósnios muçulmanos, a maioria homens e rapazes, pelas mãos do exército Bósnio da Sérvia. Com as cheias que se abateram em Maio e que fizeram subir o nível das águas, foram descobertos mais corpos.

Ver as fotos de Tarik Samarah e ouvir os testemunhos dos sobreviventes deixa-nos com um nó na garganta. Quando saímos já não somos os mesmos.

Esta crónica é a segunda de uma trilogia sobre a Bósnia. Lê também a primeira