Coliformes fecais invadem ria Formosa e colocam em perigo consumidores de bivalves

O sistema de tratamento de esgotos que descarrega em zonas de viveiros “por vezes não faz o serviço como devia fazer”, admite o presidente da Câmara de Olhão, António Pina. Além disso, assinala a empresa Águas do Algarve, há esgotos que são lançados directamente no ecossistema.

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Proprietários das casas da ilha vão manifestar-se no sábado contra as ordens de demolição Pedro Cunha/Arquivo

O presidente da Câmara de Olhão, António Pina, admite que se trata de "um sistema [de tratamento dos esgotos] antigo, que por vezes não faz o serviço como devia fazer”.

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O presidente da Câmara de Olhão, António Pina, admite que se trata de "um sistema [de tratamento dos esgotos] antigo, que por vezes não faz o serviço como devia fazer”.

No Algarve, criam-se  cerca de 80% das amêijoas produzidas em Portugal e a apanha está proibida, na maior parte das zonas, desde o passado dia 22 de Novembro.

Às pressões dos mariscadores e viveiristas para que sejam “reclassificadas” as áreas de captura de bivalves juntou-se a voz do europeputado socialista Capoulas Santos, declarando que houve “alguma precipitação” do Governo por existirem “dúvidas” sobre a forma e os locais onde foram recolhidas as amostras das análises efectuadas pelo Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA). 

No que diz respeito às medidas previstas para combater a poluição na ria Formosa, a empresa Águas do Algarve mandou efectuar o estudo de impacto ambiental com vista à construção de um novo sistema de tratamento de esgotos, destinado a substituir as ETAR de Olhão e Faro, que funcionam há 16 anos. O arranque da obra, com um custo superior a 12 milhões de euros, está previsto só para depois de 2016. A administradora da Águas do Algarve, Isabel Soares, não coloca em causa a importância do investimento, da responsabilidade da empresa de que é gestora, mas deixa um alerta: “Primeiro, a Câmara de Olhão deverá resolver o problema dos esgotos que vão directos para a ria.”

O autarca socialista António Pina, também ele viveirista (produtor de ostras), reconhece "o mau funcionamento” do sistema de tratamento de esgotos, mas considera que a proibição da apanha de bivalves, decretada pelo secretário de Estado do Mar, Manuel Pinto de Abreu, há mais de um mês, não tem relação com os coliformes fecais introduzidos nas águas da ria Formosa. “Os dados que levaram à interdição têm por base as análises aos moluscos efectuadas  pelo IPMA, não dizem respeito à análise das águas”, diz. E não haverá uma relação causa-efeito? “Haverá, mas o que conta são as análises feitas pelo IPMA aos bivalves – e a qualidade da água no espaço da ria Formosa tem melhorado, significativamente, nos últimos dez anos”, enfatiza o autarca.

Segundo a informação disponibilizada pela Águas do Algarve, no site da empresa, referente às análises da água da ETAR de Olhão, no período compreendido entre Janeiro e Maio de 2013, poderão existir riscos para a saúde pública. A quantidade de coliformes fecais chegou a atingir os 200 miligramas por litro, nos dias 11 de Fevereiro e 15 de Abril, quando os valores considerados aceitáveis não deverão ultrapassar os 87 miligramas/litro. Os indicadores mais baixos, 90 miligramas/litro, verificaram-se nos dias 6 e 20 de Maio.

Contactada pelo PÚBLICO, Isabel Soares admitiu estes dados. “Tenho a ideia que, durante 2013, nunca se verificou uma análise que estivesse em conformidade”, disse a gestora, acrescentando, no entanto, que se encontrava a gozar um curto período de férias, não podendo, por isso, confirmar esta informação em absoluto. 

Por seu lado, o presidente do município de Olhão atira a responsabilidade para cima da Águas do Algarve. “Através da AmbiOlhão, a empresa municipal responsável pela área do saneamento básico e ambiente, usamos uma forma de pressão – não pagamos taxas desde 2012.”

O eurodeputado socialista Capoulas Santos, após se ter reunido, na Câmara de Olhão, com representantes da autarquia e dos mariscadores, declarou ao PÚBLICO. “Ninguém está a dizer que o estado da ria [Formosa] é perfeito, ou que não deve haver zonas de interdição; o que nos parece é que a zonagem é manifestamente exagerada.”

Antes de avançar com pedidos de esclarecimento em Bruxelas, o eurodeputado diz pretender "dialogar com o Governo por forma a que se encontre uma situação satisfatória que minimize as consequências económicas e sociais que o despacho que foi produzido está a provocar”.

O ex-ministro da Agricultura e Pescas do PS considera que o Governo "se precipitou” na desclassificação das zonas de captura de bivalves, nomeadamente no alargamento da  zona C, que diz respeito à área de produção de mariscos que não podem ser consumidos, apenas ser utilizados pela indústria.

A decisão de restringir a apanha de bivalves surgiu na sequência de uma queixa apresentada há cerca de um ano em Bruxelas pelos espanhóis, depois da compra de 250 toneladas de berbigão exportado do Algarve para a Galiza.

Os moluscos teriam apresentado índices de contaminação que levaram as autoridades sanitárias do país vizinho a declará-los impróprios para consumo. A UE pediu esclarecimentos a Portugal, o IPMA fez análises e recentemente veio a Lisboa uma missão com o relatório técnico.

O secretário de Estado do Mar, perante o quadro que lhe foi exposto, produziu um despacho em que reclassifica as zonas de apanha de bivalves. No Algarve, mais de 90% da zona A (cuja produção pode ser consumida directamente) foi desclassificada para zona B (só aconselhado o consumo depois de depuração) e zona C (cujos mariscos aí recolhidos apenas podem ser utilizados pela indústria).