É "moderadamente provável" que Arafat tenha sido envenenado com polónio

A viúva do líder palestino diz se tratou de um "crime político". Israel desvaloriza as conclusões.

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O corpo de Arafat foi exumado no ano passado Reuters

Apesar desta elevada percentagem de certeza, os cientistas que realizaram a investigação — a Al-Jazira teve acesso ao relatótio final — dizem que os dados apontam para uma "probabilidade moderada" de o polónio 210  ter causado a morte ao líder histórico palestiniano.

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Apesar desta elevada percentagem de certeza, os cientistas que realizaram a investigação — a Al-Jazira teve acesso ao relatótio final — dizem que os dados apontam para uma "probabilidade moderada" de o polónio 210  ter causado a morte ao líder histórico palestiniano.

O relatório tem 108 páginas e foi redigido pelo Centro de Medicina Legal da Universidade de Lausanne. Diz que os níveis mais elevados de polónio foram encontrados na pélvis e nas costelas de Arafat, mas também na matéria da decomposição dos seus órgãos moles — é nestes que melhor se detecta o polónio. 

O único caso conhecido (e provado) de este elemento radioactivo ter sido usado para matar alguém é o do espião russo Alexander Litvinenko, que morreu num hospital em Londres, a 23 de Novembro de 2006.

Não há outro caso conhecido de ingestão letal de polónio 210 por seres humanos, escrevem os cientistas no relatório, para além do de Litvinenko. "Mas o seu caso não foi descrito na literatura científica e as únicas características clínicas conhecidas [deste tipo de enveneamento agudo por radiação são as descritas nos media]." Não é por isso possível estabelecer um paralelo fidedigno entre o caso do russo e o de líder palestiniano, sublinham. 

"Yasser Arafar morreu de envenamento por polónio", comentou para a Al-Jazira o cientista forense britânico Dave Barclay. O nível de polónio nas costelas de Arafat era 900 milibecquerels (a unidade de medida para radioactividade). Este valor indica que há vestígios entre 16 e 32 vezes os valores considerados normais, variando a norma de autor para autor, diz a Al-Jazira. Barclay está convencido de que se tratou de um assassínio. "Encontrámos a pistola fumegante que matou Arafat  — disse —, mas não sabemos quem a disparou."

O documento, elaborado por uma equipa suíça, francesa e russa, examinou a causa de morte do líder palestiniano, que morreu a 11 de Novembro de 2004 (faz na quinta-feira nove anos). Mas não menciona se houve intencionalidade na contaminação por polónio, ou seja, não se debruça sobre outro tema a não ser a presença do polónio.

Yasser Arafat morreu num hospital militar francês, aos 75 anos. Foi transferido para ali de Ramallah, na Cisjordânia, depois de semanas a sentir-se mal. No dia 12 de Outubro de 2004, quatro horas após ter jantado, o palestiniano começou a ter náuseas, diarreia e vómitos. Os médicos palestinianos diagnosticaram-lhe gripe, mas por não melhorar foram chamados médicos egípcios para o observar.

Estes também não puderam fazer um diagnóstico e foi decidido enviar Arafat para França, onde também não houve um diagnóstico e onde morreu de acidente vascular cerebral hemorrágico. Apesar da falta de diagnóstico, não foi feita uma autópsia.

A tese de envenenamento foi rápida a surgir, com a estação de televisão Al-Jazira a realizar um trabalho de jornalismo de investigação  — "What killed Arafat?"  — que culminaria na exumação dos restos mortais, depois de a viúva do líder palestiniano, Suha Arafat, ter sido envolvida no processo. "Foi um crime político", disse esta quarta-feira Suha, após receber o relatório. "A minha filha e eu queremos saber quem fez isto", disse a viúva, citada pelo jornal The Guardian, defendendo que a Autoridade Palestiniana tem de agir para apurar a verdade. Pediu ainda que a investigação à morte do marido seja separada do processo de paz entre os palestinianos e os israelitas.

Em Israel, o Governo desvalorizou o relatório do laboratório suíço e deixou uma advertência. "Vamos assistir a uma nova ronda de acusações, mas os palestinianos que não pensem que nos vão acusar por isto", disse o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Ygal Palmor. Considerou os dados laboratoriais "não conclusivos" e pediu contenção à Autoridade Palestiniana. "Mesmo que tivessem encontrado vestígios de polónio que indicassem envenenamento, não há provas de que esse envenenamento tenha ocorrido. Há muitas perguntas que devem ser respondidas antes de a Autoridade Palestiniana começar a tirar conclusões."