O “agricultor” e os queridos professores

Incomodou-me ouvir o Presidente da República falar de agricultura e cultura, duas áreas que ele ajudou a destruir. Parece que, segundo ele, o nosso futuro passa pela enxada e pela guitarra

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Nuno Ferreira Santos

Eu faço parte da geração pós-25 de Abril. Ou seja, não faço a mínima ideia do que será viver numa sociedade abafada pelo autoritarismo e a falta de liberdade de expressão. O que sei chegou-me pela voz de familiares que ao longo dos anos foram relatando aqueles tempos em conversas à mesa.

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Eu faço parte da geração pós-25 de Abril. Ou seja, não faço a mínima ideia do que será viver numa sociedade abafada pelo autoritarismo e a falta de liberdade de expressão. O que sei chegou-me pela voz de familiares que ao longo dos anos foram relatando aqueles tempos em conversas à mesa.

Cresci minimamente livre. Utilizei este adjectivo porque, verdadeiramente, não o somos de forma total. Até as sociedades democráticas têm a suas regras e leis. O que não é mau. Caso contrário seria uma confusão. Infelizmente, pelas características da humanidade, por vezes há que abdicar de certas liberdades individuais em prol do bem-estar comum. Sacrifícios aceitáveis…

Mas senti e provei, ao longo da minha vida ainda curta, um pouco dessa herança “fascista” (termo redutor mas esclarecedor). Em muitas coisas devo dizer. E neste contexto há dois temas — directa e indirectamente — que se enquadram na perfeição e, ao longo da semana, têm motivado várias notícias. Falo dos festejos do 10 de Junho e da greve dos professores.

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Jorge Baldaia escreve regularmente a rubrica Portugal à vista

O 10 de Junho ficou marcado por assobios e vaias aos mais altos dirigentes nacionais. Nada de admirar. Não seria de esperar outra coisa. Mas incomodou-me ouvir o Presidente da República falar de agricultura e cultura, duas áreas que ele ajudou a destruir. Parece que, segundo ele, o nosso futuro passa pela enxada e pela guitarra.

Além disso parece que começa a ganhar tiques de líder ressabiado. Quem lhe levanta a voz ou lhe chama um nome menos próprio leva com um processo judicial. Já vai no segundo. Sendo quem é deveria estar preparado para isso e, acima de tudo, saber ignorar. Mas não. Ignorar só mesmo a voz do povo e os deveres que jurou cumprir. O importante é manter os seus amigos no poder à boa maneira antiga.


Depois temos a tal da greve dos professores. Devo dizer que nunca entendi como é que esta classe profissional deixa alguém como o Mário Nogueira à frente dos seus destinos. O homem faz-me sentir náuseas. Incomoda-me. Deve ser do bigode… Mas isto é apenas um detalhe.

Sobre os professores devo dizer que respeito imenso a classe. Tenho até alguns familiares que o são ou foram. Mas sejamos honestos: outra greve? Não deve haver um ano em que eles não façam greve. A coisa está assim tão má? Olhando para os que me são próximos parece que não. Mas a greve é um direito que assiste a todos e há que o respeitar mesmo discordando.


Depois, e por arrasto, temos a indignação dos pais. Mas agora é o fim do mundo por causa dos exames? Eles fazem-nos quando tiverem de os fazer. Até deviam era estar contentes. Têm mais uns dias para estudar e rever a matéria. Pelo menos era assim que eu pensava no meu tempo.

Sabem, a minha professora da primária não tinha um bigode como o do Mário Nogueira mas andava lá perto. Usava uma régua de madeira para nos aquecer as mãos. Gostava de nos esticar as orelhas. E tinha uma cana preta que chegava a qualquer lado da sala.
Vivia amedrontado com aquela mulher. Mas apesar de discordar dos seus métodos até aprendi umas coisas. E durante a preparatória fomos considerados a melhor turma em comportamento e aproveitamento. Há coisas estranhas e até é caso para dizer que aqui o fascismo deu jeito.


Em tom de conclusão e olhando para as notícias que li constato que muitas vezes se dá demasiada atenção às coisas erradas. Faz-se mais alarido com uma greve destas do que, por exemplo, quando se ficou a saber que há cursos a fecharem no ensino superior e os financiamentos para as universidades a emagrecerem. Não devia ser assim.


Em Portugal devia-se olhar para exemplos como os da Turquia, onde há quem lute para manter os seus direitos, ou da Grécia, com as pessoas a manifestarem-se contra o fecho da ERT. Mas não. Aqui ignoram-se decisões do Tribunal Constitucional ou ouve-se um presidente dizer barbaridades e ninguém faz nada. Ou as pessoas não querem mesmo saber ou então os sofás portugueses devem ser muito confortáveis.