Não podemos abdicar da nossa responsabilidade!

O primeiro encontro, no contexto dos cuidados de saúde, é frequentemente com aquele que não conheço. O outro é quase sempre um desconhecido; por vezes é apenas um corpo que surge à minha frente, maltratado pelo acidente; ou uma pessoa que não conheço, de quem sei apenas o nome e história clínica; frequentemente é uma pessoa que se dá a conhecer e se afirma vulnerável, vítima inocente do sofrimento que a alcançou, que me lança um apelo a que devo responder…

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O primeiro encontro, no contexto dos cuidados de saúde, é frequentemente com aquele que não conheço. O outro é quase sempre um desconhecido; por vezes é apenas um corpo que surge à minha frente, maltratado pelo acidente; ou uma pessoa que não conheço, de quem sei apenas o nome e história clínica; frequentemente é uma pessoa que se dá a conhecer e se afirma vulnerável, vítima inocente do sofrimento que a alcançou, que me lança um apelo a que devo responder…

Há muito percebi que este encontro, entre mim e aquele que me disponibilizo a ajudar, não é um encontro qualquer. É certo que é provocado por mim, pelo facto de exercer esta profissão e pelo outro, que me pede ajuda. Mas começa sempre por ser um encontro desigual, entre mim, que tenho o poder de ajudar e uma pessoa que precisa de ajuda. Mas porque precisa manter-se um encontro de pessoas, carrega a exigência ética da superação da desigualdade inicial, elevando-o a encontro de irmãos, no qual, qualquer ação ou omissão afetará um e outro.

Na maior parte das vezes, a pessoa que procura um serviço de saúde confia-se ou confia-me aquilo que tem de mais precioso – a sua vida e a sua saúde – a mim, que desconhece. E espera que seja capaz de a ajudar, com todo o respeito que a sua dignidade merece. E, além do conhecimento científico e competências técnicas para tratar a doença, espera que eu seja uma pessoa capaz de compreender o sofrimento que a afeta, capaz de cuidar dela, da sua vida, no seu melhor interesse.

Cuidar é preocupar-se com o outro! É expressão de humanidade e característica identificadora do desenvolvimento humano que cada um consegue. Por isto, não é apenas um privilégio ou característica de uma profissão. Cuidamos, não porque somos mães ou amigos, enfermeiros ou médicos … mas porque somos seres humanos e está em nós cuidar – preocuparmo-nos com os outros. Mas, na verdade, se todas as pessoas são capazes de cuidar, nem todos o fazemos do mesmo modo. Esta capacidade, na medida em que pode ser desenvolvida, pode também ser suprimida ou reprimida, por circunstâncias ou experiências de vida, que promovem o seu
crescimento ou combatem a sua expressão.

Por tudo isto, não podemos abdicar da nossa responsabilidade de promover o desenvolvimento integral das pessoas, a par da competência técnica, científica e ética que hoje se exige para os profissionais de saúde.

Margarida Vieira é docente do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Católica Portuguesa, no Porto, e escreve segundo o Acordo Ortográfico.