Como os galos perderam o pénis

Equipa descobriu que há uma morte celular programada durante o desenvolvimento embrionário.

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O futuro pénis do galo, a rosa, durante o desenvolvimento embrionário, antes de regredir A.M. Herrera e M.J. Cohn/Universidade da Florida

Apenas os machos de 3% de todas as espécies de aves desenvolvem um pénis capaz de penetrar na cloaca das fêmeas das suas espécies. Nesse grupo de espécies estão o pato, o ganso ou o cisne. Nas outras, a reprodução dá-se através do contacto entre as cloacas dos machos e das fêmeas.

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Apenas os machos de 3% de todas as espécies de aves desenvolvem um pénis capaz de penetrar na cloaca das fêmeas das suas espécies. Nesse grupo de espécies estão o pato, o ganso ou o cisne. Nas outras, a reprodução dá-se através do contacto entre as cloacas dos machos e das fêmeas.

Martin Cohn e a sua equipa foram tentar perceber o que acontecia durante o desenvolvimento destas aves. Para isso compararam os embriões dos galos com os dos patos-bravos durante o seu desenvolvimento.

“A regulação e o balanço entre a proliferação das células e a morte celular é essencial para controlar o crescimento e o desenvolvimento”, explica o cientista em comunicado. “Demasiadas divisões celulares e pouca morte celular podem levar ao crescimento em excesso ou desregulado, como no caso do cancro. Se o balanço vai na direcção contrária e há uma deficiência celular ou excesso de morte celular, então isso pode resultar no subdesenvolvimento ou até na ausência de um órgão.”

Quando olharam para o desenvolvimento das duas aves, verificaram que no início, o desenvolvimento do pénis acontecia normalmente nos galos. Mas a partir de uma dada altura esse crescimento parava e o órgão tornava-se rudimentar.

A equipa descobriu que este fenómeno era causado por um gene que se activava na ponta do futuro pénis do embrião do galo, o que não acontecia no pato-bravo. O gene, chamado Bmp4, codifica para uma proteína que leva à morte celular não deixando o órgão crescer.

“A nossa descoberta mostra que a redução do pénis durante a evolução das aves ocorre pela activação de um mecanismo normal que resulta no programa de morte celular, mas que aqui aparece num local novo, a ponta do pénis emergente”, explica Martin Cohn. Os cientistas experimentaram ainda impedir a expressão deste gene naquela região do embrião do galo e verificaram que os pénis cresciam normalmente nos embriões mutados.

A equipa não sabe qual a razão para este fenómeno ter surgido durante a evolução. O pénis é talvez o órgão com mais variações e com as formas mais bizarras entre os animais do reino animal. O gene Bmp4 é muito usado na formação dos órgãos e estruturas durante o desenvolvimento embrionário, e poderá ter aparecido aqui por acaso, não se obtendo nenhuma função objectiva. Mas a equipa sugere um resultado benéfico a nível destas espécies de aves em que os machos não têm pénis: como a fecundação se dá sem penetração, as fêmeas acabam por ter um maior controlo na escolha dos seus parceiros.