Tribunal de Contas considera ilegal acordo entre governo da Madeira e IPSS Oceanos

Associação geria o Atalaia Living Care, propriedade de uma empresa de que é administrador Miguel Tropa, genro de Jardim.

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Na última década, os idosos a viver sós ou em companhia com outros idosos aumentou 28% Adriano Miranda/Arquivo

No relatório da auditoria divulgado esta quinta-feira e enviado para o Ministério Público para adequado procedimento jurisdicional, a secção regional do Tribunal de Contas (TC) responsabiliza o presidente e demais membros do governo da Madeira pela “inobservância dos princípios da imparcialidade, da proporcionalidade, da publicidade, da transparência e da não discriminação, da qualidade e da economicidade, da igualdade, da concorrência, da imparcialidade e da boa-fé”, aquando da contratação da Oceanos.

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No relatório da auditoria divulgado esta quinta-feira e enviado para o Ministério Público para adequado procedimento jurisdicional, a secção regional do Tribunal de Contas (TC) responsabiliza o presidente e demais membros do governo da Madeira pela “inobservância dos princípios da imparcialidade, da proporcionalidade, da publicidade, da transparência e da não discriminação, da qualidade e da economicidade, da igualdade, da concorrência, da imparcialidade e da boa-fé”, aquando da contratação da Oceanos.

Neste caso, frisa, a celebração do acordo de cooperação não foi antecedida de um procedimento concorrencial, nomeadamente concursal, portanto à revelia dos princípios identificados na contratação pública.

O tribunal põe em causa a “debilidade do processo”, a sua “sumária e deficiente avaliação” e a “exequibilidade da candidatura” apresentada pela Oceanos IPSS que carecia de integrar valências e/ou conhecimentos detidos ou desenvolvidos pela Medical Holdings International (MHI) para que pudesse cumprir cabalmente o acordo de cooperação e o desenvolvimento dos serviços que se obrigou a prestar”. Concluiu ainda pela “insustentabilidade financeira dessa operação”.

Hotel transformado
O tribunal apurou também que a despesa emergente desse contrato, que fixava uma comparticipação anual de 4,6 milhões de euros, foi autorizada por resolução do plenário do governo "sem cabimento na correspondente rubrica orçamental". Por isso imputa responsabilidade susceptível de ser sancionada financeiramente a todos os membros do executivo madeirense e ao presidente do Instituto de Administração da Saúde e Assuntos Sociais (Iasaúde), neste caso por extravassar as suas competências.

Em sede do contraditório, Alberto João Jardim e os secretários regionais alegaram que “a matéria controvertida não se inseria nas respectivas áreas de governação", tendo o titular dos Assuntos Sociais assegurado que o contrato cumpria as formalidades legais. Face a esta recusa de responsabilidade, o TC lembra que "o conselho de governo é um órgão colegial, cuja vontade é formada pela confluência da vontade individual de cada membro”, acrescentando que “a única forma de os titulares de órgãos colegiais ficarem isentos da responsabilidade que possa eventualmente resultar dessa deliberação será fazendo constar em acta o seu voto vencido e as razões que o justifiquem”.

O Atalaia Living Care foi um projecto desenvolvido pela Oceanos, associada à MHI. Estava instalado no antigo hotel Pestana Atalaia, edifício que agora é propriedade da sociedade Alerta Green Imobiliária, SA, do emigrante António Saramago. Esta empresa, de que é administrador Miguel Tropa, advogado da Oceanos e genro de Jardim, reclama daquela instituição rendas em valor superior a quatro milhões de euros.

O hotel tinha sido adquirido ao grupo Pestana por 15 milhões de euros e foi adaptado para alojar pessoas mais velhas a necessitar de cuidados de saúde diários e permanentes. Depois de garantir a comparticipação do Iasaúde, a Oceanos fez um contrato de reserva de quartos com a sociedade proprietária do edifício, mediante a disponibilização de 118 quartos pelo pagamento mensal de 126 mil euros. Em Julho de 2012, o governo regional tinha por pagar a totalidade da facturação emitida, no montante de 1,7 milhões de euros, “em clara inobservância do prazo fixado” pelo Código dos Contratos Públicos, apurou o TC.

Alegando problemas financeiros, divergências entre sócios e a quebra da qualidade de serviços, o governo regional decidiu, no final de 2012, transferir os 120 utentes do Atalaia para instituições e centros de saúde, o que gerou forte contestação. Depois denunciou unilateralmente  o acordo celebrado com a Oceanos a 25 de Fevereiro de 2011. Esta terça-feira o Tribunal Judicial de Santa Cruz sentenciou a declaração de insolvência desta IPSS, estando marcada para 26 de Agosto uma assembleia de credores, entre os quais estão 108 trabalhadores com salários em atraso.