A democracia, a crítica e o sofá de Freud
Quem polemiza, justa ou injustamente, fica com travo amargo.
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Quem polemiza, justa ou injustamente, fica com travo amargo.
Quem escreve ou fala publicamente não escreve só por escrever, nem fala só por falar. Por diletantismo! Quer transmitir mensagens e ideias. De contrário, escreveria um diário íntimo ou usava um gravador para se ler ou se ouvir, ou mastigava silêncio que é ainda melhor.
Se a escrita ou a fala se dirigem à crítica social ou política vão gerar o tal travo amargo no criticado ou atingido, semeiam odiozinhos, coisas mesquinhas, muito pequeninas! Dissimulados de variadas formas.
Num espaço democrático, a participação cívica e política envolve, quase sempre, uma posição crítica, de discordância, onde se ponderam os dois pratos da balança: o opinador, os destinatários desta, os defensores e os adversários de um e outro.
É a participação cívica e política dos cidadãos na vida e enriquecimento democráticos.
É o “a, b, c” da dialéctica de um mundo democrático que, por isso mesmo, cada vez mais se sente em evolução e participativo.
A crítica pode operar-se com veemência, contundente, mordaz, mas deve ser lida como tal, crítica, modo diferente de ver e encarar as coisas, os problemas, os desafios que se colocam à República, à comunidade e ao indivíduo.
Bate o ponto aqui.
Uma palavra a mais, um dito a menos e infeliz, uma referência mais picante, odiozinhos antigos e dissimulados são erigidos a ofensas gravíssimas à honra e à dignidade.
Se o escriba avança a opinar discordantemente por aí fora, toda a honra fica abalada de dor, sofrimento e sangue.
A ofensa sobe quanto mais certeira foi a imputação!
Falam aí a ausência de poder de encaixe, a incapacidade de aceitação da crítica, a fragilidade das convicções, ao cabo e resto, défice de formação democrática.
O juiz penal é chamado para sarar a honra ofendida!
Se Eça de Queiroz cá voltasse ( que jeito nos dava!), não haveria espaço em qualquer majestoso tribunal para arquivar os processos com que teria de alombar, cárcere onde o metessem, conta bancária que suportasse as indemnizações a pagar. Tal era contundente a sua crítica, corrosiva e certeira a ironia.
Mediocridades e pequenez! Convocar o juiz penal porque fulano ou sicrano no comentário ou opinião críticos não foi de destreza literária, causam grande fastio.
Há sábios de barriga a abarrotar de “ciência anónima, com vaga noção de tudo e conhecimento de nada” . Por aí pululam. Os “ressequidos”, Eça dizia. Não beberam uma gota “daquele leite de humana bondade..." de que falava o adorável Charles Dickens.
Atiram a pedra, ocultam a manápula!
Tomem o sofá de Freud!
Procurador-geral adjunto