Balanço com memória

Farei deste um ano excelente e, se me permitem o conselho, façam o mesmo. No final, teremos um conjunto de governantes a dizerem que foram eles que conseguiram e até a ficar com uma boa parte do que criámos, mas não há problema.

Quanto ao ano passado, comecemos pelo outro lado do Atlântico. O que o Presidente Obama chamou “acordo” ao problema que se passou a denominar “precipício fiscal”, que impunha um aumento de impostos e uma redução da despesa pública para 2013, terá sido tudo menos um sucesso. Só mesmo um político de invulgar capacidade consegue, na mesma comunicação, e com ar satisfeito, transmitir que passa a funcionar um pré-acordo que não satisfaz ninguém mas que permitirá pensar nas medidas que possam neutralizar os efeitos negativos do mesmo. Dos números nem vale a pena falar, o deficit anual americano continua perto de 1,3 biliões de dólares, coisa que, pela sua grandeza, a maioria das pessoas se perde nas convenções e nos zeros. Os americanos chamam-lhe triliões, o melhor é mostrar o número: são $1.300.000.000.000. Como costumo dizer, já me chegava o dobro para viver descansado, mas, brincadeiras à parte, nenhum governante resolverá esta situação nunca, simplesmente porque seria politicamente um suicídio anunciar qualquer conjunto de medidas que invertesse esta situação. A questão é sempre a mesma: será sustentável? Aqui estou em desacordo com a maioria dos economistas. Por muitos anos, será, sim, sustentável. Enquanto a economia americana for a maior do mundo, será entendido como uma característica da sua economia; quando passar a ser a China, como entretanto este país é o que mais compra (não tem outro remédio) dívida americana, continuará a sê-lo. Isto não é falso optimismo: os Estados, como as empresas e como as pessoas, não deixam de ser sustentáveis porque estão falidos ou porque perdem dinheiro, só o deixam de ser quando perderem a capacidade de crédito.

Do lado da Europa, as coisas não são melhores nem piores, têm é um efeito diferente nas pessoas das zonas mais pobres ou mais endividadas. A grande diferença não tem a ver com a conjuntura económica, mas sim com uma política monetária bem distinta da americana e com um modelo que só passará a federalista quando os políticos de cada país se deixarem de um nacionalismo e de um patriotismo que cada vez fazem menos sentido económico. Aos políticos, continua a missão de vendedores de banha da cobra, divididos nos mesmos três grupos a que nos habituámos há uns anos: os que estão no poder, os que irão estar nas próximas eleições e os outros que nunca serão eleitos. Os primeiros continuarão a dizer que o pior já passou e que a crise se transformará em crescimento e prosperidade; os segundos a dizer que tudo está mal e a prometerem diferente quando forem eleitos, o que não farão; os últimos com ideias mais radicais, aparentemente até mais amigas dos mais desprotegidos, mas que esquecem a parte da credibilidade ao ponto de poucos os levarem a sério. Certo é que o desemprego na Europa já ronda os 12%, e tanto a Grécia como a nossa vizinha Espanha já reportaram que os seu bancos estão descapitalizados e com valorações que chegam a ser negativas. Somando tudo, temos então uma crise que dizem estar a acabar, mas com um desemprego que não pára de crescer numa economia com os bancos insolventes. Para 2013, é fácil de adivinhar, a crise bancária de 2008 vai parecer uma brincadeira de meninos, quando comparada com o que ainda vamos assistir, parte de algumas economias vai pura e simplesmente implodir e só gerarão valor os que se ajustarem em tempo útil a estas mudanças.

De Espanha, vêm os meus maiores receios para 2013. Lembro bem que, no primeiro semestre de 2012, o primeiro-ministro Mariano Rajoy, político forçosamente reconhecido, já que foi reeleito presidente do Partido Popular com 97,56% dos votos, negava que o seu país ou os bancos que nele operavam precisassem de alguma ajuda externa. Lembro, em particular, a forma como acusava os que diziam o contrário de não perceberem nada do que falavam. Claro que voltamos ao mesmo. Acredito, talvez ingenuamente, que esta gente é bem intencionada no que diz, sabe que não tem razão, sabe que mente, mas acredita, e em abono da verdade é bem assim, que, se transmitir confiança, alguém vai continuar a emprestar-lhe o que ela precisar. Claro que depois houve um banco que revelou algumas das práticas de cosmética de contas, assumindo que os lucros reportados, afinal, não eram a sério, e foi a gota de água. Lá foi o Rajoy pedir 100 mil milhões de euros para tapar a ponta do icebergue e voltou com um discurso bem diferente: que a economia espanhola estava com um problema grande e que as medidas de austeridade passavam a ser prementes. Contra mim falo, que, se votasse naquele país, o mais provável era ser um dos que o escolhiam, mas sejamos sérios: é este tipo de gente que salvará a Europa? Valha-nos... qualquer outra coisa!

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Quanto ao ano passado, comecemos pelo outro lado do Atlântico. O que o Presidente Obama chamou “acordo” ao problema que se passou a denominar “precipício fiscal”, que impunha um aumento de impostos e uma redução da despesa pública para 2013, terá sido tudo menos um sucesso. Só mesmo um político de invulgar capacidade consegue, na mesma comunicação, e com ar satisfeito, transmitir que passa a funcionar um pré-acordo que não satisfaz ninguém mas que permitirá pensar nas medidas que possam neutralizar os efeitos negativos do mesmo. Dos números nem vale a pena falar, o deficit anual americano continua perto de 1,3 biliões de dólares, coisa que, pela sua grandeza, a maioria das pessoas se perde nas convenções e nos zeros. Os americanos chamam-lhe triliões, o melhor é mostrar o número: são $1.300.000.000.000. Como costumo dizer, já me chegava o dobro para viver descansado, mas, brincadeiras à parte, nenhum governante resolverá esta situação nunca, simplesmente porque seria politicamente um suicídio anunciar qualquer conjunto de medidas que invertesse esta situação. A questão é sempre a mesma: será sustentável? Aqui estou em desacordo com a maioria dos economistas. Por muitos anos, será, sim, sustentável. Enquanto a economia americana for a maior do mundo, será entendido como uma característica da sua economia; quando passar a ser a China, como entretanto este país é o que mais compra (não tem outro remédio) dívida americana, continuará a sê-lo. Isto não é falso optimismo: os Estados, como as empresas e como as pessoas, não deixam de ser sustentáveis porque estão falidos ou porque perdem dinheiro, só o deixam de ser quando perderem a capacidade de crédito.

Do lado da Europa, as coisas não são melhores nem piores, têm é um efeito diferente nas pessoas das zonas mais pobres ou mais endividadas. A grande diferença não tem a ver com a conjuntura económica, mas sim com uma política monetária bem distinta da americana e com um modelo que só passará a federalista quando os políticos de cada país se deixarem de um nacionalismo e de um patriotismo que cada vez fazem menos sentido económico. Aos políticos, continua a missão de vendedores de banha da cobra, divididos nos mesmos três grupos a que nos habituámos há uns anos: os que estão no poder, os que irão estar nas próximas eleições e os outros que nunca serão eleitos. Os primeiros continuarão a dizer que o pior já passou e que a crise se transformará em crescimento e prosperidade; os segundos a dizer que tudo está mal e a prometerem diferente quando forem eleitos, o que não farão; os últimos com ideias mais radicais, aparentemente até mais amigas dos mais desprotegidos, mas que esquecem a parte da credibilidade ao ponto de poucos os levarem a sério. Certo é que o desemprego na Europa já ronda os 12%, e tanto a Grécia como a nossa vizinha Espanha já reportaram que os seu bancos estão descapitalizados e com valorações que chegam a ser negativas. Somando tudo, temos então uma crise que dizem estar a acabar, mas com um desemprego que não pára de crescer numa economia com os bancos insolventes. Para 2013, é fácil de adivinhar, a crise bancária de 2008 vai parecer uma brincadeira de meninos, quando comparada com o que ainda vamos assistir, parte de algumas economias vai pura e simplesmente implodir e só gerarão valor os que se ajustarem em tempo útil a estas mudanças.

De Espanha, vêm os meus maiores receios para 2013. Lembro bem que, no primeiro semestre de 2012, o primeiro-ministro Mariano Rajoy, político forçosamente reconhecido, já que foi reeleito presidente do Partido Popular com 97,56% dos votos, negava que o seu país ou os bancos que nele operavam precisassem de alguma ajuda externa. Lembro, em particular, a forma como acusava os que diziam o contrário de não perceberem nada do que falavam. Claro que voltamos ao mesmo. Acredito, talvez ingenuamente, que esta gente é bem intencionada no que diz, sabe que não tem razão, sabe que mente, mas acredita, e em abono da verdade é bem assim, que, se transmitir confiança, alguém vai continuar a emprestar-lhe o que ela precisar. Claro que depois houve um banco que revelou algumas das práticas de cosmética de contas, assumindo que os lucros reportados, afinal, não eram a sério, e foi a gota de água. Lá foi o Rajoy pedir 100 mil milhões de euros para tapar a ponta do icebergue e voltou com um discurso bem diferente: que a economia espanhola estava com um problema grande e que as medidas de austeridade passavam a ser prementes. Contra mim falo, que, se votasse naquele país, o mais provável era ser um dos que o escolhiam, mas sejamos sérios: é este tipo de gente que salvará a Europa? Valha-nos... qualquer outra coisa!

“Mas prontos!”, balanço é isto mesmo, ver no que o passado nos transformou. Por pior que isso seja, há que saber lê-lo, atender no que nos beneficiou e no que nos prejudicou, e, o mais importante, tirar daí a melhor estratégia para o período seguinte. Considero e respeito muito os que defendem que a solução passa por reivindicar e arranjar forma de demitir o Governo. Poderão ter a razão toda, nem penso nisso. Na minha opinião, é melhor que esperem sentados. Outros viriam para nos governar, com a mesma garantia dos que lá estão hoje, de todos os outros que me lembro e ainda dos que ouvi falar. Cada vez estou mais convencido de que a solução não virá dos políticos e muito menos dos direitos que achamos estabelecidos por esses. É utópico acreditar que um dia mude. A solução virá sempre do que fazemos, as empresas e as instituições onde colaboramos, a família, os amigos, e algures um nicho ou um grande mercado serão os nossos principais parceiros e só daí teremos algum sucesso na nossa cruzada.

Para 2013, teremos uma conjuntura económica bem mais complexa, mas deixem-me abusar de mais umas evidências: a economia mundial vai crescer, muito provavelmente perto dos 3%, teremos os mesmos políticos ou outros parecidos a dizer que estamos a conseguir dar a volta, continuaremos a ouvir o Banco Central Europeu a dizer que compra a dívida pública que for necessário e a Reserva Federal Americana a dizer que emite moeda até o desemprego descer mais um bocadinho e ainda poderemos contar com as empresas, os gestores e os empresários, que vão continuar a gerar valor. Na minha opinião, acredito mesmo que tudo isto será bom, os juros da dívida pública continuarão a baixar, e mesmo os de prazo mais longo já estão abaixo dos 7%, que muitos consideravam a barreira do sustentável. Pelo lado das empresas, vejo excelentes exemplos. De entre as cotadas portuguesas, destaco nomeadamente a Galp e a Jerónimo Martins, com crescimentos expectáveis muito superiores ao que seria normal nos mercados naturais onde actuavam.

Em conclusão e resumo, sentimos um 2012 mau e sabemos que 2013 tem todas as razões para ser pior, dos governantes temos grandes certezas com o que contamos, identificámos o principal risco externo do nosso país vizinho, temos expectativas na descida nas taxas de juro e na valorização das empresas que melhor se adaptaram à conjuntura. Estamos então preparados para os festejos e para o novo ano. Se podemos apenas especular com o que temos, se temos que trabalhar mais um pouco, se investimos com mais ou menos risco, se temos que criar o nosso emprego, bom, isso dependerá de cada um de nós e do que acreditarmos que nos fará mais felizes. Outros continuarão nos lamentos, talvez pela mesma razão.

Em memória do meu avô, farei deste um ano excelente e, se me permitem o conselho, façam o mesmo. No final, teremos um conjunto de governantes a dizerem que foram eles que conseguiram e até a ficar com uma boa parte do que criámos, mas não há problema, os nossos netos hão-de saber e seguir o exemplo.