“Não fui a primeira pessoa no mundo a abraçar um polícia”

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Essa imagem está a correr nas redes sociais e alguns até consideram que se tornou um símbolo José Manuel Ribeiro/Reuters

Tem 18 anos, é de Lagos e nunca tinha ido a uma manifestação. Não acredita em partidos, nem no dinheiro — “O dinheiro só gera maus sentimentos, só gera ódios.” Adriana Xavier é o nome da jovem que no sábado saiu à rua naquele que foi o seu primeiro protesto. As câmaras dos fotógrafos apanharam-na em frente aos escritórios do Fundo Monetário Internacional (FMI), em Lisboa, num ambiente de tensão. Havia manifestantes a atirar tomates. Um petardo tinha rebentado havia pouco. Adriana aproximou-se de um polícia e abraçou-o.

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Tem 18 anos, é de Lagos e nunca tinha ido a uma manifestação. Não acredita em partidos, nem no dinheiro — “O dinheiro só gera maus sentimentos, só gera ódios.” Adriana Xavier é o nome da jovem que no sábado saiu à rua naquele que foi o seu primeiro protesto. As câmaras dos fotógrafos apanharam-na em frente aos escritórios do Fundo Monetário Internacional (FMI), em Lisboa, num ambiente de tensão. Havia manifestantes a atirar tomates. Um petardo tinha rebentado havia pouco. Adriana aproximou-se de um polícia e abraçou-o.

Essa imagem está a correr nas redes sociais e alguns até consideram que se tornou um símbolo. Publicada em vários sites internacionais, mostra a jovem, de cabelos longos, abraçada a um agente do corpo de intervenção de capacete e viseira fechada.

José Manuel Ribeiro, fotojornalista da Reuters, estava no local. “Saí da Praça José Fontana [onde começou a manifestação] e tinha decidido que ficaria junto aos escritórios do FMI porque achava que seria ali que podia acontecer alguma coisa mais grave. A certa altura vi um vulto a dirigir-se a um polícia e pensei: ‘É agora!’ Rodeei outro agente e fotografei. Não estava à espera que fosse um abraço”, conta. Enviou a imagem. Continuou a trabalhar. E só mais tarde percebeu que tinha sido destacada pela Reuters. “Quando cheguei a casa de madrugada percebi que tinha sido publicada na Nova Zelândia” e no dia seguinte viu-a nas páginas do jornal brasileiro O Globo.

“Decidi à última juntar-me à manifestação” contra as medidas de austeridade, conta, por seu lado, Adriana Xavier em entrevista telefónica ao PÚBLICO. “Estava a gostar de ver o povo unido, apesar de eu não ser de gritar. Mas é bonito ver o povo unido por uma causa.”

Quando percorria com centenas de milhares de outras pessoas a Avenida da República percebeu “que havia confusão” num certo ponto. “Soube então que estava ao pé do FMI. Aproximei-me porque tinha curiosidade. Estava só ali, a observar a reacção dos polícias porque sei que por detrás deles há muito poder e que eles são marionetas. Estão ali porque recebem dinheiro para alimentar os filhos. Às vezes vemos os polícias partir para a violência e aproximei-me porque queria perceber o que é que eles eram capazes de fazer. Porque eles também são o povo, também estão a ser prejudicados com as medidas [do Governo].”

A certa altura, fixou-se num agente em particular. “Já tinha sido lançada uma bomba de fumo”, diz. “Já tinha olhado para ele, quando ele ainda não tinha a viseira. Tinha um olhar triste. Mas tinha um olhar aberto também. Sou muito sensível nestas coisas”, conta a aluna de Artes Visuais. “Fui ter com ele e perguntei-lhe: ‘Por que é que vocês estão aqui? Para provocar alguma reacção má?’ Ele disse: ‘É o meu trabalho.’ Depois perguntei: ‘Não gostava de estar deste lado?’ E ele não respondeu. Olhou em frente.”

Adriana voltou a afastar-se, os gritos à sua volta continuavam, depois pensou: “Pensei uma, duas, três vezes. E aproximei-me dele. Acredito que se der amor, recebo amor. E foi por isso. Queria ter um gesto de amor. Queria ter uma reacção boa naquele momento, não quero ter sentimentos maus. Aproximei-me dele, abracei-o. Ele ficou estático. Depois afastou-se suavemente. Não me afastou, afastou-se.”

A aluna que só não concluiu este ano o 12.º ano por causa da disciplina de Geometria Descritiva acha que não fez nada de especial: “Não fui a primeira pessoa no mundo a abraçar um polícia. Já tinha visto outras imagens assim.” Diz que se limitou a querer passar uma mensagem de amor. “Aquela imagem é o que eu sou. Acredito que em breve vai haver uma mudança. Espiritual.”

José Manuel Ribeiro não estava à espera de receber tantos comentários por causa da fotografia que fez — uma fotografia que tem qualquer coisa de “A bela e o monstro”, com “o polícia com aquela luva grossa a agarrar naquele bracinho”. Mas garante que não é raro que isso aconteça — fixa-se uma imagem de um momento sem saber minimamente o impacto que ela vai ter quando chegar aos jornais, à Internet. Há, no entanto, excepções, e ele próprio lembra-se de uma: “Lembro-me de uma fotografia de Hugo Correia [também da Reuters], de uma jornalista da France Press a ser batida por um polícia no Chiado, na greve geral, em Março. Olhei para aquela fotografia, que mostra exactamente o contrário desta imagem, e pensei na altura: ‘Isto vai dar voltas!” Mesmo assim, deu “ainda mais voltas” do que estava à espera.

Notícia corrigida às 16h38.

"dezenas de milhares" passou a "centenas de milhares".

Notícia actualizada às 18h48.

Acrescenta declarações do fotojornalista José Manuel Ribeiro.