Já é possível atacar proteína fulcral para a bactéria da tuberculose

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A proteína DprE1 com o antibiótico BTZ043 ao centro João Neres

A descoberta pode ajudar a combater uma das piores doenças actuais, que em 2010 matou 1,4 milhões de pessoas.

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A descoberta pode ajudar a combater uma das piores doenças actuais, que em 2010 matou 1,4 milhões de pessoas.

A DprE1 é uma enzima importante para a bactéria Mycobacterium tuberculosis, diz-nos João Neres, que tirou o curso de farmácia e está a fazer um pós-doutoramento na Escola Politécnica Federal de Lausane, na Suíça. "Esta molécula está envolvida na biossíntese da parede celular da bactéria da tuberculose", explica o português. A parede celular reveste a bactéria e dá-lhe uma estrutura e uma protecção. É um dos alvos preferidos dos cientistas para combater as infecções bacterianas.

Em 2009, a equipa de Neres, liderada por Stewart Cole, publicou um artigo na Science onde mostrava que o antibiótico BTZ043 ligava-se à DprE1. Esta ligação impedia a produção de um açúcar vital para a formação da parede celular, o que matava as bactérias da tuberculose.

O antibiótico já foi testado em várias estirpes da bactéria, incluindo muitas que são resistentes à panóplia de antibióticos utilizados para a tuberculose, que já têm mais de quatro décadas de existência, e são cada vez mais ineficientes contra as bactérias resistentes. O BTZ043 conseguiu sempre matar as bactérias e, neste momento, está quase pronto para entrar em ensaios clínicos.

Mas o que a equipa conseguiu, entretanto, foi cristalizar o complexo formado pelo antibiótico ligado à DprE1. Deste modo, com ajuda de uma técnica de raios-X, conseguiram uma imagem tridimensional do conjunto e perceberam exactamente onde é que o antibiótico se liga à proteína, de forma irreversível, impedindo-a de funcionar.

Segundo João Neres, o processo experimental para obter esta imagem é muito complicado. "Saber sobre esta estrutura a três dimensões da proteína permite de um modo mais racional produzir medicamentos que consigam encaixar e inibir melhor a enzima", revela o cientista.Deste modo, se surgirem problemas nos ensaios clínicos com o BTZ043, se o químico se revelar tóxico em humanos, os cientistas conseguem, mais facilmente, mudar a estrutura da molécula para deixar de ser tóxica, mas mantendo a parte que se liga à enzima e a inibe.

Esta é a segunda vez que se conseguiu revelar a estrutura de um complexo proteína-antibiótico da bactéria da tuberculose. Num comentário ao artigo, Gregory Cook, da Universidade de Otago, na Nova Zelândia, sublinha a importância da descoberta: "Isto faz com que a nova estrutura apresentada por Neres seja um feito notável, que deve acelerar o desenvolvimento da nova geração de drogas contra a tuberculose."

Alteração feita às 19h08 de dia 12 de Setembro de 2012