A artista de rua para quem a burca não é uma jaula

Em 2009, Shamsia Hassani foi considerada uma das dez melhores artistas no Afeganistão. Tem 24 anos e faz "graffiti" nas ruas de Cabul ou até mesmo no computador

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Omar Sobhani/Reuters

Nas ruas de Cabul, Afeganistão, há paredes com "graffiti" de mulheres de burca, com formas e silhuetas marcadas. Para Shamsia Hassani, autora de algumas dessas obras, a sua arte mostra que “a burca não é uma jaula”. As silhuetas vincadas debaixo de burcas brancas e azuis, “a cor da liberdade”, que a afegã pinta nas ruas pretendem mostrar “um novo mundo moderno no Afeganistão”, contou a jovem de 24 anos à agência Lusa.

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Nas ruas de Cabul, Afeganistão, há paredes com "graffiti" de mulheres de burca, com formas e silhuetas marcadas. Para Shamsia Hassani, autora de algumas dessas obras, a sua arte mostra que “a burca não é uma jaula”. As silhuetas vincadas debaixo de burcas brancas e azuis, “a cor da liberdade”, que a afegã pinta nas ruas pretendem mostrar “um novo mundo moderno no Afeganistão”, contou a jovem de 24 anos à agência Lusa.

A professora de arte na Universidade de Cabul diz que quer “mudar o sentido da burca no Afeganistão, para mostrar mulheres felizes”. Quer “mudar a forma para mudar as mentes”. Para Shamsia, “a burca não é o único problema” das mulheres no Afeganistão, pois “têm outros grandes problemas”. Mas, acredita, “mesmo com a burca, as mulheres podem fazer tudo: ter educação, trabalhar, fazer arte e muitas outras actividades”. “A burca não é uma jaula. A liberdade não é o que vestimos, a liberdade é o que decidimos, o que dizemos, o que fazemos para estarmos confortáveis e para termos paz”, acredita.

Em 2009, Shamsia foi considerada uma das dez melhores artistas no Afeganistão. Depois disso, ela e os restantes nove artistas decidiram formar uma associação de arte contemporânea, a que chamaram ROSHD, palavra que pode traduzir-se por “crescimento”. Em Dezembro do ano seguinte, os elementos da associação tiveram um "workshop" de "graffiti" em Cabul, organizado pela Combat Comms, um grupo anónimo de artistas internacionais fundado em 2010 para a defesa da liberdade de expressão no Afeganistão, através da música e da arte. Esta foi a primeira vez que teve contacto com o "graffiti", pela mão de CHU. “Foi uma experiência óptima, muito interessante. Foi como um novo começo, um novo desafio”, recorda.

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Omar Sobhani/Reuters

A inventora do "graffiti digital"

O facto de ser mulher complica o seu trabalho enquanto artista. Shamsia não pode pintar "graffiti" em ruas que não conhece, “talvez por causa das más reacções das pessoas, talvez por causa de problemas de segurança”. Por isso, Shamsia não tem ainda muitas obras em Cabul e as que tem estão em zonas pouco movimentadas. A artista inventou aquilo a que chamou “graffiti digital”, que diz ser “uma espécie de novo estilo”. “Tiro fotografias de estradas e de ruas por toda a parte. Depois, abro as fotos no ‘Photoshop’ ou noutro programa de arte no meu computador e construo imagens digitais. Outras vezes, imprimo as fotografias e faço 'graffiti' com óleo ou acrílico que pinto nas paredes”, explicou. Não é "graffiti" com latas de "spray", mas tem o mesmo impacto visual.

De acordo com o índice Corruption Perceptions Index 2011, da Transparency Organization, o Afeganistão é o terceiro país mais corrupto dos 183 analisados, a par da Birmânia e apenas atrás da Coreia do Norte e da Somália. De acordo com um relatório da organização não governamental Human Rights Watch (HRW), publicado em Março, centenas de mulheres estão presas no Afeganistão por “crimes morais”, nomeadamente por terem fugido de casa ou terem tido relações extraconjugais.

“Dez anos após a queda dos talibãs, os abusos contra as mulheres são generalizados. É uma triste ironia ver que os fracos recursos do sistema judicial são utilizados para perseguir e prender mulheres e raparigas por acções que nunca deveriam ser crimes”, lamentou a organização de defesa dos direitos humanos. Cerca de 400 mulheres e raparigas estão actualmente presas no Afeganistão por aquele tipo de “crimes morais”, calculou a HRW, que recolheu os testemunhos de 58 mulheres.