"Tabu" e outros filmes “independentes do poder político e económico”

O realizador Miguel Gomes, cujo filme "Tabu" recebeu dois prémios no Festival de Cinema de Berlim, explica que o sucesso do cinema português não passa pelos apoios do Estado

Foto
Miguel Gomes AFP

Uma parte do sucesso do cinema português em festivais estrangeiros explica-se pela sua independência relativamente “ao poder político e económico”, disse à agência Lusa o cineasta Miguel Gomes, cujo filme “Tabu” recebeu dois prémios na Berlinale.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Uma parte do sucesso do cinema português em festivais estrangeiros explica-se pela sua independência relativamente “ao poder político e económico”, disse à agência Lusa o cineasta Miguel Gomes, cujo filme “Tabu” recebeu dois prémios na Berlinale.

Tabu” recebeu o prémio Alfred Bauer para a Inovação e o prémio da crítica no Festival de Cinema de Berlim. No sábado, no discurso de agradecimento pelo primeiro destes prémios, Miguel Gomes recordou a “independência” de cineastas como João César Monteiro ou Pedro Costa. “Contrariamente a uma ideia feita de que o cinema português é muito para dentro, a verdade é que, nas últimas décadas, desde o Paulo Rocha com ‘Os Verdes Anos’ e o Fernando Lopes com o ‘Belarmino’, em 1962 ou 1963, os filmes portugueses têm despertado grande interesse [no estrangeiro], mesmo que não faça milhões de espectadores em todo o mundo”, disse Gomes à Lusa.

A falta de dinheiro

Para o realizador de “Aquele Querido Mês de Agosto”, é notável que um cinema “feito com tão poucos recursos, feito artesanalmente, com tão poucos filmes produzidos anualmente, tenha tido sempre alguma visibilidade em festivais de cinema, e tenha adeptos fervorosos”. Miguel Gomes explica esse “gosto que há pelo cinema português lá fora” pela ideia de “uma liberdade artística” de que os cineastas desfrutam em Portugal: “Essa liberdade tem a ver o com facto de os filmes [portugueses] serem independentes do poder político e do poder económico, coisa que hoje em dia se calhar não é tao evidente. Neste momento acho que estamos todos à mercê de poderes económicos.”

O cineasta insurge-se contra o “mito” da subsidiodependência do cinema português, notando que os filmes actualmente são financiados através de uma taxa sobre as receitas publicitárias do audiovisual. “Tabu é uma coprodução de quatro países — Portugal, França, Alemanha e Brasil. Nos outros três países, o dinheiro saiu de fundos públicos. Nós, ao contrário do que se diz, [não recebemos] dinheiro do Orçamento Geral do Estado, excepto indirectamente via RTP”, afirma Gomes.

“Aquele discurso de que os contribuintes estão a pagar um cinema que interessa a pouca gente é um mito popular que eu acho completamente falso.” Apesar da exposição internacional alcançada pelos seus filmes, Miguel Gomes não pensa em sair do país. “Sou português e portanto a minha experiência de vida, os meus interesses situam-se aqui. Gosto de filmar coisas com que me possa relacionar de forma pessoal”, diz. “Podia passar por isso, fazer filmes noutros países, mas tenho interesse em continuar a filmar no meu país”, acrescenta.