A complexa máquina de captação de jovens talentos

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Os treinos de captação reúnem atletas indicados pelos observadores nFactos/Fernando Veludo

Para controlar todos os recantos do território nacional, o clube de Alvalade foi pioneiro na organização de uma pirâmide de recrutamento, centrada na Academia de Alcochete. No topo deste gabinete, está um director de scouting, um cargo durante muitos anos ocupado por Aurélio Pereira, um nome mítico na formação leonina (actualmente, não desempenha funções executivas). A esta direcção reportam três coordenadores, divididos por outras tantas áreas geográficas: Grande Lisboa/Setúbal; Norte/Centro e Algarve. Cada uma destas grandes zonas é depois controlada por núcleos com subcoordenadores, que podem abarcar mais do que um distrito.

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Para controlar todos os recantos do território nacional, o clube de Alvalade foi pioneiro na organização de uma pirâmide de recrutamento, centrada na Academia de Alcochete. No topo deste gabinete, está um director de scouting, um cargo durante muitos anos ocupado por Aurélio Pereira, um nome mítico na formação leonina (actualmente, não desempenha funções executivas). A esta direcção reportam três coordenadores, divididos por outras tantas áreas geográficas: Grande Lisboa/Setúbal; Norte/Centro e Algarve. Cada uma destas grandes zonas é depois controlada por núcleos com subcoordenadores, que podem abarcar mais do que um distrito.

A base da pirâmide é composta pelos observadores locais, que variam em número e são escolhidos por cada um dos respectivos núcleos. Trabalham no terreno, sem remuneração, e aqueles que mais garantias apresentam, pelos casos de sucesso que foram acumulando, têm acesso directo à base de dados do recrutamento, para onde enviam automaticamente os seus relatórios sobre potenciais talentos. Os restantes têm de reportar ao coordenador de núcleo, que, quando solicitado, fará uma segunda observação ao jogador indicado, seja em contexto de treino ou jogo.

Actualmente, o trabalho já começa a ser feito tendo por alvo crianças entre os 8 e os 10 anos. A técnica e a velocidade de execução e de deslocação são os atributos centrais que podem levar um jovem a ser chamado a prestar provas, mas existem variantes que complementam o estilo de jogador "à Sporting" em cada zona do campo, segundo um modelo de jogo estabelecido para todos os escalões.

Definições que não são estanques. Qualquer jovem que apareça e apresente características excepcionais, mesmo que não encaixe nas predefinições, é alvo de interesse, conforme revelou ao PÚBLICO um ex-elemento da estrutura de recrutamento "leonina", que pediu anonimato. Um exemplo óbvio: Lionel Messi não corresponderia exactamente ao perfil desejado para um ponta-de-lança, pela sua baixa estatura, mas o seu talento superaria qualquer limitação física.

Depois de uma ou mais observações, cada jovem detectado é acompanhado e, caso confirme as primeiras indicações, acaba por ser convidado para prestar provas na Academia de Alcochete. Poderá ter de regressar para nova triagem mais uma ou duas vezes, dependendo do potencial e das dúvidas que levante, mas alguns (poucos) recebem prontamente um convite para integrar os escalões de formação da SAD (Sociedade Anónima Desportiva). Foi o que aconteceu com Daniel Carriço, João Moutinho, Miguel Veloso ou Yannick Djaló, atletas que superaram todas as expectativas.

A direcção de scouting realiza anualmente na Academia de Alcochete uma reunião com a presença de todos os elementos da estrutura, mas, segundo revelou ao PÚBLICO um dos observadores que colaboram actualmente com os "leões", outros encontros, em menor escala, ocorrem no final dos três ou quatro treinos de captação que, em média, ocorrem anualmente. Importante no processo de captação é também a rede de contactos e parcerias estabelecida com os diversos clubes, que acabam por funcionar como fonte local de informação.

Benfica aperta concorrência

Nos últimos anos, o Benfica apertou bastante a concorrência em matéria de recrutamento de matéria-prima para a sua formação. A organização da estrutura de scouting já alcançou os níveis do rival da Segunda Circular e os resultados começam a surgir na equipa principal, com jogadores como Miguel Vítor (Torres Vedras) ou Nélson Oliveira (Barcelos).

A nível de prospecção nacional, o clube da Luz tem dedicado particular atenção às zonas de Braga e à região do Algarve, geografias particularmente ricas em qualidade e quantidade de jovens promissores.

Já o FC Porto, embora opere em todo o território, concentra-se preferencialmente na região do Grande Porto, mas também em Viseu, Aveiro e Guimarães. Apesar destas opções geográficas, nenhum dos três "grandes" tem o exclusivo de qualquer sector geográfico. E quando um jovem é pretendido por mais do que um destes clubes, acaba, na maioria dos casos, por optar por aquele que está mais próximo da sua região.

Não foi, porém, o caso de Cristiano Ronaldo. Cobiçado por Sporting e Benfica, que enviaram representantes à Madeira em simultâneo para observar o potencial do futebolista, desde 1995 nas camadas jovens do Nacional, foram os "leões" a assegurar o seu talento. Aqui não foi a proximidade a determinar a escolha, mas sim as condições oferecidas ao atleta e família.