Transferências cruzadas levaram investigação até ao presidente do BES Angola

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Álvaro Sobrinho, presidente do BES de Angola, foi constituído arguido Raquel Esperança (arquivo)

A queixa das autoridades angolanas deu entrada no Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) em 25 de Maio de 2010, indicando três suspeitos principais, de nacionalidade portuguesa, pelo envolvimento na fraude do Banco Nacional de Angola. Entre eles figurava um empresário com ligações ao ramo imobiliário, que os investigadores portugueses rapidamente apuraram ter transferido mais de quatro milhões de dólares para uma conta do presidente do BESA. Pouco tempo depois, idêntica quantia era transferida por Álvaro Sobrinho para as contas do mesmo empresário.

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A queixa das autoridades angolanas deu entrada no Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) em 25 de Maio de 2010, indicando três suspeitos principais, de nacionalidade portuguesa, pelo envolvimento na fraude do Banco Nacional de Angola. Entre eles figurava um empresário com ligações ao ramo imobiliário, que os investigadores portugueses rapidamente apuraram ter transferido mais de quatro milhões de dólares para uma conta do presidente do BESA. Pouco tempo depois, idêntica quantia era transferida por Álvaro Sobrinho para as contas do mesmo empresário.

Foi quando os investigadores estavam já no encalço destes movimentos suspeitos que a Procuradoria-Geral da República recebeu da Comissão de Mercados e Valores Mobiliários (CMVM) a notificação de uma transacção imobiliária efectuada por Álvaro Sobrinho, envolvendo mais de 9,5 milhões de euros.

O presidente BESA adquiriu de uma única vez seis apartamentos no empreendimento Estoril-Sol Residence e, pelos valores envolvidos e porque o pagamento foi efectuado numa única tranche, a notificação tornava-se obrigatória por força da lei de combate ao branqueamento de vantagens de proveniência ilícita (Lei nº 25/2008). O negócio concretizou-se em Setembro de 2010 e teve que ser comunicado à CMVM por envolver um fundo imobiliário.

Depois de cruzados todos os dados e reunida vasta documentação, o procurador do DCIAP avançou então para o arresto dos imóveis e de contas bancárias, procedendo também a buscas na residência de Álvaro Sobrinho, que se concretizaram no dia 1 de Junho deste ano.

No dia seguinte, através de um comunicado, a Procuradoria-Geral da República (PGR) de Angola dava conta de que no âmbito da investigação a decorrer em Portugal tinham sido "recuperadas avultadas quantias em dólares americanos e em euros, parte já restituída ao Estado angolano, após a respectiva apreensão judicial decretada pelo juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal [TCIC], Carlos Alexandre".

A nota assinada pelo procurador-geral angolano, José Maria de Sousa, dava também conta da realização, na véspera, nos arredores de Lisboa, de uma busca na qual foram apreendidas "viaturas de topo de gama e diversa documentação". As notícias então divulgadas davam conta da apreensão de um automóvel, uma mota e cerca de 200 mil euros na moradia de Álvaro Sobrinho, na zona de Sintra.

Investigação concluída

A investigação estará agora na fase conclusiva, tendo o presidente do BESA sido convocado para ser ouvido como arguido, o que aconteceu na terça-feira no TCIC. O interrogatório terminou já perto da meia-noite, tendo o juiz Carlos Alexandre fixado a proibição de contacto com os outros três arguidos e a prestação de uma caução de 500 mil euros, no prazo de dez dias. Álvaro Sobrinho fez-se acompanhar pelo advogado Artur Marques, que no final anunciou que irá apresentar recurso do despacho para o Tribunal da Relação de Lisboa.

A fraude no Banco Nacional de Angola (BNA) foi detectada através de um inquérito interno, através do qual se apurou terem sido desviados, entre Setembro e Novembro de 2009, mais de 137 milhões de dólares. O esquema funcionou através da emissão de ordens de pagamento de facturas referentes a bens supostamente fornecidos ao Estado angolano por empresas estrangeiras.

As transferências eram feitas através do BES de Londres - por se tratar do banco correspondente do BNA -, tendo o dinheiro ido parar depois a diversos países. Segundo a queixa apresentada no DCIAP, ascendia a 33 milhões de dólares a verba encaminhada para o nosso país.