Paredes de Coura, o festival sentimental

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Em 2009, o Festival de Paredes de Coura tem uma dose de risco e Patrick Wolf, Nine Inch Nails, The Hives e Franz Ferdinand Nelson Garrido/PÚBLICO

A agitar o Minho desde 1993, agora sem a "concorrência" de Vilar de Mouros e tido como um local de peregrinação regular dos fãs dessa vaga coisa chamada música alternativa, o festival de Paredes de Coura abre hoje oficialmente as portas. Mas já há muita gente pelo parque de campismo, algo que Vítor Pereira, da Ritmos, organizadora do festival, constatou na habitual voltinha pelo recinto. "Se acabar [o espaço no parque oficial], fala-se com o proprietário de um campo e chega-se a um acordo", disse ao P2, cheio de espírito courense.

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A agitar o Minho desde 1993, agora sem a "concorrência" de Vilar de Mouros e tido como um local de peregrinação regular dos fãs dessa vaga coisa chamada música alternativa, o festival de Paredes de Coura abre hoje oficialmente as portas. Mas já há muita gente pelo parque de campismo, algo que Vítor Pereira, da Ritmos, organizadora do festival, constatou na habitual voltinha pelo recinto. "Se acabar [o espaço no parque oficial], fala-se com o proprietário de um campo e chega-se a um acordo", disse ao P2, cheio de espírito courense.

No ano em que perdeu o seu patrocinador dos últimos anos, a cervejeira Heineken, o festival propõe Franz Ferdinand, Jarvis Cocker, Nine Inch Nails, Strange Boys, Patrick Wolf, The Hives. A organização considera que tem de haver um trabalho editorial (chamar-lhe pedagógico seria exagerado). "O nome da banda é importante, mas é muito mais importante o que ela faz e o que representa num dado momento", explica Vítor Pereira.

Como o ananás a rebentar na cabeça de Karen O dos Yeah Yeah Yeahs em 2003, há bandas emergentes "que vêm directamente de tocar em clubes para o palco principal" de Coura e ao "efeito surpresa" alia-se a criação de "um certo happening". Que pode acontecer sexta-feira, com Trent Reznor a ameaçar que esta é a última digressão dos Nine Inch Nails - "um factor de motivação para os trazer", confirma Vítor Pereira. O que interessa é "termos bandas que possam representar uma mais-valia para o cartaz em relação a outros festivais".

Foi essa edição do cartaz, a temática, o controlo de qualidade, que permitiu resistir à falta da tal almofada patrocinadora. Este ano, fazer o cartaz de Coura "foi mais difícil": "Se não tivéssemos uma certa identidade teríamos ainda mais dificuldade. O main sponsor acaba por ser uma almofada mais confortável." As marcas de cerveja estão a canalizar o seu investimento para o futebol, diz Vítor Pereira, mas o apoio constante da autarquia, aliado ao esforço financeiro da própria organização, permitiu correr este "risco".

Crise em Espanha

O contexto crise está a afectar os festivais de diferentes formas. Muita oferta e, do lado do público, cada vez mais espírito vá para fora com música dentro - um festival pode servir de pretexto para umas miniférias em São Pedro do Sul (Andanças), em Sines (Músicas do Mundo) ou na Zambujeira do Mar (Sudoeste) - mas também há alguns festivais que caíram pelo caminho. Olhe-se para o lado, mais precisamente para Espanha, e constate-se a ausência do Summercase, cuja edição 2009 foi cancelada. Este sinal parecia ao jornal espanhol El Mundo o prenúncio do rebentar da bolha festivaleira.

Em Fevereiro, o mesmo diário espanhol perguntava ao co-director do Sónar, outro festival de referência espanhol, se são os festivais que estão em crise ou se sofrem pelo contexto internacional. "O consumo está em queda, o investimento publicitário está em queda e, tal como se vendem menos casas, também se vendem menos bilhetes para concertos", dizia Ricard Robles. Outro factor que surpreendeu os organizadores dos festivais em Espanha foi o cancelamento das linhas de crédito que financiavam muitos eventos.

Qual é a solução? 1 - tentar depender o mínimo possível de patrocinadores e afins. 2 - identidade própria (Vítor Pereira garante: "Não estamos a competir com o Rock in Rio ou outros festivais maiores"). 3 - (uma das palavras mais repetidas por Vítor Pereira na conversa com o P2) "risco". Ter um pouco de "coragem" e "optimismo" para colher frutos mais tarde.

Em Coura, a organização assume que pode perder algum dinheiro. "Mas no futuro permite-nos mais respeito", prevê Vítor Pereira, numa ética muito rock n' roll. "As pessoas sabem que este ano não temos patrocínio e isso também é considerado por elas. Não vivemos de desejos imediatos, vivemos de um público fiel", entre os quais cerca de 40 por cento de galegos.

É a família Paredes de Coura, a tal que os organizadores dizem ser fiel e em crescimento. Por falar nisso, venham a eles as criancinhas. Cientes de que os festivaleiros de Coura são menos teen e mais thirtysomething, este ano há serviço de babysitting. "Nós tratamos dos filhos deles enquanto eles vão aos concertos", diz Vítor Pereira. Tudo no espírito de "descontracção, contacto com a natureza e carinho", como enumera o organizador, quase em registo mais Woodstock português do que os vizinhos de Vilar de Mouros. Carinho pelos espectadores, diz, e que é recíproco: "As pessoas têm mais ternura pelo festival." Até os Franz Ferdinand pediram à organização que lhes fornecesse postais da terra para enviarem à família.

Em Paredes de Coura, pior do que a crise só mesmo o espectro da chuva. Como a que baptizou Morrissey em 2006. E essa parece ter ido, com o patrocinador maior, para outras paragens.