A travessia dos infernos

Agora, outro alemão, Wolfgang Petersen, regressa a um dos títulos de glória do passado, "A Aventura do Poseidon" (1972), do tarefeiro Ronald Neame, para sob a forma de um "remake" aplicar novas tecnologias a uma fórmula já testada. Em relação ao original falta uma das imagens mais fortes, a de Shelley Winters, qual Johnny Weissmuller, a nadar e a mergulhar, para além de que o elenco não possui a força estelar do original, que tinha também uma intensa concentração temporal. Agora, Petersen, importado da Europa depois do sucesso universal de "Das Boot" (1981), explorando, de modo eficiente, o universo concentracionário, e de já longa tarimba na indústria, com "Na Linha de Fogo" (1993), "Air Force One" (1997) ou "Tróia" (2004), opta pela extrema pormenorização da viagem através do barco naufragado, a caminho da superfície, numa estratégia de controlado "suspense", passo a passo. As personagens encontram-se apenas esboçadas, nenhuma delas tem carisma para aguentar o crescendo de tensão, mas o retrato de grupo resulta num interessante exercício de estudo da sobrevivência, a todo o custo. Mesmo a figura de Kurt Russell resvala nalguma indefinição, constituindo, porém, o seu sacrifício um dos pontos culminantes de um périplo que lembra o excelente "A Viagem Fantástica" (1966) de Richard Fleischer, numa outra dimensão, a da exploração do interior do corpo humano. Richard Dreyfuss, a outra estrela "reconhecível", não tem papel à sua altura, no seu arquitecto "gay", mas revela uma ironia necessária para equilibrar a fragilidade da maioria das personagens: uma mãe e um filho demasiado estereotipados, uma "latina" para dar a quota de politicamente correcto, um "vilão" sem vilania (Kevin Dillon), a esvaziar de sentidos, uma galeria que poderia ser o centro da ficção. Por muito discutível que seja a ideia do "remake", ambientado na passagem do ano, com a pirotecnia dos efeitos especiais a suprir outras lacunas dramáticas, com jovens estrelas a dar uma nota de telefilme, existe uma certa grandeza no tratamento do espaço e uma enorme coerência na prossecução das regras essenciais do género. Petersen consegue sobretudo o "timing" perfeito, sem pontos mortos, nem hesitações, quanto à definição das sucessivas metas a atingir. Claro que a longa sucessão de obstáculos, corredores e canalizações corre o risco de cansar, mas o objectivo está traçado desde o início: prender o espectador a uma narrativa simples de salvamento. Não se lhe peça muito mais.

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Agora, outro alemão, Wolfgang Petersen, regressa a um dos títulos de glória do passado, "A Aventura do Poseidon" (1972), do tarefeiro Ronald Neame, para sob a forma de um "remake" aplicar novas tecnologias a uma fórmula já testada. Em relação ao original falta uma das imagens mais fortes, a de Shelley Winters, qual Johnny Weissmuller, a nadar e a mergulhar, para além de que o elenco não possui a força estelar do original, que tinha também uma intensa concentração temporal. Agora, Petersen, importado da Europa depois do sucesso universal de "Das Boot" (1981), explorando, de modo eficiente, o universo concentracionário, e de já longa tarimba na indústria, com "Na Linha de Fogo" (1993), "Air Force One" (1997) ou "Tróia" (2004), opta pela extrema pormenorização da viagem através do barco naufragado, a caminho da superfície, numa estratégia de controlado "suspense", passo a passo. As personagens encontram-se apenas esboçadas, nenhuma delas tem carisma para aguentar o crescendo de tensão, mas o retrato de grupo resulta num interessante exercício de estudo da sobrevivência, a todo o custo. Mesmo a figura de Kurt Russell resvala nalguma indefinição, constituindo, porém, o seu sacrifício um dos pontos culminantes de um périplo que lembra o excelente "A Viagem Fantástica" (1966) de Richard Fleischer, numa outra dimensão, a da exploração do interior do corpo humano. Richard Dreyfuss, a outra estrela "reconhecível", não tem papel à sua altura, no seu arquitecto "gay", mas revela uma ironia necessária para equilibrar a fragilidade da maioria das personagens: uma mãe e um filho demasiado estereotipados, uma "latina" para dar a quota de politicamente correcto, um "vilão" sem vilania (Kevin Dillon), a esvaziar de sentidos, uma galeria que poderia ser o centro da ficção. Por muito discutível que seja a ideia do "remake", ambientado na passagem do ano, com a pirotecnia dos efeitos especiais a suprir outras lacunas dramáticas, com jovens estrelas a dar uma nota de telefilme, existe uma certa grandeza no tratamento do espaço e uma enorme coerência na prossecução das regras essenciais do género. Petersen consegue sobretudo o "timing" perfeito, sem pontos mortos, nem hesitações, quanto à definição das sucessivas metas a atingir. Claro que a longa sucessão de obstáculos, corredores e canalizações corre o risco de cansar, mas o objectivo está traçado desde o início: prender o espectador a uma narrativa simples de salvamento. Não se lhe peça muito mais.

Se compararmos com "Titanic" de James Cameron, e a comparação é inevitável, falta a "Poseidon" uma melhor definição do pré-catástrofe, e muito do simplismo narrativo vem, precisamente, dessa pressa de chegar ao desastre, de fazer rebentar comportas e explodir instalações eléctricas. Dito isto, a desejada componente claustrofóbica está lá e o desespero suspensivo do encarceramento funciona. Um filme como este tem um público-alvo muito preciso e não perde tempo para o atingir. Quem desejar um estudo aprofundado de comportamentos tem que procurar em um outro objecto.