Morreu Henri Cartier-Bresson

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Bresson, que faria 96 anos no próximo dia 22, faleceu na sua residência familiar em Isle-sur-la-Sorgue, no Sul de França, tendo o funeral privado decorrido já hoje

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Bresson, que faria 96 anos no próximo dia 22, faleceu na sua residência familiar em Isle-sur-la-Sorgue, no Sul de França, tendo o funeral privado decorrido já hoje

Mestre incontestado da fotografia, tanto em matéria artística como no fotojornalismo - ao qual deu algumas das suas mais belas páginas em revistas como a mítica "Life" - Bresson impôs um estilo intimista, sempre a preto e branco, recusando o "flash" ou a manipulação fotográfica.

Fundador, em Abril de 1947, da agência de fotografia Magnum, juntamente com Robert Capa, Bresson é o autor da tese do "instante decisivo", um dos conceitos mais marcantes da fotojornalismo moderno, segundo a qual o fotógrafo deve estar no local certo à hora certa, a fim de captar aquele momento único e irrepetível. "É como se estivéssemos a pescar num rio, a ver quando é que a truta morde o isco... depois é só puxá-la!", explicou.

Durante a sua longa carreira, Bresson viajou por mais de 23 países, fotografando personalidades históricas e cobrindo acontecimentos tão distintos como a guerra civil espanhola, a libertação de Paris durante a II Guerra Mundial, a morte do líder independentista indiano Mahatma Ghandi, ou a queda de Pequim às mãos do Exército Vermelho de Mao Tsé Tung, em 1949.

Em 1954, Bresson tornou-se também o primeiro fotojornalista ocidental a receber autorização para entrar na União Soviética após a morte de Estaline, ocorrida um ano antes.

Apesar da voracidade com que fotografou, defendeu sempre um ideal humanista, a proximidade e o respeito pelos sujeitos fotografados, trabalhando fotografias em que a emoção é moldada por uma composição fotográfica rigorosa.

Nas últimas três décadas, Bresson guardou a sua inseparável câmara fotográfica Leica, para se dedicar à sua outra paixão de sempre: o desenho.

Entre a fotografia e a pintura

Nascido em Chanteloup, nos arredores de Paris, no Verão de 1908, Bresson era o primogénito de um rico industrial têxtil, mas cedo virou costas ao negócio familiar para estudar arte.

A pintura foi a sua primeira ocupação, mas em 1930 deu os primeiros passos na fotografia, dois anos antes de descobrir a Leica, a revolucionária e silenciosa máquina que o acompanharia nas viagens iniciáticas à Costa do Marfim, Polónia, Checoslováquia, Áustria, Alemanha e Itália.

Publica as fotografias destas viagens em várias revistas da época e o sucesso é imediato: em 1933, organiza a sua primeira exposição individual em Paris, meses antes de participar em várias mostras em Nova Iorque.

Influenciado pelo realismo humanista que marca a fotografia da época, os seus trabalhos retratam o indivíduo no cenário urbano, captando instantes perfeitos da vida em movimento.

Com o início da II Guerra Mundial, alista-se no Exército francês, onde é colocado numa unidade documental, que viria a ser capturada pelas forças alemãs nas montanhas de Vosges, em Junho de 1940. Após quase três anos nas prisões militares alemãs, Cartier-Bresson consegue fugir e viajar até Paris, onde divide o seu tempo entre a fotografia comercial e o auxílio à resistência.

Com a França já livre da ocupação nazi e a Europa em convulsão, Bresson funda, juntamente com Robert Capa, David Seymour, Bill Vandivert e George Rodger a cooperativa de fotógrafos Magnum, marca de referência do fotojornalismo da segunda metade do século XX, alimentada pelo talento e independência dos seus repórteres.

Nas duas décadas seguintes percorre o globo, perseguindo histórias, acontecimentos, olhares, passando pela Índia, Birmânia, Indonésia, China, URSS, Cuba, México, EUA. Em 1968, reduz a sua actividade e passa a dedicar mais tempo ao desenho e à pintura, apesar de manter a sua fiel Leica sempre ao alcance da mão.

A vontade de mostrar o mundo ficou também expressa no cinema, a que se dedicou nas décadas de 1930 e 1940, ao trabalhar ao lado de directores como Jean Renoir e Jacques Becker ou assinando vários documentários, entre eles o aclamado “The Return”, sobre o regresso dos prisioneiros franceses após o fim da II Guerra Mundial.

Avesso a ser fotografado ou a dar entrevistas, Bresson diria um dia, a propósito da morte dos seus amigos Capa e Seymor: "Nesta profissão ausentamo-nos por mais ou menos tempo... a diferença é que alguns se demoram mais”. Bresson ausentou-se hoje.