Sofre de mais de cinco doenças crónicas? Pode vir a ter um gestor de saúde

Gestores podem ser médicos ou enfermeiros. Nova figura está prevista no relatório do grupo de trabalho que estudou a integração dos níveis de cuidados de saúde.

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Mais consultas hospitalares mas menos nos centros de saúde, revelam dados divulgados Foto: PÚBLICO

Os doentes com mais de cinco patologias crónicas e que são os principais consumidores de recursos devem passar a dispor de um gestor nos centros de saúde, alguém que seja responsável pelo seu acompanhamento personalizado. Uma melhor supervisão do estado do doente permitirá, a prazo, “controlar o desperdício de recursos”, justificam os autores de um estudo esta quinta-feira colocado em consulta pública no Portal da Saúde e em que esta nova figura é proposta.

Como se estima, a nível internacional, que cerca de 6% da população acumule mais de cinco doenças crónicas, em Portugal seriam necessários aproximadamente 7500 gestores nos cuidados de saúde primários, se cada um ficasse com cerca de 80 doentes a cargo (as recomendações internacionais apontam para entre 50 a 80 pacientes), refere o relatório final do grupo de trabalho que estudou a integração dos níveis de cuidados de saúde. O documento está em discussão pública até 17 de Maio.

Os gestores de doentes terão sempre de ser profissionais de saúde, mas a tarefa pode ser partilhada entre médicos e enfermeiros, adiantou à Lusa o secretário de Estado adjunto do ministro da Saúde, Fernando Leal da Costa. “Para que o utente mantenha sempre uma âncora nos seus cuidados primários, com um gestor de cuidados que faça a ligação entre os vários agentes e entre os hospitais, se for caso disso”, explicitou. Estes profissionais terão que receber uma formação complementar específica para poderem assumir as novas tarefas.

Mas o que faz, afinal, um gestor do doente? Trata-se de “uma figura que acompanha personalizadamente o doente com condições clínicas e sócio-económicas complexas ao longo de um continuum de cuidados”,  refere o relatório. Cabe ao gestor, entre outras tarefas, orientar a referenciação do paciente, definir um plano de cuidados personalizado, promover a educação para o autocuidado e apoiar a família na obtenção de cuidados de suporte. Tarefas, portanto, que extravasam o carácter meramente clínico e que implicam também um apoio administrativo personalizado.

Para fundamentar as suas propostas, os autores do relatório citam estudos norte-americanos, um que concluiu que um grupo acompanhado por gestores passou em média menos 36% de tempo no hospital e outro que comprovou que este tipo de apoio individualizado levou a uma redução de 48% da procura dos serviços de urgência.

Mas há mais vantagens a considerar: o acompanhamento personalizado pode ainda conduzir a uma diminuição de internamentos desnecessários e reduzir a demora média nos hospitais, possibilitando altas mais precoces.

Num relatório com mais de 150 páginas, o que se propõe, em síntese, é toda uma mudança de paradigma. Uma mudança que implica passar do actual “sistema centrado no tratamento da doença” para um sistema orientado para a “manutenção do bem estar geral da população”, explicam os autores, que propõem a criação de um Programa Nacional de Integração de Cuidados de Saúde.

Também a forma de financiamento deverá sofrer uma revolução, se o que é proposto pelo grupo de trabalho for concretizado no futuro. Independentemente dos cuidados prestados, as unidades de saúde deverão passar a receber um pagamento fixo por utente, sendo a unidade de pagamento por capitação ajustada pelo risco.

“O novo sistema de produção” exigirá “uma maior atenção à gestão da procura”, frisam os autores. Lembram, a propósito, que, se em esquemas de pagamento pela produção, mais volume significa mais receitas, em modelos de financiamento por capitação mais volume significa menos lucro.

Os actuais sistemas de financiamento, argumentam, conduzem a uma separação entre os vários níveis de cuidados (centros de saúde, hospitais, cuidados continuados). Os autores propõem ainda que a remuneração inclua incentivos, combinando-se o pagamento per capita com formas de recompensa pelos resultados obtidos. Mas alterar o pagamento pela produção para uma base per capita vai obrigar as instituições a mudarem a sua forma de funcionamento, “libertando-se do enfoque na resposta à doença para uma visão centrada no estado geral de saúde da população".

Seja como for, os responsáveis do Ministério da Saúde lembram na nota feita a propósito do estudo que este é ainda um documento de trabalho que “poderá ser melhorado em função da discussão e debate” que venha a proporcionar.

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