Otelo acredita que pode estar na hora da democracia directa com que “sonhou” no PREC

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Otelo diz que não se arrepende do que disse sobre o sentido da revolução de Abril hoje Rui Gaudêncio (arquivo)

O estratega da revolução de 25 de Abril de 1974 acredita que a crise que o país atravessa poderá levar a que a democracia representativa venha a ser substituída por uma democracia directa, regime com que “sonhou” durante o PREC.

Otelo Saraiva de Carvalho, que participou sábado à noite, em Santarém, num colóquio sobre a canção que serviu de senha para o arranque da Revolução dos Cravos, disse à agência Lusa que é importante acompanhar o que está a acontecer na Islândia, que enfrentou a banca rota em 2008 e que está a viver formas de democracia directa, num processo que poderá ter “um desenlace profundo nas democracias europeias”.

No seu entender, os 37 anos decorridos desde a revolução não consolidaram totalmente o regime de democracia representativa que foi “imposto” a Portugal pela Europa Ocidental e pelos Estados Unidos da América.

“O meu sonho durante o PREC (processo revolucionário pós 25 de abril) começou a ser a possibilidade de instauração no país de um modelo novo de regime político que passava pela democracia directa”, pela criação de um “Estado de poder popular em que os partidos ficassem subalternizados”, à semelhança do que está a acontecer agora na Islândia, disse Otelo Saraiva de Carvalho à Lusa.

Para Otelo, o país está a assistir a “fenómenos importantes” a que é preciso estar atento, como as cada vez mais elevadas taxas de abstenção.

“O bastonário da Ordem dos Advogados, Marinho Pinto, veio advogar greve da democracia e se ninguém votar como é que os políticos se acham com legitimidade para continuar a governar o país?”, questionou, frisando que estas “são ideias que vão aparecendo”.

Otelo disse acreditar que a “acção negativa da classe política que tem vindo a governar o país pode levar a circunstâncias que permitam uma alteração profunda disto”.

O “capitão de Abril” advertiu que se nada for feito para acabar com a “imoralidade da diferença salarial” existente no país, com gestores a receberem prémios de milhões e gente a ganhar menos de 300 euros, “o caldo está entornado”.

“Ou a classe política toma consciência da gravidade da situação ou pode haver uma eclosão social enorme”, declarou.

Otelo esclareceu o sentido do “sound bite” retirado da entrevista que deu a semana passada à Lusa -- de que não faria a revolução se soubesse como o país iria ficar -- assegurando que não está “absolutamente nada arrependido” e de que tem “um orgulho enorme em ter sido um dos protagonistas dessa gloriosa giesta”.

A frase surgiu “na sequência de se falar da situação atual, da juventude que está a emigrar por não haver aqui condições”, disse, em comentário às reações que a sua entrevista provocou.

Quanto à declaração de que só a perda de direitos dos militares poderia levar a um “novo 25 de abril”, Otelo reafirmou que as alterações ocorridas nos últimos anos nas forças armadas, com a profissionalização, e a tendência para a dissolução dos idealismos na sociedade levam a que só haja reação “se os direitos forem confiscados”.

“E vamos ver o que pode acontecer com a polícia e a GNR também, se começarem a tirar salários e a não pagarem salários. Aí cuidado”, advertiu.

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