Jardim vai pedir a Cavaco Silva para não antecipar eleições regionais

Presidente madeirense pretende continuar em funções, depois da eleição do novo líder do PSD regional, mas isso não depende exclusivamente da sua vontade nem da intervenção do Presidente da República.

Foto
PSD-Madeira, liderado por Alberto João Jardim, fez ontem o rescaldo das autárquicas Rui Gaudêncio

“Não havendo eleições antecipadas, vou comunicar à comissão política que estou na disposição de exercer funções até posse do novo governo eleito”, declarou Jardim, após a reunião daquele directivo do PSD-Madeira, no início da semana. O anúncio representa um novo recuo relativamente à promessa, feita no último congresso, de que deixaria o executivo em Janeiro de 2015, aquando da consagração do novo líder.

Já em Março passado, Jardim tinha-se declarado “disposto a levar o mandato de governo até ao fim”, ou seja, até Outubro do próximo ano. Isto na eventualidade do Presidente da República “não aceitar a mudança de presidente do Governo e pretender eleições antecipadas”, o que, em sua opinião, “seria um golpe de Estado constitucional, tal como o de Sampaio” quando afastou Santana Lopes do governo.

Face à hipótese da realização, ou não, de eleições antecipadas, Jardim vai reiterar a Belém que não está interessado em deixar a Quinta Vigia. “Pedi uma audiência porque tenho que informar aos que formalizarem as suas candidaturas [à liderança do PSD/M] qual é o pensamento do senhor Presidente da República em relação a este último ano de legislatura", alegou.

Em vez de “andar a pedir audiências sem nexo, Jardim devia estar  preocupado em negociar o Orçamento Regional de 2015 com os deputados da maioria social-democrata”, reagiu Miguel de Sousa, um dos seis candidatos às directas internas. Por outro lado, acrescenta, o Presidente da República “não pode decidir seja o que for sem ouvir as propostas e os argumentos do novo líder” do PSD regional que, sendo o seu caso, defende a convocação de “eleições imediatas”, porque “esta penúria não pode continuar”.

O mesmo vem preconizando Sérgio Marques e Miguel Albuquerque, este desde Novembro de 2012, quando ousou enfrentar Jardim. “Estamos numa situação de emergência regional. Temos situações de pobreza, de desemprego e de emigração qualificada cada vez mais graves. Temos de inverter esta situação”.

Contra a antecipação da consulta popular está o candidato João Cunha Silva. “Eleições neste momento não era bom para o PSD-Madeira. Em Outubro se calhar já será melhor porque a austeridade, fruto das eleições nacionais que vão acontecer, já estará mais diluída”, argumenta, garantindo que “se ganhar a eleição interna, é claro que vou para presidente do Governo”.

Se tal acontecer, Cunha Silva promete fazer “uma remodelação do governo para esses oito meses”. Entende ter “toda a legitimidade” para se apresentar perante o Presidente da República e a assembleia regional: “ Já que sou vice-presidente e fui sujeito ao voto popular, [isso] garante-me uma legitimidade que outros se calhar não têm”.

Assim sendo, a continuidade de Jardim no governo deixou de depender exclusivamente da sua vontade. A maioria dos candidatos rejeita a direcção bicéfala do partido e do governo, o que parece ser tolerada apenas por Manuel António Correia, o candidato predilecto do ainda presidente, ou por Jaime Ramos, o seu indefectível número dois no partido, também na corrida da sucessão. No entanto, qualquer decisão passa pelo parlamento regional.

Entretanto, Jardim mostra-se irredutível no poder, parecendo ter ganho novo folego com o arquivamento do processo relativo à ocultação de dívidas num montante superior a mil milhões de euros. Apesar de ter aprovado e inaugurado obras sem cabimento orçamental ou cujas facturas foram escondidas em base de dados secreta, o presidente saiu incólume. Nem foi constituído arguido, como aconteceu com outros cinco membros do seu executivo, que incorriam na prática dos crimes de prevaricação, violação das regras de execução orçamental, abuso de poder, administração danosa e falsificação de documentos, pelo comprovado uso de vasto leque de instrumentos de ocultação de uma dívida galopante e de angariação de novas fontes de financiamento.

"Foi esta a política de que não me arrependo", confessou o governante madeirense esta semana. "A única coisa que está mal foi fazer dívida pública para recuperar dos atrasos de séculos", justificou.

Cenários da sucessão escapam ao controlo de Jardim
Todos os cenários da sucessão, incluindo o resultante de um eventual pedido de demissão a ser apresentado pelo próprio, escapam ao controlo de Alberto João Jardim.

  1. Demissão de Jardim
    Se abandonar as funções governativas em Janeiro de 2015, logo depois da escolha do seu sucessor na liderança do PSD, promessa que regista algum recuo, o partido maioritário poderá indicar o nome do novo inquilino da Quinta Vigia, eventualmente o vencedor das directas sociais-democratas. O Estatuto da Madeira diz claramente que a "apresentação, pelo presidente do Governo Regional, do pedido de exoneração" implica a demissão do governo.
     
  2. Remodelação do Governo sem eleições
    Em caso da demissão de Jardim, compete ao representante da República, “tendo em conta os resultados das [últimas] eleições para a Assembleia Legislativa Regional e ouvidos os partidos políticos nela representados”, nomear o presidente do Governo Regional. Os restantes membros do executivo são “nomeados e exonerados pelo representante da República, sob proposta do presidente do Governo”. 
     
  3. Dissolução da Assembleia regional
    É o cenário inevitável, se vencer um dos candidatos não alinhados com Jardim (caso de Miguel Albuquerque, Miguel de Sousa e Sérgio Marques) que exigem a legitimação do governo com nova ida às urnas, também reclamada pela oposição externa. Se ganhar um concorrente mais próximo (Cunha Silva, Manuel António ou Jaime Ramos) que pretenda formar governo, este poderá cair com o chumbo da moção de confiança que acompanhará a apresentação do seu programa ou com a aprovação de uma moção de censura à sua execução. Neste momento, a maioria absoluta do PSD está dependente de apenas um deputado, por exemplo, de Sousa ou de um conotado com esta ou outra candidatura desalinhada.
     
  4. Eleições antecipadas
    No caso de uma dissolução sem cumprimento do mandato, o Presidente da República tem 55 dias para convocar eleições que seriam provavelmente até Abril, ou seja, a seis meses do período normal, que seria “entre 22 de Setembro e 14 de Outubro do ano correspondente ao termo da legislatura". Em 2007 Cavaco Silva cedeu a Jardim, que se demitiu para provocar a antecipação das eleições, transformadas pela sua recandidatura num plebiscito contra a “asfixia” da nova lei de finanças regionais, então aprovada por Sócrates para travar o descalabro das contas públicas da Madeira.

Sugerir correcção
Comentar