Correia de Campos: patrões podem exigir "contrapartidas" ao aumento do salário mínimo

Em entrevista à Antena 1, o presidente do Conselho Económico e Social considera que há condições para haver um acordo de concertação até 2020, como pediu o Presidente da República.

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Correia de Campos defende maior protagonismo do presidente do CES NFACTOS / FERNANDO VELUDO

O presidente do Conselho Económico e Social, Correia de Campos, alertou nesta quinta-feira, antes da reunião da concertação social, para o facto de poderem vir a ser pedidas contrapartidas “por alguns parceiros” para o aumento do salário mínimo.

“O Governo foi muito claro ao afirmar que vai apresentar à concertação social uma proposta de salário mínimo, mas nada disse sobre a outra face dessa proposta, [que são] as contrapartidas que certamente alguns dos parceiros não deixarão de exigir”, afirmou em entrevista à Antena 1. Correia de Campos considerou que “pode não ser saudável para a concertação que as negociações se travem apenas dentro das forças políticas que apoiam o Governo”, porque “a rigidez de um lado significa que a margem negocial dessa negociação só se possa exercer do outro”.

Nesta segunda entrevista depois da sua eleição no Parlamento, Correia de Campos voltou a mostrar-se confiante num acordo de concertação social de médio prazo, como pediu o Presidente da República, considerando que há abertura para o diálogo. “A disponibilidade que os dois parceiros mostraram para dialogar em sede de concertação social sobre essa matéria é muito positivo”, disse.

Marcelo Rebelo de Sousa recebeu, no início do mês, os parceiros sociais para avaliar a disponibilidade de ser celebrado um acordo de médio prazo para o salário mínimo nacional, a legislação laboral, a fiscalidade e a competitividade. Correia de Campos considera que há espaço para o debate: “Se, independentemente do mérito de cada uma das questões, [os parceiros] puderem discuti-las, acho magnífico. E farei todos os possíveis para propiciar essa discussão”, disse à rádio pública.

Até porque entende haver uma janela de oportunidade neste momento: “Quando o Conselho Económico e Social aprova sistematicamente as Grandes Opções do Plano e o relatório do Orçamento do Estado para o próximo ano por unanimidade, isso significa que há um terreiro onde as coisas fluem”, começou por afirmar.

Salientou, no entanto, a importância do chefe de Estado para que tal se concretize. “O Presidente da República não se tem poupado a esforços verbais - e não sei se outros não verbais - para pugnar por uma concertação. Eu não sou pessimista sobre essa matéria, acho que há condições para isso”. Mas avisou: “Se o contexto económico se extremar, se por exemplo os juros da dívida soberana sobem a um termo terrível, se foi necessário tomar medidas mais drásticas, nessa altura pode estar criado um caldo de cultura que inviabiliza qualquer consenso”.

O antigo ministro da Saúde elogiou também a solução governativa protagonizada pelo PS: “Era um estereótipo dizer que nunca seria possível o PS, que é um partido de centro-esquerda, entender-se com os partidos à sua esquerda. Tirando estes pensamentos, aos poucos provavelmente houve aproximações recíprocas. Não estou em condições de dizer quem é que se aproximou mais da bissectriz, mas estou em condições de dizer que o PS está no sítio certo”, considerou.

Por outro lado, elogiou a actuação dos partidos que apoiam o Governo no Parlamento. “Temos de estar gratos aos dois partidos à nossa esquerda – Bloco de Esquerda e PCP – porque eles foram os grandes moderadores na contenção de algum populismo à esquerda. E teria sido fácil, mas acho que o país ainda não se deu bem conta que esse papel foi bem desempenhado”, afirmou.

Correia de Campos defendeu, por outro lado, que o presidente do Conselho Económico e Social deveria ter mais poder na concertação social: “Um sistema óptimo seria aquele em que tudo fosse tranquilo, e as relações entre o sector laboral e o sector empresarial corressem normalmente […]. Se não fosse isso, diria que a solução mais bem desenhada seria que o Conselho Económico e Social presidisse à concertação social e que o Governo fosse apenas uma das três partes. Com a solução actual, o Governo é uma parte mas é um forte primus inter pares”.

Mas essa alteração está, afirmou, longe de poder ser proposta. Até porque, reconheceu, “o presidente do Conselho Económico e Social só pode intervir de forma útil se ganhar a confiança dos dois parceiros e do Governo, mas a confiança não se ganha por decreto nem por eleição: ganha-se através de uma prática que demora tempo”.

Correia de Campos disse ainda ter aceitado voltar a ir a votos no Parlamento depois de um primeiro “chumbo” porque considerou ser sua “obrigação”: “Aceitei ir à segunda tentativa porque tinha a obrigação de respeitar a democracia e entender que a democracia é um processo que tem os seus tempos, a sua gestação, a sua maturação”. Mas não iria a uma terceira tentativa.

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