“Não devemos ter medo de nos sentir inquietos”, diz Papa aos jovens
As mulheres, as alterações climatéricas e o elogio da insatisfação voltaram a ser tónicas dominantes do discurso de Francisco aos jovens universitários, esta manhã, na Universidade Católica, em Lisboa
Com um claro apelo ao inconformismo dos jovens, o Papa Francisco dirigiu-se esta manhã a uma plateia de universitários da Universidade Católica Portuguesa (UCP), em Lisboa, para lhes deixar o elogio da inquietude. “Desconfiemos das fórmulas pré-fabricadas, das respostas que nos parecem ao alcance da mão, extraídas da manga como se fossem cartas viciadas de jogar; desconfiemos das propostas que parecem dar tudo sem pedir nada”, apelou.
Perante uma plateia de milhares de estudantes (dentro e fora do recinto destinado aos convidados, entre os quais figuras como Durão Barroso, Leonor Beleza, Isabel Jonet e Braga da Cruz, entre outros, marcaram presença), Francisco reforçou: “Não devemos ter medo de nos sentir inquietos, de pensar que tudo o que possamos fazer não basta.” Afinal, na visão do Papa, “ser descontente é um bom antídoto contra a presunção da auto-suficiência e o narcisismo”.
“O ser incompleto caracteriza a nossa condição de indagadores e peregrinos”, reforçou o argentino. “Não nos alarmemos se nos encontramos intimamente sedentos, inquietos, incompletos, desejosos de sentido e de futuro, com saudades do futuro. Não estamos doentes, mas simplesmente vivos”, proclamou, num discurso que foi feito mais uma vez em castelhano e que foi aqui e ali interrompido por aplausos.
As preocupações de Francisco quanto aos jovens surgem quando lhes adivinha o imobilismo. “Preocupemo-nos antes quando estamos prontos a substituir a estrada a fazer por qualquer estação de serviço que nos dê a ilusão do conforto; quando substituímos os rostos pelos ecrãs, o real pelo virtual; quando, em vez das perguntas lacerantes, preferimos as respostas fáceis que anestesiam”, realçou, antes de lançar um apelo claro: “Procurai e arriscai.”
As mulheres, outra vez
Depois de se referir mais uma vez “à urgência dramática de cuidar da casa comum”, o líder da Igreja Católica voltou a insistir também na importância do papel da mulher. “De facto, é indispensável o contributo feminino. Aliás vê-se, na Bíblia, como a economia familiar está em grande parte na mão da mulher. É ela a verdadeira 'governante' da casa, com uma sabedoria que não visa exclusivamente o lucro, mas o cuidado, a convivência (…). Abordar os estudos económicos com esta perspectiva é entusiasmante, tendo em vista devolver à economia a dignidade que lhe compete, para que não caia como presa do mercado selvagem e da especulação”, preconizou, referindo-se à inclusão de Santa Clara de Assis na nova cátedra que a UCP decidiu criar dedicada à economia de são Francisco de Assis.
Dirigindo-se depois directamente aos responsáveis da UCP, Francisco elogiou as palavras da reitora, Isabel Capeloa Gil, quando esta afirmou que “a universidade não existe para se preservar como instituição, mas para responder com coragem aos desafios do presente e do futuro”.
“À universidade que se comprometeu a formar as novas gerações, seria um desperdício pensá-la apenas para perpetuar o actual sistema elitista e desigual do mundo com o ensino superior que continua a ser um privilégio de poucos. Se o conhecimento não for acolhido como uma responsabilidade, torna-se estéril”, alertou, para concluir que “se quem recebeu um ensino superior — que hoje, em Portugal e no mundo, continua a ser um privilégio —, não se esforça por restituir aquilo de que beneficiou, significa que não compreendeu profundamente o que lhe foi oferecido”, lembrou.
Na sua intervenção, a reitora da UCP enfatizara o facto de a instituição atribuir prémios e bolsas a uma proporção significativa dos seus perto de 20 mil estudantes das suas 17 faculdades — espalhados por Braga, Lisboa, Porto e Viseu. “Somos uma universidade em saída, com forte sentido social e atribuindo bolsas de estudo e prémios a mais de 20% dos nossos alunos”, garantiu, durante uma cerimónia que contou também com as figuras cimeiras da hierarquia católica portuguesa.