Fratelli d'Italia

Se calhar era por termos o mesmo clube em Portugal. Não podíamos passar tanto tempo sem nos chatearmos. É sempre assim entre dois irmãos, não é? Decidimos escolher emblemas diferentes nos campeonatos estrangeiros. Em Itália, eu era “giallorossi”, ele “bianconeri”. Mas naquele Euro partilhado entre a Holanda e a Bélgica íamos ser ambos “azzurri”. Por umas semanas, Francesco Totti, o prodígio do meu lado, e Alessandro Del Piero, o herói do lado dele, iam jogar na mesma equipa. Nós tínhamos que concordar.

Foi por causa desse Euro que aprendi o hino de Itália, que, nem de propósito fala de irmãos. São dois anos de diferença. Meus para ele e de Totti para Del Piero. Só que daquela vez era eu o mais novo. Totti, 23 anos, marcou dois golos e fazia correr Inzaghi com passes verticais. Del Piero foi menos vezes titular e marcou um.

Os dois só estiveram em campo ao mesmo tempo 112 minutos em seis jogos de Europeu – afinal, era a Itália e a solidez defensiva não podia ser comprometida por dois fantasistas. Mas os minutos em que vimos o “10” e o “20” a trocarem a bola entre si pareciam-nos os mais especiais da história. Em particular o prolongamento da meia-final contra a Holanda: 30 minutos juntos.

A Selecção Nacional tinha sido eliminada na véspera – mão; penálti; golo de ouro; vergonha alheia – e tinha-se acabado o nosso problema ético: como podíamos querer que a Itália ganhasse um Europeu que podia ter sido de Portugal? O herói (improvável, porque Buffon se tinha lesionado às portas da competição) foi Francesco Toldo – e aquele equipamento cinzento a lembrar Zoff, que era então o seleccionador. Parou dois penaltis. Mas eu só tinha olhos para o remate à Panenka de Totti.

Veio a final. A França. Totti e Del Piero juntos mais de uma hora nesse jogo, mas não resolveram. Um golo francês para lá dos 90 que levou a decisão para o prolongamento. Depois, mais um golo de ouro – a pior invenção da história do futebol – a dar o título aos “bleus”. E nós a olharmos um para o outro como que a pensar: na próxima época voltamos a discordar.

Sugerir correcção
Comentar