Cinco vezes maior do que o mítico Titanic e mais longo do que a Torre Eiffel, o Icon of the Seas é o novo maior navio de cruzeiro do mundo e navega actualmente as águas do Noroeste do oceano Atlântico, na sua viagem inaugural pelas ilhas das Caraíbas, que teve início na cidade norte-americana de Miami, no passado sábado, 27 de Janeiro. Apesar de esta “cidade flutuante” se mover alimentada por uma fonte de energia mais ecológica em relação às emissões de CO2, alguns ambientalistas denunciam que a libertação de metano pode ser mais prejudicial. “É um passo na direcção errada.”
Construído nos estaleiros navais da empresa finlandesa Meyer Turku, o novo navio recordista da Royal Caribbean conta com seis motores de baixa pressão de combustível duplo, que podem ser alimentados por gás natural liquefeito (GNL), uma fonte de energia mais ecológica do que o combustível marítimo tradicional utilizado em navios de grande porte.
Em relação às emissões de carbono para a atmosfera, de acordo com a empresa norte-americana de transporte marítimo, o seu novo cruzeiro revela-se 24% mais eficaz do que o valor exigido pelo regulador global de transporte marítimo, a Organização Marítima Internacional (OMI).
Contudo, a libertação de metano gasoso para a atmosfera, um fenómeno conhecido por “deslizamento de metano” (methane slip, em inglês), uma consequência do processo de conversão em energia do GNL, preocupa várias organizações ambientais, que denunciam o impacto ambiental negativo deste combustível, cada vez mais utilizado nas embarcações de grande porte.
“É um passo na direcção errada”, acredita Bryan Comer, director do Conselho Internacional para o Transporte Limpo (ICCT). “Estimamos que a utilização de GNL como combustível marítimo emite mais de 120% de emissões de gases com efeito de estufa ao longo do ciclo de vida do que o gasóleo marítimo”, explica o director do think tank sobre política ambiental à agência de notícias Reuters. Quando comparado com o dióxido de carbono, o metano demonstra ser mais prejudicial para o ambiente, ao reter 80 vezes mais calor do que o CO2 durante 20 anos após ser libertado para a atmosfera.
Os motores dos navios de cruzeiro têm um deslizamento de metano médio de cerca de 6,4%, concluiu a investigação financiada pelo ICCT em conjunto com outros parceiros, uma média superior em comparação com o valor assumido pela OMI de 3,5%.
Ao jornal britânico The Guardian o director do ICCT afirma que a utilização do GNL representa um investimento em “soluções climáticas falsas” por parte da indústria de cruzeiros. “Consideram o GNL um combustível ecológico, quando o motor está a emitir 70% a 80% mais emissões de gases com efeito de estufa por viagem do que se utilizasse combustível marítimo normal”, contesta Bryan Comer. “O Icon of the seas tem os maiores tanques de GNL jamais instalados num navio. É greenwashing”, conclui.
Segundo o relatório do ICCT, a utilização de gás natural liquefeito enquanto combustível naval tem vindo a crescer rapidamente, duplicando de 2,2 milhões de toneladas (mt) em 2018 para 4,4mt em 2022, dados que somente contabilizam os navios que comunicam dados ao sistema de monitorização, comunicação de informações e verificação da União Europeia (EU).
O relatório cita o quarto estudo da OMI sobre a emissão de gases com efeito de estufa. Através de análises laboratoriais, dados fornecidas pelos fabricantes dos motores e medições a bordo de navios, o estudo concluiu que “o consumo mundial de combustível marítimo GNL cresceu 30% entre 2012 e 2018, resultando no aumento estimado de 150% nas emissões de metano”, lê-se na publicação científica.
Segundo a Cruise Line International Association, cerca de 34 dos 54 navios encomendados entre Janeiro de 2024 e Dezembro de 2028 serão movidos a GNL. Actualmente, entre 300 navios de cruzeiro em navegação, são cerca de 18 as embarcações impulsionadas por este combustível, cita o The Guardian.
Em 2023 Portugal voltou a ser o sexto país europeu onde os navios de cruzeiro mais emitem óxidos de enxofre, compostos químicos poluentes, concluiu o estudo desenvolvido pela organização ambientalista Zero, que pôs Lisboa em quinto e Funchal em décimo lugares no ranking de poluidores europeus por navios de cruzeiro. Nesse mesmo ano, a actividade de cruzeiros na capital portuguesa registava o melhor ano de sempre, ao ultrapassar pela primeira vez os 700 mil passageiros.