De volta ao escritório? O que dizem os peritos em saúde pública sobre a utilização do elevador

O regresso ao escritório está a acontecer e com este a utilização de elevadores. Como lidar com a partilha de espaços muito apertados com estranhos?

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“Se se estiver a usar uma máscara e os outros também, não acho que [andar de elevador] represente qualquer risco” Reuters/ANTARA FOTO

Mesmo antes da nova pandemia do coronavírus SARS-CoV-2, a etiqueta reinava nos elevadores: cara voltada para a frente; segurar a porta para os estranhos entrarem; evitar os tagarelas. Agora, as agências de saúde e os especialistas pedem que se sigam regras adicionais: usar sempre máscara, tocar nos botões com um objecto e evitar falar sempre que possível.

Se todos seguirem estas recomendações, “não há essencialmente nenhum risco num elevador”, assegura a médica especialista em doenças infecciosas Colleen Kraft, médica no Hospital Universitário Emory, em Atlanta, EUA. “É um período de tempo curto”, justifica. “Se se estiver a usar uma máscara e os outros também, não acho que [andar de elevador] represente qualquer risco.”

O director do programa Edifícios Saudáveis da Escola de Saúde Pública da Universidade de Harvard, Joseph Allen, considera ser compreensível que os elevadores possam causar ansiedade. “É um ponto de estrangulamento natural no edifício”, explica, ao mesmo tempo que recorda que nos foi dito “para nos mantermos a dois metros uns dos outros”.

Mas, lembra Alle, há que ter em conta que o que determina a exposição ao perigo são três factores: intensidade, frequência e duração. E, para a maioria dos trabalhadores de escritório, a frequência dos passeios de elevador é baixa — talvez uma ou duas viagens de ida e volta num dia de trabalho. E, sendo a maioria das viagens de um minuto ou menos, a duração é curta.

As restrições de ocupação e as regras de não falar visam reduzir a intensidade, limitando a quantidade de vírus libertados sob a forma de gotículas ou aerossóis. O elevador é “um local onde o risco pode ser gerido de forma muito eficaz”, vaticina Allen. Também as máscaras e os revestimentos faciais são essenciais. Colleen Kraft cita uma frase que se tornou comum entre os especialistas em doenças infecciosas: “A minha máscara protege-te, a tua máscara protege-me.”

O que a história nos conta

Existe investigação limitada para descrever os elevadores durante as pandemias passadas ou presentes. Lee Gray, professor de História da Arquitectura na Universidade da Carolina do Norte em Charlotte, escreveu um relato histórico sobre elevadores do século XIX, tendo analisado a sua utilização durante a pandemia de gripe de 1918 — mas pouco encontrou, excepto fotografias que mostram que os operadores dos ascensores usavam máscaras.

Em Abril, Richard Corsi, reitor de engenharia da Portland State University e perito em qualidade do ar, partilhou no Twitter uma simulação de uma viagem de elevador. Se uma pessoa desmascarada subisse dez andares de elevador, enquanto falava ao telefone e tossisse uma vez, o modelo de Corsi previa que as partículas infecciosas do vírus permaneceriam enquanto o elevador voltasse ao piso inferior.

Mas esse é apenas um cenário, advertiu Corsi, a partir de um cálculo ainda não testado. “As pessoas arrastam o ar com elas, especialmente se são um grupo que se desloca”, disse Corsi. “Para obter uma dose justa, tem de haver uma concentração muito elevada a um nível elevado de coisas por litro de ar”, como andar ao lado de uma pessoa infectada a falar ou a tossir durante vários minutos. “O segredo é minimizar o tempo que se está num elevador com alguém infectado.”

Um relatório de Maio de um hospital em Wuhan, na China, avaliou espaços públicos, incluindo elevadores, para a presença do vírus. Esfregaços de botões de elevadores detectaram material genético viral, embora os autores do estudo não tenham relatado casos de infecção ligados a essas superfícies.

Superfícies: qual o risco?

Embora as pessoas devam ter cuidado ao tocar nas superfícies que não limparam, Kraft aconselha a não usar luvas. É demasiado fácil usá-las mal ou ser-se levado numa falsa sensação de segurança, diz a especialista. Em vez disso, a médica aconselha que se use um palito, um canto de tecido da camisa ou outra barreira para tocar nos botões.

Para que quem utiliza o elevador se mantenha fisicamente distante, os Centros de Controlo e Prevenção de Doenças recomendam o afastamento mínimo de 1,80m. Mas, para Allen, isso não é prático — e pode ter um efeito negativo não intencional.

“Isso significa que estão a aconselhar uma pessoa por viagem de elevador”, diz. “Em alguns destes grandes edifícios”, referindo-se aos prédios de escritórios em Nova Iorque, mas que podem ser comparados com outras grandes cidades, “se tivermos uma pessoa a andar de elevador, vamos ter centenas, ou mesmo milhares, de pessoas no átrio”. “E isso cria uma maior exposição”. Em vez disso, Allen sugere que as pessoas entrem no elevador num padrão de tabuleiro de xadrez, talvez guiadas por desenhos no chão, para se manterem um pouco separadas, evitando ao mesmo tempo multidões no átrio.

“Todos têm um papel a desempenhar neste cenário”, continua Allen. Isso inclui proprietários de edifícios, que podem afixar sinais sobre o uso adequado de elevadores; empregadores, que podem criar turnos para evitar surtos nas horas de ponta; e os utilizadores, que podem respeitar a etiqueta respiratória. “Se todos fizerem a sua parte, podemos reduzir o risco colectivamente.”

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