Querem combater o Chega? Deixem André Ventura falar

Será a proibição da exposição de André Ventura e do Chega no palco político e mediático eficaz ou moral? Vejamos porque é que a resposta é não.

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Daniel Rocha

“Discordo do que dizes, mas defenderei até à morte o direito de o dizeres”, dizia Voltaire. Com o surgimento de partidos políticos de extrema-direita e populistas, a defesa da liberdade de expressão nunca foi tão posta à prova e, em vez da máxima de Voltaire, a frase que comanda os dias de hoje é mais parecida com algo do género: “Discordo do que dizes e vou defender até à morte o meu direito de te impedir de o dizeres”.

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“Discordo do que dizes, mas defenderei até à morte o direito de o dizeres”, dizia Voltaire. Com o surgimento de partidos políticos de extrema-direita e populistas, a defesa da liberdade de expressão nunca foi tão posta à prova e, em vez da máxima de Voltaire, a frase que comanda os dias de hoje é mais parecida com algo do género: “Discordo do que dizes e vou defender até à morte o meu direito de te impedir de o dizeres”.

Falemos do Chega. Desde que este partido surgiu, muitas pessoas que consideram o mesmo uma abjecção, têm-se questionado como se deve combatê-lo: Fingimos que não existe, não deixando que André Ventura fale e tenha qualquer tipo de exposição? Ou debatemos ideias com o mesmo e expomos André Ventura ao contraditório?

Para muitos, a resposta é a primeira opção. Um exemplo relevante é a agora candidata à Presidência da República Ana Gomes que defende que o Chega não deveria ter sido legalizado e que, como Marisa Matias, diz que não daria posse a um governo com apoio parlamentar do Chega, o que não passa de uma falsa promessa já que o Presidente da República não pode não dar posse a um governo com apoio parlamentar de um partido legalizado. 

Mas será a proibição da exposição de André Ventura e do Chega no palco político e mediático eficaz ou moral? Vejamos porque é que a resposta é não. Stuart Mill, no seu ensaio sobre a Liberdade disse o seguinte: “O mal peculiar de fazer calar a enunciação duma opinião está em que é um roubo (…) Se a opinião é justa, são privados da oportunidade de trocar o erro pela verdade; se injusta, perdem, o que é um benefício quase do mesmo quilate, o chegar à percepção mais clara e à impressão mais viva da verdade que a colisão desta com o erro produz.”

Embora pareça mais intuitivo, apetecível e fácil, o acto de calar e proibir não é eficiente. Ao recusar trazer uma ideia para um debate intermediado e com contraditório, Ventura acaba por falar sozinho com os seus admiradores, até tendo em conta que hoje em dia existem muitos meios para o fazer. Mas se nos focarmos em mostrar as contradições de André Ventura e combater as suas ideias com ideias melhores estaremos a ser mais eficientes e até democráticos, já que a recusa de ouvir uma opinião parte do princípio de que a nossa certeza é a certeza absoluta, mas a realidade é que ninguém é infalível.

Dir-me-ão que estou a ser contraditória, já que ao não nos recusarmos a ouvir outras ideias podemos estar a legitimar ideias anti-democráticas. E, de facto, a democracia tem essa contradição. Mas da mesma forma que partidos anti-democráticos podem ganhar relevância e posição nas instituições democráticas, enquanto vivermos em democracia, a persuasão e o combate através de ideias são utensílios que todos temos o poder e dever de usar para combater os nossos opositores. Como disse a deputada do PS Isabel Moreira: “Às vezes, custa muito ser democrata. Pode até ser impopular. Mas uma pessoa que respeita a Constituição não excepciona o respeito quando a dureza espreita. Levanta a cabeça e luta. Politicamente.”

E, portanto, a liberdade de expressão só faz sentido se a defendermos para ideias que detestamos. Se isto implica defendermos o direito de demagogos, negacionistas ou mentirosos poderem falar? Claro. Mas tal como dizia José Mário Branco sobre a cantiga ser uma arma, também a palavra é uma arma, e se os nossos opositores usaram dela para proferirem imbecilidades, usemos da mesma moeda para desconstruí-las.