Marcelo lembra que existem quase dois milhões de portugueses pobres

Chefe de Estado assinala Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza com nota na página da Presidência da República na Internet.

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Marcelo Rebelo de Sousa LUSA/RODRIGO ANTUNES

Marcelo Rebelo de Sousa lembrou nesta quinta-feira que “quase dois milhões de portugueses são pobres”, numa nota colocada na página da Internet da Presidência da República a propósito do Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza.

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Marcelo Rebelo de Sousa lembrou nesta quinta-feira que “quase dois milhões de portugueses são pobres”, numa nota colocada na página da Internet da Presidência da República a propósito do Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza.

“Os anos passam e por ocasião de efemérides, como a que hoje assinalamos, somos confrontados com problemas que persistem e para os quais temos de olhar com maior ambição. O combate à pobreza e a correcção das desigualdades sociais são duas prioridades que exigem determinação e responsabilidade colectiva”, escreve o chefe de Estado.

Marcelo recorda ainda que, em muitos casos, a pobreza atinge pessoas que “trabalham ou estudam, que vivem com as mesmas necessidades, com as mesmas ambições de todos os outros compatriotas”.

“Manuela Silva, que dedicou a vida a esta causa, dizia que a pobreza é uma violação dos direitos humanos. Criticando, na nossa sociedade, os crivos apertados para julgar os mais pobres, deixando passar as grandes disfuncionalidades no topo da escala social. Portugal tem sido assertivo no esforço para esbater esse fosso. Apelo à necessária persistência e determinação para assim continuar”, acrescenta o Presidente da República.

Marcelo Rebelo de Sousa afirma ainda que é necessário combater a pobreza “caso a caso, pessoa a pessoa”, como “um fenómeno mais global, de múltiplas causas, e abordagem transversal” e “com estratégia, juntando meios públicos e privados, experiência social e solidária, inspirando cidadãos para a causa de um Portugal mais justo e coeso”.

Cerca de 330 mil crianças em risco de pobreza

Segundo revelam os dados mais recentes do Instituto Nacional de Estatística (INE), cerca de 330 mil crianças estão em risco de pobreza em Portugal, sendo que o grupo etário até aos 18 anos é o mais afectado, o que significa que há mais crianças pobres do que adultos ou idosos.
Os dados mostram ainda que o risco de pobreza entre as crianças e jovens até aos 18 anos era de 19%, o que, num universo de mais de 1.729.675 menores, representa perto de 330 mil crianças.

Em declarações à agência Lusa, o investigador e docente da Universidade do Minho, especialista em sociologia da infância, Manuel Sarmento confirmou que o sector da população entre os zero e os 18 anos é o grupo mais afectado pela pobreza em termos percentuais.
"O que significa que há mais crianças pobres do que adultos pobres ou idosos pobres”, apontou.

Uma constatação confirmada com as estatísticas do INE, que revelam que a taxa de risco de pobreza no grupo etário entre os 18 e os 64 anos era de 16,7%, enquanto na população com mais de 65 anos chegava aos 17,7%.

“As crianças continuam a ser efectivamente o grupo populacional mais afectado pela pobreza, designadamente o que se chama pobreza monetária, ou seja, que vivem em agregados familiares cujo rendimento “per capita” é inferior a 60% da mediana do rendimento nacional “per capita"”, explicou Manuel Sarmento.

Já a professora do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), da Universidade de Lisboa, e investigadora na área da pobreza infantil, Amélia Bastos salientou que, apesar de ter havido algumas melhorias nos últimos anos, as crianças continuam a ser um grupo “particularmente exposto à pobreza”.

“As famílias com crianças, apesar do desagravamento, são aquelas que apresentam maior risco de pobreza relativamente àquelas que não têm crianças”, referiu, acrescentando que nos últimos anos “houve uma melhoria generalizada no nível de vida, mas as crianças continuam a ser o grupo com maior incidência de pobreza monetária”.

Por outro lado, a vice-presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN) Portugal destacou, com base na análise feita pelo Observatório Nacional de Luta Contra a Pobreza aos dados do Inquérito às Condições de Vida e Rendimento, que a população jovem entre os 15 e os 24 anos “é dos grupos mais vulneráveis às questões da pobreza e da exclusão social”.

“Para este grupo etário a vulnerabilidade à pobreza assume proporções muito superiores à média nacional. O risco de pobreza e de exclusão é de 30,3% na população entre os 15 e os 19 anos, e de 25,8% na população dos 18 aos 24 anos”, sublinhou Sandra Araújo.

A responsável da EAPN alertou que Portugal continua a ser dos países mais desiguais da Europa e chamou a atenção para as consequências ao longo do ciclo de vida destas crianças e jovens que depois serão muito mais difíceis de resolver.

“Se não houver políticas direccionadas para a primeira infância, há tendência para perpetuar ciclos geracionais de pobreza a todos os níveis”, avisou.
O professor Manuel Sarmento defendeu que “é absolutamente fundamental” uma política integrada para a infância, para todas as crianças e não só as mais pobres, notando que ainda existe uma “excessiva compartimentação do que são as políticas públicas”.

“Talvez o novo Governo pudesse criar uma estrutura interministerial, eventualmente dependente do primeiro-ministro, para articular as políticas públicas e desenvolver e promover a estratégia [nacional para os direitos da criança] que venha a ser aprovada”, sugeriu.

O investigador sublinhou, no entanto, que nunca será possível combater a pobreza nas crianças se não se combater a pobreza dos pais das crianças e defendeu uma intervenção mais articulada consoante as necessidades dos mais novos.

Apesar de concordar, a docente e investigadora Amélia Bastos entende que a solução não passa por simplesmente aumentar os rendimentos das famílias e alertou que há famílias que podem ter um rendimento médio elevado e as crianças viverem em condições de pobreza.
Por isso, recomenda que as crianças passem a contar como uma unidade estatística nas estatísticas nacionais para serem observadas as suas reais condições de vida -- e não só as do agregado familiar -, perceber o que é importante para elas e o que está em falta, nomeadamente em termos de educação, saúde, alimentação e habitação.