Funcionários das Finanças, Segurança Social e SEF detidos por corrupção na legalização de imigrantes

Mais de 20 pessoas foram detidas. Fisco detectou indícios de crimes na emissão de números de contribuintes em 2016 e denunciou factos ao Ministério Público.

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Fábio Augusto

Mais de 20 pessoas foram detidas na manhã desta terça-feira numa megaoperação da Polícia Judiciária (PJ) para desmantelar uma associação criminosa nas estruturas do Estado ligada à legalização de imigrantes. Entre os detidos estão dois funcionários das Finanças, dois da Segurança Social, uma inspectora do SEF e três advogados. 

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Mais de 20 pessoas foram detidas na manhã desta terça-feira numa megaoperação da Polícia Judiciária (PJ) para desmantelar uma associação criminosa nas estruturas do Estado ligada à legalização de imigrantes. Entre os detidos estão dois funcionários das Finanças, dois da Segurança Social, uma inspectora do SEF e três advogados. 

Há três anos, a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) detectou indícios de irregularidades internas na emissão de Números de Identificação Fiscal (NIF) a cidadãos residentes noutros países e, a partir daí, desencadeou um inquérito e avançou com processos disciplinares a dois funcionários.

O inquérito foi aberto em Outubro de 2016 e, em Fevereiro do ano seguinte, instaurou os processos. Os factos apurados no inquérito foram participados ao Ministério Público. A partir daí, a administração fiscal tem estado a colaborar com a PJ e o Ministério Público, “com o objectivo de contribuir para a prossecução da investigação, ao apuramento de todas as eventuais condutas criminosas e à responsabilização dos seus alegados autores”, refere um comunicado emitido pela AT.

Fonte da Unidade Nacional de Contraterrorismo da PJ confirmou ao PÚBLICO que a operação desencadeada nesta terça-feira tem como objectivo desmantelar o grupo de auxílio à imigração ilegal, que envolve funcionários de organismos do Estado. A PJ emitiu um comunicado no qual explica que essa “organização criminosa” seria “responsável pela introdução ilegal em Portugal e na Europa, de milhares de imigrantes”, oriundos de “diversos países da Ásia Meridional e África”. 

Foram realizadas dezenas de buscas domiciliárias e não domiciliárias e detidas dezenas de pessoas suspeitas de integrarem esta estrutura criminosa, “constituída por indivíduos com vastos antecedentes criminais e com ligações a redes internacionais”, explica a PJ. 

Os detidos, entre os quais se encontram funcionários da Autoridade Tributária, do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) e do Instituto da Segurança Social (ISS), têm idades compreendidas entre os 28 e os 64 anos e são suspeitos da prática dos crimes de associação criminosa, auxílio à imigração ilegal, de casamento por conveniência, de falsificação de documentos, de abuso de poder, de corrupção activa e passiva, de branqueamento, de falsidade informática e acesso indevido. Serão presentes na quinta-feira a juiz no Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa.

Funcionária do SEF já era arguida

De acordo com o SEF, a funcionária que foi detida no âmbito desta operação “havia já sido constituída arguida no âmbito de um processo-crime instaurado” pelo próprio organismo e alvo de um processo disciplinar, “devido aos fortes indícios da prática dos crimes de corrupção passiva, abuso de poder e falsificação de documentos”.

O PÚBLICO sabe que se trata de Sónia Francisco, que exercia funções de chefe da delegação de Alverca. 

O ISS também confirma, em comunicado, a operação “visando o desmantelamento de uma associação criminosa dedicada à legalização de imigrantes” e as buscas que tiveram lugar no seu edifício sede. Estão envolvidos “dois funcionários” daquele organismo público.

A Segurança Social garante estar “a prestar toda a colaboração à Polícia Judiciária” e assegura que esta operação se enquadra “no esforço que, que nos últimos anos tem vindo a desenvolver” para prevenir a corrupção. A investigação que agora vem a público “resulta da implementação desses mecanismos de prevenção e combate à fraude interna e externa”, assegura o ISS.

240 inspectores

No terreno estiveram 240 inspectores da PJ, numa equipa liderada por juízes e magistrados do Ministério Público, que fizeram ainda buscas na Autoridade Tributária, Segurança Social e escritórios de advogados, apurou o PÚBLICO.

Segundo avança a TVI, esta rede que actuava nas estruturas do Estado legalizava imigrantes em troca de subornos há largos anos. De acordo com a mesma fonte, esta investigação da Unidade Nacional Contra Terrorismo da PJ dura há mais de três anos, e os detidos são suspeitos de se deixarem corromper por redes mafiosas bem estruturadas, com as quais têm ligações e que apostam na exploração e no tráfico de imigrantes, muitas das vezes com fins de escravatura laboral ou sexual, em Portugal e noutros países do espaço Schengen, para onde seguem depois de o nosso país lhes servir de porta de entrada na Europa.

De acordo com o Diário de Notícias, o grupo suspeito criava empresas-fantasma para criar contratos de trabalho, também fictícios, para os imigrantes, e contava com a ajuda de funcionários dos Estado que eram pagos para acelerar a obtenção dos necessários números de contribuinte e de segurança social e também das autorizações de residência. Em alguns casos, noticia o DN, houve também a angariação de noivas para os chamados “casamentos brancos”, para conseguirem um visto comunitário.

Ministro destaca importância do combate à imigração ilegal

Ao comentar a operação Rota do Cabo, o ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, referiu que “a imigração legal é fundamental para o futuro da economia portuguesa”.

Segundo o ministro, Portugal é “um país que valoriza o papel das migrações”. “A imigração ilegal e o tráfico de seres humanos é algo que deve ser combatido e é uma prioridade da acção do SEF”, disse.

“Não conheço, naturalmente, os detalhes de algo que é competência das autoridades judiciárias, mas o combate à imigração ilegal e ao tráfico de seres humanos é uma prioridade absoluta das políticas públicas”, afirmou Eduardo Cabrita, segundo o qual a funcionária do SEF, que tem sido mencionada como estando envolvida neste caso, “já tinha sido detida pelo próprio SEF em 2018, e estava, aliás, suspensa de funções”. Porém, depois de suspensa a funcionária regressou ao serviço, embora sem crachat, sem arma e sem livre-trânsito. Passou a trabalhar na sede do SEF, no Taguspark, em Oeiras.

Questionado como fica a imagem do SEF, quando tem alguém envolvido em algo que é suposto combater, o ministro da Administração Interna declarou: “O SEF é a força que nos aeroportos detecta casos de tráfico de crianças, o SEF é uma entidade que na Frontex salva vidas e protege as fronteiras europeias. É uma referência europeia. O SEF – disse-o ainda ontem, quando, ao fim de 15 anos, 100 novos inspectores, finalmente, por concurso externo, ingressaram no SEF  é um motivo de orgulho para Portugal.”

Também a autoridade tributária, liderada por Helena Borges, fez questão de renovar a confiança no conjunto dos 11 mil trabalhadores. “Embora a conduta destes dois trabalhadores não tenha estado à altura daqueles padrões, tendo sido instaurados os competentes processos disciplinares, esta instituição [fisco] mantém a confiança na generalidade dos seus cerca de 11.000 funcionários, que promovem diariamente que cada contribuinte pague os impostos devidos, essenciais ao financiamento dos mais variados serviços públicos, desde a saúde à educação, ao serviço de todos”, sublinha a AT numa nota publicada no seu site.