Portugal, um país à procura de bússola

Portugal deixou há muito de pensar em termos estratégicos. A política é absorvida pela voracidade do curto prazo.

O mundo está a mudar rapidamente. O novo paradigma da conectividade está a alterar o funcionamento da economia, as cadeias de produção industrial, de transporte e abastecimento, as plataformas logísticas, o comércio e os modos de criação de riqueza. A globalização está a fazer-se através do espaço digital e do mar. Mais de 90% do comércio mundial faz-se hoje através do mar. 40% do PIB mundial depende do fluxo de bens, serviços e capital e na próxima década vai chegar aos 75%. A digitalização da economia, a revolução da inteligência artificial e da robótica, abrem novas oportunidades ao mesmo tempo que criam roturas nos paradigmas tradicionais. Neste contexto, as nações que vão ter sucesso no século XXI são aquelas que compreendem as novas tendências da globalização e que sabem inserir-se nas redes do conhecimento, tecnologia, comércio, energia, finanças e talento que comandam o desenvolvimento económico e geram prosperidade. Mais conectividade significa hoje mais crescimento, mais fluxos, mais redes, mais riqueza.

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O mundo está a mudar rapidamente. O novo paradigma da conectividade está a alterar o funcionamento da economia, as cadeias de produção industrial, de transporte e abastecimento, as plataformas logísticas, o comércio e os modos de criação de riqueza. A globalização está a fazer-se através do espaço digital e do mar. Mais de 90% do comércio mundial faz-se hoje através do mar. 40% do PIB mundial depende do fluxo de bens, serviços e capital e na próxima década vai chegar aos 75%. A digitalização da economia, a revolução da inteligência artificial e da robótica, abrem novas oportunidades ao mesmo tempo que criam roturas nos paradigmas tradicionais. Neste contexto, as nações que vão ter sucesso no século XXI são aquelas que compreendem as novas tendências da globalização e que sabem inserir-se nas redes do conhecimento, tecnologia, comércio, energia, finanças e talento que comandam o desenvolvimento económico e geram prosperidade. Mais conectividade significa hoje mais crescimento, mais fluxos, mais redes, mais riqueza.

Como é que Portugal se está a adaptar a estes novos paradigmas? Não muito bem. O país tem tendência para repetir os erros do passado. Quando estudamos a história económica portuguesa verificamos que no início do século XX o país falhou a globalização de então e com isso cavou o seu atraso e pobreza endémicos. A indústria portuguesa e o PIB cresciam então a um ritmo acelerado mas faltou visão estratégica. A indústria não se especializou nos sectores adequados, seguiu a via da concorrência direta com as nações mais desenvolvidas e perdeu a globalização. Faltou ligação integradora entre indústria, agricultura, transportes e os outros setores de atividade. Este erro trágico pode repetir-se no século XXI.

Sejamos claros: nos últimos anos o país recuperou, fez a consolidação orçamental, controlou as contas públicas, diminuiu o défice de forma extraordinária. O Governo atual devolveu rendimento aos portugueses e gerou uma nova esperança. Mas tudo isto, que é muito, não é suficiente. O país não está preparado para enfrentar uma nova crise financeira e económica e ela vai aparecer. Uma nova e persistente turbulência nos mercados, a subida das taxas de juro, a subida do preço do petróleo, o fim da política de compra da dívida pelo BCE, tudo isso são fatores que podem desestabilizar profundamente a economia portuguesa. Não podemos esquecer que o país já esteve oito vezes em bancarrota e não temos tirado todas as ilações do que aconteceu nessas alturas dramáticas. Neste quadro, o que é preciso fazer além de tudo o que tem sido feito?

Primeiro: mais atenção à economia, às empresas, à necessidade de se criarem novos motores de riqueza. Entre 2001 e 2015 a taxa média de crescimento da economia portuguesa foi de 0,05%, uma vergonha nacional, fruto da incompetência das políticas públicas. A economia nos últimos anos recuperou mas pouco porque vivemos num país que hostiliza as empresas. Os setores mais extremistas que apoiam o Governo fazem disso a base da sua política populista e oportunista, como se vê em relação à energia. O mantra é que as empresas são as más da fita e com isso lançam-se suspeições sobre setores inteiros de atividade. A demonização das empresas é má política porque são elas que criam riqueza e sem riqueza nada é possível. A ironia é que os setores políticos extremistas estão sempre a reivindicar mais despesa pública mas asfixiam tudo o que pode produzir riqueza como se o dinheiro nascesse das árvores. Foi assim que com o argumento de defender o turismo, que é sem dúvida um setor importante da economia portuguesa, mataram as possibilidades de o país explorar os seus recursos de gás, petróleo e minerais no offshore. Estes projetos podiam criar novos motores de riqueza, diversificar a economia, alavancar a investigação das universidades e centros tecnológicos, abrir uma nova janela para o futuro. Este erro trágico vai pesar como uma espada de Dâmocles sobre a cabeça dos que fazem do “curto-prazismo” e do oportunismo o seu modo de vida.

Segundo: é preciso mais investimento. Entre 2001 e 2015, o investimento em Portugal caiu 47% e a sua percentagem em relação ao PIB caiu de 29 para 15%. Apesar de alguma ténue recuperação nos últimos anos, o país continua com um sério problema de reposição do seu stock de capital. Tem um problema grave de formação bruta de capital fixo. E sem investimento não há recuperação económica sustentável. Sem investimento não há futuro. A pouca atenção ao investimento, a incapacidade de atrair investidores de forma significativa prende-se com a atmosfera que o país respira, com a hostilização contínua às empresas, com a quebra de contratos estabelecidos e com o recurso aos tribunais internacionais. Esta forma leviana de lidar com as empresas é um apelo claro ao desinvestimento e não promete nada de bom. Acresce a isto a elevada carga de impostos e o regime fiscal pouco competitivo.

Terceiro: mudar o pensamento tradicional e passar a pensar em redes e em fluxos. Continuamos a ouvir dizer que o país é “periférico” e por isso está condenado. Periférico em relação a quê? Vemos hoje o papel central do mar na globalização, o crescimento dos grandes “hubs” portuários, o alargamento da cadeia marítima de transportes, a alteração das rotas. Com a ampliação do canal do Panamá e a descoberta de novos recursos minerais e energéticos na Bacia Atlântica, esta está a ser revitalizada. Neste quadro, Portugal tem uma posição estratégica privilegiada na Bacia Atlântica e, com uma política inteligente para os seus portos e a capitalização do seu recurso geográfico, pode inserir o país nas redes do comércio mundial, nas redes energéticas, financeiras, de comunicação, conhecimento e tecnologia, o que pode ser decisivo para o país sair da letargia em que se encontra em termos de desenvolvimento económico. Alguma coisa está a ser feita nestes domínios mas é muito pouco comparado com o que se pode fazer. Portugal deve estar cada vez mais conectado globalmente mas os nossos portos, plataformas logísticas, cadeias de valor, apesar dos enormes esforços feitos, continuam a atrair um volume residual do tráfego marítimo mundial. A inserção do porto de Sines na rede mundial de acolhimento do “shale gas” americano e a ligação das infraestruturas energéticas ibéricas ao resto da Europa marcam passo. Os Açores precisam de um novo ímpeto para os seus portos e o da Praia da Vitória pode ser transformado numa Estação de LNG (Gás Natural Liquefeito), o combustível que neste século vai mover os navios, mas nada acontece. A capacidade de criar espaços geoeconómicos será um fator chave do século XXI mas a nossa Zona Económica Exclusiva continua a marcar passo e a retórica é a nota dominante.

Tudo isto remete para o último ponto: Portugal há muito tempo deixou de pensar em termos estratégicos. A política é absorvida pela voracidade do curto prazo. As agendas mediáticas comandam o pensamento político e o que domina é o absolutismo do presente imediato. Isto é a matriz do tacticismo que gera medidas avulsas e favorece a improvisação e o experimentalismo. A política encolheu e está colonizada pelas políticas mediáticas da instantaneidade. Max Weber disse um dia que a tarefa principal da política é gerir o futuro. Parece que nos esquecemos disso quando hoje a tarefa principal da política é gerir o urgente do imediato. A bússola é importante para sabermos para onde vamos.

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico