A Sofia da vida de Luis Suárez

Como o amor de sempre do polémico atacante uruguaio transformou um adolescente indomável no “El Pistolero” que aterroriza as balizas adversárias.

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Sofia Balbi com o marido Luis Suarez, em 2015, quando ele recebeu a Bota de Ouro, como melhor goleador em Espanha Albert Gea /Reuters / Arquivo

Ela tinha 12 anos e ele quase 15 quando se conheceram. Foi amor à primeira vista e queriam que durasse para sempre. Sofia Balbi teve de partir para o outro lado do Atlântico e Luis ficou destroçado. Na despedida, choraram na paragem de um autocarro. O jovem não aguentou a distância e encontrou no futebol um meio para reencontrar a paixão. Passaram 17 anos e são hoje o casal mais feliz e mediático do Uruguai.

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Ela tinha 12 anos e ele quase 15 quando se conheceram. Foi amor à primeira vista e queriam que durasse para sempre. Sofia Balbi teve de partir para o outro lado do Atlântico e Luis ficou destroçado. Na despedida, choraram na paragem de um autocarro. O jovem não aguentou a distância e encontrou no futebol um meio para reencontrar a paixão. Passaram 17 anos e são hoje o casal mais feliz e mediático do Uruguai.

O conto de fadas é real, assim como a vida de Luis Suárez poderia ter saído de um livro de Charles Dickens. “O amor entre eles era um objectivo em si mesmo, provavelmente mais importante do que ter êxito no futebol”, recorda o treinador que o lançou na equipa do Nacional de Montevideu. Assistiu de perto à transformação que esta relação provocou no miúdo de rua indisciplinado e sem grande futuro que encontrou nas camadas jovens da equipa.

Mas recuemos um pouco mais. Natural de Salto, cidade a 500 km da capital, Luis era um dos sete irmãos do clã Suárez, família humilde, que trocava as laranjas do seu quintal por outros alimentos para equilibrar o orçamento do lar. Sem grandes oportunidades no interior do país, partiram para Montevideu, onde Luis começou a mostrar os seus dotes com a bola. Aos 12 anos prestou provas no Nacional, um dos mais importantes clubes do Uruguai a par do Peñarol, e ficou nos juvenis.

“Por vezes não tinha sapatos e jogava com uns emprestados. Vinha para os treinos a pé para entregar o dinheiro que poupava em casa”, contou Wilson Piriz, responsável pelas camadas jovens. “Isso são coisas que muitos não fariam com aquela idade.” Fora dos treinos contribuía para a casa apanhando latas na rua que vendia depois na sucata.

Um jovem tímido, franzino e de orelhas tortas, sem controlo parental, que rapidamente se deixou seduzir pela boémia, colocando em risco uma carreira que ainda nem existia. Sofia apareceu no momento certo: “Era um adolescente, mas conhecia-a com a idade perfeita. Ela não só me indicou o caminho como ajudou a corrigir-me e alertou-me sobre quem eram os meus amigos e quem não eram”, admitiria Luis anos mais tarde.

O amor foi instantâneo e Suárez mudou todo o seu comportamento. O carácter sereno de Sofia acalmava o seu espírito indomável. Tornava-o mais dócil. Luís nunca fora tão feliz. Voltou a concentrar-se nos treinos e fazia de tudo para agradar à namorada, ao ponto de vender pertences pessoais para lhe comprar presentes: “Tinha de fazer esforços por amor.”

Como se fosse bom demais para durar, o conto de fadas foi bruscamente interrompido. A família de Sofia tinha algumas condições de vida, mas a crise que assolou o país no início de 2000 levou ao encerramento do banco onde o pai trabalhava. De Espanha chegou um convite e os Baldi começaram a fazer as malas. Barcelona era o destino.

Chorar de porta aberta

“No dia em que nos despedimos, numa paragem de autocarro, eu tinha 16 anos e ela estava a completar 14. Foi um ‘adeus, gosto em conhecer-te’ e não um ‘vamos ver-nos’”, lembrou Suárez. O seu mundo acabara de desmoronar-se. E nem se preocupava em esconder a tristeza. “Não tinha vergonha de chorar mesmo com a porta do quarto aberta”, revelou um dos irmãos. A família começou a preocupar-se seriamente com o estado depressivo que mantinha mesmo em dias de jogo.

A primeira tentação de Luis foi largar tudo e voltar à vida de antigamente. O Nacional ameaçou expulsá-lo e subitamente tornou-se claro na sua cabeça que o futebol poderia ser o meio para recuperar a namorada. Reinventou-se como jogador e traçou o objectivo de conseguir um dia ser contratado pelo Barcelona.

No princípio não o levaram muito a sério, com excepção de Piriz. “Suspeitava que podia triunfar e ter um futuro, porque parecia convicto que iria chegar ao Barcelona. Eu dizia-lhe sempre o mesmo: ‘Que é isso de jogares no Barcelona se és agora um suplente na sétima equipa do Nacional?’” Mas a verdade é que se transformou radicalmente nos treinos, assumindo responsabilidades, e passou a brilhar nos jogos.

Ao mesmo tempo procurava manter o contacto com Sofia pela Internet. Até ao dia em que não suportou mais as saudades. Pediu algum dinheiro emprestado para a passagem aérea e partiu para Espanha apenas com uma malinha na mão.

Detido ao aterrar em El Prat

Chegado ao aeroporto El Prat foi travado pelas mesmas autoridades catalãs que hoje lhe estenderiam uma passadeira vermelha. “Eu não tinha nada, estava com uma camisola branca e comecei a sangrar do nariz.” Os nervos e o receio de ser recambiado para casa torturavam-no. “Sofia estava à minha espera no aeroporto, mas eu já tinha chegado há mais de duas horas e não saía. Estava detido e não sabia porquê”, descreveu mais tarde ao El País.

“Expliquei-lhes que iria passar alguns dias a conhecer as montanhas e o mar que vira pelo avião. Eles abriram a minha mala para a revistar”. Tudo em suspenso. As autoridades encontraram um pacote com uma morada e um número de telefone, que uma tia da jovem lhe encarregara de entregar aos familiares. As perguntas prosseguiram por mais algum tempo e finalmente recebeu autorização para entrar.

Passaram 15 dias juntos. “Passeámos pelos lugares turísticos típicos e eu vi o Camp Nou [Estádio do Barcelona] pelo lado de fora. Não tinha dinheiro para entrar e fazer a visita turística”. O regresso foi um sofrimento, mas as mudanças estavam ao virar da esquina.

Poucos meses depois recebeu um convite inesperado para voltar a atravessar o Atlântico, e desta vez para ficar. E tudo começou por um acaso. Um enviado do Groningen da Holanda foi observar um outro jogador do Nacional, mas acabou por deslumbrar-se com Suárez, então com 19 anos. Impulsivamente, avançou para a sua contratação. Avançou com 800 mil euros, naquela que foi a transferência mais cara da história do emblema europeu.

De Groningen a Barcelona

Luis nunca ouvira falar do clube holandês e pouco sabia sobre este país, mas não hesitou. Iria ficar mais perto de Sofia, sem um oceano pelo meio. E foi também uma das melhores decisões do Groningen. Logo no jogo de estreia o atacante apontou um golo, fez três assistências e ainda sofreu um penálti. A carreira de Suárez estava prestes a levantar voo.

No final da temporada (15 golos em 37 partidas) em que ajudou a conquistar a Taça da Holanda e a Supertaça, o mais poderoso Ajax resgatou o jogador a troco de oito milhões de euros. Uma valorização de 1000%. Até ao início de 2011 alinhou em 153 partidas assinando 111 golos e ganhando merecidamente a alcunha de “El Pistolero”.

Com a sua situação financeira estabilizada, Luis casou com Sofia em Amesterdão, em Março de 2009, celebrando nova boda em Dezembro do mesmo ano, agora em Montevideu. Da união nasceram Delfina, agora com sete anos, e Benjamin, com quatro.

Em Janeiro de 2011, o casal mudou-se para Liverpool, numa transferência de 26 milhões de euros, tornando-se o jogador mais bem pago de sempre do histórico clube inglês. E depois de quatro anos na maior das ilhas britânicas a realização seria total. O Barcelona avançou com 81 milhões de euros e a feliz família instalou-se na Cidade Condal, onde o atacante vive os melhores anos da sua carreira.

Mas, como resumiu a escritora Ana Laura Lissardy, “o futebol foi apenas a ferramenta para chegar a Sofia.”