Há um falso “frade” venenoso que anda a enganar os amantes de cogumelos

Foi descoberta recentemente uma espécie de cogumelo silvestre tóxico que é muito parecido com aquele que é conhecido como “frade” e que muitos consomem sem olhar duas vezes.

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O alerta surge através dos serviços regionais do Ministério da Agricultura: Foi identificada uma espécie de cogumelo silvestre, a Macrolepiota venenata, responsável pela maioria das intoxicações alimentares que ocorrem no Outono e também na Primavera com a ingestão deste tipo de produto silvestre. José Luís Gravito Henriques, especialista em micologia e autor de diversos artigos e publicações sobre cogumelos, registou vários relatos de casos de intoxicação, “alguns dos quais mortais”, porque as pessoas que apanhavam a espécie tóxica julgavam estar a levar para casa a Macrolepiota procera — conhecida como “frade” — e que é comestível.

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O alerta surge através dos serviços regionais do Ministério da Agricultura: Foi identificada uma espécie de cogumelo silvestre, a Macrolepiota venenata, responsável pela maioria das intoxicações alimentares que ocorrem no Outono e também na Primavera com a ingestão deste tipo de produto silvestre. José Luís Gravito Henriques, especialista em micologia e autor de diversos artigos e publicações sobre cogumelos, registou vários relatos de casos de intoxicação, “alguns dos quais mortais”, porque as pessoas que apanhavam a espécie tóxica julgavam estar a levar para casa a Macrolepiota procera — conhecida como “frade” — e que é comestível.

O consumo de cogumelos em várias regiões do país restringe-se, muitas vezes, à Macrolepiota procera. Os seus apanhadores baseiam-se no princípio de que “é fácil a sua identificação, em particular pelas características do chapéu e pela existência de um anel”. Contudo, salienta Gravito Henriques, trata-se de uma atitude “precipitada”. Sabe-se agora que recolhiam uma espécie, a Macrolepiota venenata, que tem várias semelhanças com a que consideravam inócua, e as consequências têm-se revelado por vezes dramáticas pois só recentemente foi identificada e ainda está pouco estudada, para além da informação produzida ser escassa e pouco divulgada.

As intoxicações foram atribuídas, durante algum tempo, à Amanita phalloides, espécie igualmente venenosa e com semelhanças à Macrolepiota procera, mas os exemplares recolhidos e os “testemunhos directos ou por terceira pessoa vieram confirmar que nunca se tratou de Amanita phalloides”, observa o especialista em cogumelos. Ou seja, as pessoas julgavam ter apanhado cogumelos da espécie Macrolepiota procera até que começaram a aparecer intoxicações e a culpa foi logo atribuída à Amanita phalloides quando, afinal, a culpada era outra. O problema é distinguir entre as duas espécies venenoras e a comestível já que as três espécies têm várias características em comum.

O cogumelo Macrolepiota procera, vulgarmente conhecido, entre outros nomes, por “frade” (a designação mais frequente), “gasalho”, “roque”, “marifusa”, “o da calcinha”, “púcara”, “roca”, “tortulho”, “é o cogumelo silvestre comestível mais consumido em Portugal e está presente na dieta alimentar de uma grande parte da população rural”, assinala Gravito Henriques.

Falso e dissimulado

Mas pelos montes fora existe, sabe-se agora, um inimigo que tem passado incógnito e dissimulado. Este falso “frade” é, afinal, o principal responsável pelas intoxicações de Outono e até na Primavera com a ingestão de cogumelos silvestres. O especialista micológico chama a atenção para uma prática recorrente que se tem revelado perigosa: a manutenção do uso do alho e de objectos em prata como método vulgar de confirmação da comestibilidade dos cogumelos. Esta é uma tradição errónea sem qualquer fundamento e que “tem conduzido à ingestão de Macrolepiota venenata e provocado intoxicações que foram do simples mau estar à morte por falta de assistência atempada”.    

Numa altura em que cresce a pressão da colheita e se nota um aumento das populações de Macrolepiota venenata, o especialista considera crucial e dar a conhecer as diferenças entre as espécies e os seus riscos de forma a “evitar intoxicações que de forma sistemática continuam a ocorrer todos os anos, afectando particularmente crianças e idosos”.

Assim, o cogumelo Macrolepiota venenata tem uma forma atarracada, o chapéu pode apresentar dimensões semelhantes ao frade mas o pé é mais pequeno) e, embora inicialmente globoso, não tem mamilo central. A cutícula rompe-se mais radialmente e as escamas são maiores e menos uniformes, as lâminas avermelham ao toque, o pé é liso e o bolbo do pé é marginado. Além disso, o anel não é móvel, é mais simples e central, e, em jovem, toda a carne avermelha ao corte.

O Macrolepiota procera tem um chapéu ovoide achatado, cutícula acinzentada, seca e rachada em escamas grossas e castanhas, dispostas em círculos concêntricos, de separação fácil entre chapéu e o pé. As folhas brancas, largas, muito apertadas, com células lamelares deixam espaço ao redor do pé. Tem haste recta, oca e fibrosa, bulbosa na base e coberta de flocos castanhos. Há um anel duplo na parte superior, que se move sem deixar rastro e é de cor escura. Carne elástica branca, quando cortada, levemente torrada com tons de cor-de-rosa.  

Gravito Henriques chama a atenção para outro aspecto importante e que deve ser alterado: Mesmo nas espécies comestíveis, como a Macrolepiota procera, “depois de permanecerem vários dias em sacos de plástico, em período de tempo quente, poderá desencadear o desenvolvimento de substâncias tóxicas e pode traduzir-se na ocorrência de intoxicações alimentares ligeiras (indisposição e diarreia) e críticas (com vómitos e falência da função renal)”, conclui o especialista.