Os nossos animais também ficam tristes quando nós estamos tristes

Estava ciente que sentiriam este período conturbado, que mais não fosse pela ausência do dono e pelas minhas curtas estadias em casa. Mas nunca pude supor que o seu comportamento fosse tão revelador das suas angústias

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Joseph Pearson/Unsplash

Susana Santos é professora e Comissária da Assembleia Plurimunicipal do PAN Algarve

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Susana Santos é professora e Comissária da Assembleia Plurimunicipal do PAN Algarve

O final de 2017 ficou marcado por diversas vicissitudes na minha vida pessoal e revelou-se um desafio à minha resistência física e psíquica. O Alfredo, o meu companheiro para a vida, sofreu um enfarte. Quando o assunto é saúde, parece que todo o resto toma uma relevância mínima — entramos em “piloto automático”, em modo de “sobrevivência”.

Visto que o casamento não está formalizado, deparamo-nos com problemas surreais, tais como não haver justificações válidas aos olhos da lei para faltar ao trabalho e acompanhar a nossa cara-metade em todo este processo avassalador. O sentimento é de autêntica impotência e os dias passam a traduzir-se em absolutas correrias entre trabalho, hospital e casa.

Quem me conhece bem sabe que, apesar de parecer extrovertida, sou muito recatada no que diz respeito à minha vida pessoal. No entanto, decidi abrir esta excepção pois creio que este testemunho pode revelar a verdadeira essência dos que partilham do mesmo espaço que eu.

Não possuo descendência de sangue mas tenho os meus filhos adoptados de quatro patas, muito pêlo e quilos de baba à mistura. O Max e a Safira (actualmente já existe também um Ruca) possuem personalidades bem distintas: o Max, que apesar de todos os maus-tratos que sofreu — as marcas no seu corpo não deixam dúvidas da violência — é de uma ternura e meiguice incomparáveis e a Safira, que veio para nossa casa há cinco anos ainda pequenina, e que possui uma irreverência imensa. É o que vulgarmente denominamos de uma cadela com “mau feitio”.

Ainda assim compreendem-se como ninguém, são almas gémeas, completamente inseparáveis (reparem que ousei mencionar “almas”, pois creio que se tal definição existe, estes seres traduzem-na de modo exímio).

Obviamente, estava ciente que sentiriam este período conturbado, que mais não fosse pela ausência do dono e pelas minhas curtas estadias em casa. Mas nunca pude supor que o seu comportamento fosse tão revelador das suas angústias: a Safira, que sempre que entramos em casa praticamente nos atira ao chão aos pinotes e com inúmeras lambidelas, simplesmente assumiu uma postura de inactividade sempre que atravessava a porta da entrada, com os olhos fixos nos meus, como se por telepatia tentasse compreender o que se estava a passar. E o Max… ai o meu Max! Simplesmente deixou de comer. Tive de me reorganizar e tentar ser criativa no cardápio canino. Mesmo assim, as suas refeições traduziam-se em duas ou três dentadas tímidas, creio que o suficiente para o manter activo nas suas actividades básicas diárias. Os seus olhos traduziam uma imensidão avassaladora, uma tristeza cortante e confesso que também temi pela sua vida.

Felizmente, tudo corre bem quando acaba bem e mal o Alfredo regressou a casa, tudo voltou à normalidade.

Quando oiço a expressão “é só um animal” (expressão que confesso que eu mesma utilizei há muitos anos) ou “és maluca por perderes tanto tempo e dinheiro com os animais” só consigo sorrir e sentir pena de quem o diz. É que na realidade, o que não sabem é que o que eles nos dão é tão belo e incomparável que quem não tem o privilégio de o vivenciar nunca poderá saber o que é viver em plenitude e repleto de um amor imenso e incondicional.