Neste álbum, eles estão nus e de vestido para desafiar a norma

Matthew Dean Stewart lançou um "crowdfunding" para criar um livro de fotografias, que retrata 15 homens, nus e de vestido, prontos a desafiar as normas. É o projecto "Fragile Masculinity"

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Quem quer patrocinar um livro de fotografias? Provavelmente pouca gente. A memória lança-nos para os álbuns fotográficos de casamentos e baptizados ou as fotos embaraçosas de infância, quando o digital ainda não era a regra. O Fragile Masculinity é um desses livros com imagens dentro, mas que pretende vincar uma posição contrária às normas sociais. Por isso, este é um álbum com fotografias de homens nus e de vestido.   

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Quem quer patrocinar um livro de fotografias? Provavelmente pouca gente. A memória lança-nos para os álbuns fotográficos de casamentos e baptizados ou as fotos embaraçosas de infância, quando o digital ainda não era a regra. O Fragile Masculinity é um desses livros com imagens dentro, mas que pretende vincar uma posição contrária às normas sociais. Por isso, este é um álbum com fotografias de homens nus e de vestido.   

Matthew Dean Stewart, de 30 anos, procurou homens de cinco cidades dos EUA através das redes sociais para chegar ao portefólio final que será exposto em livro. “Falei com muitas pessoas diferentes que achei que se sentiriam confortáveis, não só em pôr um vestido, como a posar completamente nus”, conta o fotógrafo norte-americano ao P3, via e-mail. A colecção de 30 retratos dos 15 homens escolhidos deve chegar nos próximos meses ao formato físico, após a conclusão da campanha de crowdfunding que termina a 15 de Janeiro.

Para já, o apoio não podia ser melhor. O objectivo inicial de angariar 4000 euros foi ultrapassado (já passa dos 5000 euros, neste momento) e os primeiros contactos foram estabelecidos. Matthew Dean Stewart vai trabalhar com uma gráfica local para imprimir os álbuns e ainda vai ter tempo para, antes de tudo, aprender como fazer um livro, já que este é o primeiro que terá em mãos. “E agora vou poder finalmente fazer o livro que sempre quis”.

Homens diferentes contra as expectativas sociais

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O autor do projecto já ultrapassou o valor que pretendia angariar e deve lançar o livro durante este ano

São 15 homens que procuram representar toda a sociedade, atacando-a. “Eu não queria fazer um livro com homens brancos e em forma, mas sim tentar juntar todos os tipos de corpos e raças. É importante representar um mundo onde há diferentes tipos de pessoas, por forma a podermos desafiar as expectativas sociais e aquilo que estamos habituados a ver.” E é isto que o autor vai procurar demonstrar em imagens.

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O vestido, para o fotógrafo um símbolo máximo da roupa desenhada para as mulheres, foi a ferramenta escolhida

O projecto é o resultado de uma “constante frustração em ver como a sociedade separa homens e mulheres”, explica. A ideia de colocar lado a lado o mesmo homem nu e de vestido coloca a tónica numa questão: “Quem disse que é suposto ser assim?”. Quem disse que só as mulheres usam vestido e são delicadas? E, já agora, que os homens não choram? O fotógrafo de Portland enquadrou assim o livro nas diferenças de género a partir do conceito de "fragilidade masculina" que dá o título ao álbum.

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Matthew Dean Stewart fotografou 15 homens para contestar a separação social entre homens e mulheres

“A ideia de uma fragilidade masculina é muito interessante porque vivemos num mundo mediatizado onde as empresas é que decidem. Os média dizem-nos para ser de determinada forma. E vem de todos os cantos mediáticos também. Os filmes disseram-nos na maior parte dos últimos 100 anos que existem papéis atribuídos a cada género”, defende. Matthew Dean Stewart reconhece que existe uma mudança nestes “supostos papéis”. Há mais igualdade e uma menor distinção nas tarefas tradicionalmente associadas a cada género e o movimento #MeToo tem dado provas de que as mulheres têm cada vez mais voz. Mesmo em relação à comunidade LGBTI (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgénero e Intersexo), a representação mediática tem sido maior.

“Seja qual for o país, temos coisas específicas que são ‘supostas ser' de acordo com os padrões sociais”, diz, justificando que a ideia do que é masculino ou feminino atravessa toda a sociedade. “O vestido, para mim, é o epítome das roupas femininas”, esclarece. Daí ter decidido inverter o jogo.

Vestir um homem com uma roupa associada ao sexo feminino estava nos planos do fotógrafo desde o início. “Eu queria ter a certeza de que estava a comentar a forma como desenhamos roupa para homem e roupa para mulher e não é suposto usar as roupas do género oposto. Em última análise, isto não é sobre o vestido em si, mas sobre aquilo que o vestido representa”.

Um vestido afecta a masculinidade?

Uma visão que já estava patente no projecto que realizou antes do Fragile Masculinity: The Pink Triangle Project. Este projecto de fotografia e vídeo surgiu no seguimento do resultado da vitória de Donald Trump nas eleições norte-americanas. Para demonstrar o orgulho sentido pelas pessoas LGBTI da sua comunidade, retratou-as com uma pintura triangular rosa, símbolo que identificava, nos campos de concentração nazi, os homossexuais.

Matthew Dean Stewart sempre andou a par com a luta pelos direitos LGBTI e contra a discriminação que continua a persistir. Amealhou caras e histórias ao longo dos projectos e das viagens que fez para desafiar as tais normais sociais que parecem impedir um de homem de usar um vestido. “Os homens, hetero ou gay, parecem assustados com a ideia de vestir algo que é desenhado para as mulheres, assustados por isso afectar a sua masculinidade”, realça o norte-americano, falando da experiência que teve em várias conversas.

Este não será um livro político, apesar de o género estar em voga no discurso político e de ser inevitável associá-lo com o momento actual. O propósito do autor é desafiar mentalidades e mexer com a estrutura social. No fundo, tentar apelar à mudança, por mais pequena que seja.

O livro não se fica pelas fotografias. Até porque Matthew Dean Stewart queria ter a colaboração de mais pessoas e, portanto, lançou o convite para outros artistas se expressarem sobre a Fragile Masculinity. As contribuições chegaram de todo o mundo e deram outro ar ao livro, como nos diz o fotógrafo. “Este é um livro, primeiramente, das minhas fotografias, mas eu senti que era importante dar voz a outros para mostrarem o que pensam desta ideia de fragilidade masculina”. A combinação destes dois momentos num só álbum fica à espera da luz do dia, depois de o autor decidir como vai publicar o livro.  

E agora, já queres patrocinar um livro de fotografias?