Pedagogia da poupança deve começar logo na infância

Existe pois a necessidade de voltarmos ao velho adágio bíblico que os nossos pais e avós nos transmitiram: “Assim como semeares assim colherás”.

Ao longo da vida, cada um de nós faz face a situações cíclicas de desafogo financeiro e de necessidades de liquidez. Em certos momentos acumulamos capital e noutros desinvestimos a riqueza acumulada. Mas o que cada um de nós poupa não fica imobilizado, outros o vão utilizar, mediante o pagamento de um juro em função de um dado período de referência. Da mesma forma, quando por necessidades de liquidez, utilizamos o dinheiro que outros pouparam, é-nos exigido o pagamento de um juro em função de um período de referência. Nos dois casos trata-se da remuneração devida pelo usufruto do dinheiro alheio.

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Ao longo da vida, cada um de nós faz face a situações cíclicas de desafogo financeiro e de necessidades de liquidez. Em certos momentos acumulamos capital e noutros desinvestimos a riqueza acumulada. Mas o que cada um de nós poupa não fica imobilizado, outros o vão utilizar, mediante o pagamento de um juro em função de um dado período de referência. Da mesma forma, quando por necessidades de liquidez, utilizamos o dinheiro que outros pouparam, é-nos exigido o pagamento de um juro em função de um período de referência. Nos dois casos trata-se da remuneração devida pelo usufruto do dinheiro alheio.

Poupança agregada e investimento

Assim, numa dada economia, a cada empréstimo feito pelos aforradores, corresponde um débito aceite pelos mutuários. Se nessa economia só existissem aforradores e ninguém investisse a poupança gerada, não existiria aumento da riqueza nacional. Da mesma forma, se só existissem mutuários e ninguém poupasse, só seria possível financiar as necessidades financeiras correntes, desinvestindo a riqueza acumulada anteriormente ou recorrendo a empréstimos do exterior.

Na realidade as economias têm grupos que, por natureza, poupam (normalmente as famílias) e grupos que, por natureza, investem, (normalmente as empresas). São os excedentes financeiros das famílias que permitem financiar as necessidades financeiras das empresas. Quando por qualquer motivo, as famílias residentes não poupam, gera-se um défice de financiamento global, que só pode ser coberto recorrendo à poupança das famílias do exterior.

Crédito e nível de vida

O crédito é um instrumento muito importante ao dispor das famílias para fazerem face a necessidades de financiamento relacionadas com a melhoria do seu nível de vida. Mas não é prudente que este endividamento ultrapasse as possibilidades de reembolso das famílias durante o período do crédito. Existe uma relação desejável entre endividamento e poupança própria que permite às famílias manterem a sua solvência sem porem em causa o desejo legítimo de melhorarem o seu nível de bem estar e conforto.

De facto, nos últimos anos, as famílias portuguesas fizeram grandes investimentos em bens duradouros, desde logo a casa, em seguida a educação dos filhos, depois as aquisições de bens de conforto, e finalmente as despesas de lazer, recorrendo ao crédito relativamente barato e abundante disponível graças ao processo de convergência da economia portuguesa para o euro.

Mas esta situação pode ser a causa de um desequilíbrio financeiro muito perigoso, em caso de inversão do movimento das taxas de juro que até agora se têm mantido estáveis após anos de redução acentuada. Esse desequilíbrio terá consequências dramáticas para as famílias portuguesas se for acompanhada de um aumento do desemprego resultante de uma desaceleração económica. Muitas famílias poderão então ficar em situação de incumprimento das suas obrigações para com as dívidas que assumiram, sobretudo as de longa duração e de montantes elevados.

Desta maneira há que voltar a fazer a pedagogia da poupança. Numa fase inicial da sua vida activa, os jovens deviam acumular capital para poderem realizar depois os seus projectos de ciclo de vida de forma financeiramente equilibrada. Ou seja o custo do seu endividamento, após a fase de acumulação, não deveria absorver uma parte significativa dos seus rendimentos de longo prazo incluindo nestes a remuneração da sua poupança de precaução.

Se assim acontecesse, em caso de inversão do ciclo financeiro, a existência de uma reserva financeira poderia permitir atenuar o aumento do custo do endividamento, uma vez que ela própria passará a ser remunerada a taxas superiores.

Escolha individual e poupança

Durante bastante e até recentemente julgava-se que o Estado Providência se devia ocupar dos cidadãos do berço até à cova. Nos países de regime democrático, com maior ou menor grau de eficácia, o modelo social controlado pelo Estado funcionou como uma rede de segurança contra eventualidades aleatórias e redução do risco social, financiado por rendimentos correntes gerados na economia e garantidos por dívida pública no futuro.

Mas este grau de protecção social, aparentemente gratuito, não deixou de exercer uma influência negativa ao nível da previdência individual, quer pela redução da taxa de poupança das famílias, quer pelo excessivo recurso ao endividamento, sem primeiro ter havido qualquer acumulação de excedentes.

Não é que o modelo social seja incompatível com uma atitude de previdência face a riscos futuros. Mas as promessas que foram feitas às famílias, pelos responsáveis políticos, de que tudo era possível, e portanto, quaisquer que fossem as necessidades futuras em matéria de protecção social o Estado encontraria sempre os recursos financeiros indispensáveis à sua satisfação.

A ausência de esclarecimentos sobre o custo adicional das promessas e quem o pagava, teve um efeito devastador na propensão à poupança de tal forma preocupante que, hoje, as famílias já não têm qualquer capacidade de financiamento em termos agregados.

Existe pois a necessidade de voltarmos ao velho adágio bíblico que os nossos pais e avós nos transmitiram: “Assim como semeares assim colherás”. Ou seja, a capacidade de aforro, quando demasiado baixa, impede o normal desenvolvimento da economia devido à redução do investimento financiado por recursos internos e coloca as famílias e as empresas num patamar de endividamento face ao sistema financeiro interno, que só pode ser coberto com recurso a financiamentos externos.

A pedagogia da poupança deve começar logo na infância. Os mealheiros que antes os pais e avós ofereciam às crianças nas instituições da economia social e a abertura de uma conta aforro para diferentes necessidades diferidas, têm de voltar a ser instrumentos renovados para a criação de um espírito de previdência que urge renovar.

Porque como diz o ditado. No poupar é que está o ganho.

CIDADANIA SOCIAL - Associação para a Intervenção e Reflexão de Políticas Sociais www.cidadaniasocial.pt