EDP contesta em tribunal 120 milhões da taxa extraordinária da energia

"Ao contrário do previsto", a taxa "tem vindo a ser sucessivamente prorrogada” pelo Estado, diz a empresa.

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A EDP junta-se à Galp e à REN na contestação à CESE dro Daniel Rocha

Ao fim de três anos a pagar a taxa extraordinária sobre as empresas da energia, a paciência do accionista chinês da EDP, a China Three Gorges (CTG), esgotou-se. Com uma factura que já ronda os 180 milhões de euros, a EDP avançou para tribunal para contestar a Contribuição Extraordinária sobre o Sector Energético (CESE) confirmou ao PÚBLICO fonte oficial da EDP.

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Ao fim de três anos a pagar a taxa extraordinária sobre as empresas da energia, a paciência do accionista chinês da EDP, a China Three Gorges (CTG), esgotou-se. Com uma factura que já ronda os 180 milhões de euros, a EDP avançou para tribunal para contestar a Contribuição Extraordinária sobre o Sector Energético (CESE) confirmou ao PÚBLICO fonte oficial da EDP.

Em causa estão 120 milhões de euros da CESE de 2014 e 2015, adiantou fonte oficial da empresa. “Uma vez esgotadas todas as vias alternativas nomeadamente as administrativas, a EDP decidiu avançar pela via judicial para contestar o pagamento da CESE”, adiantou a mesma fonte, lembrando que, “ao contrário do inicialmente previsto e estipulado, a CESE tem vindo a ser sucessivamente prorrogada” pelo Estado.

Era uma contribuição que se entendia pela “necessidade de contribuir para a estabilidade orçamental, num contexto de especiais exigências económicas que então Portugal atravessava”, mas era, também, “uma medida que se previa na sua génese como ‘extraordinária’”, sublinhou fonte oficial da EDP.

Com a sua repetição anunciada no Orçamento do Estado para 2017, e sem fim à vista no horizonte, a empresa presidida por António Mexia junta-se assim à Galp, de Carlos Gomes da Silva, e à REN, de Rodrigo Costa, ambas já em litígio com o Estado por causa da CESE. Tudo leva a crer que o montante relativo a 2016, de cerca de 60 milhões de euros, também será contestado no futuro pela EDP, que é detida em mais de 21% pela CTG.

Apesar de ter optado por pagar a contribuição desde a sua introdução, em 2014, a EDP nunca deixou de sinalizar que a taxa, criada como extraordinária, não poderia passar disso mesmo. Em Fevereiro desse ano, de passagem por Lisboa e depois de reuniões com o anterior Governo de Pedro Passos Coelho, o antigo presidente da CTG, Cao Guangjing, disse ter entendido a sua criação no contexto das dificuldades financeiras do país, mas mostrou-se convicto da sua rápida eliminação.

Ano após ano, António Mexia também foi fazendo eco dessa expectativa: “A situação do país mudou e as medidas extraordinárias devem ser ultrapassadas", defendeu o presidente executivo da empresa em 2015, numa apresentação de resultados da EDP. Já em 2016, o tom tornou-se mais duro. Em Maio, quando a EDP apresentou em Londres o seu plano de negócios até 2020, o gestor garantiu a analistas financeiros e investidores que a empresa faria o que tivesse de ser feito “para remover” o que considerava um imposto “ineficiente e injusto”, porque o sector da energia era o único que tinha “um imposto sobre o investimento”. Nessa ocasião, Mexia também disse esperar uma redução gradual da taxa, até à sua eliminação definitiva em 2020, mas deixou o aviso: a EDP estava à espera de “sinais muito claros e rápidos” de que haveria uma redução dos montantes cobrados, porque havia “condições para isso”.

Depois destas declarações de Mexia em Londres, foi a vez de o vice-presidente da CTG vir recordar, duas semanas mais tarde, que os desenvolvimentos em relação à CESE (assim como o modelo de financiamento da tarifa social, que este ano vai custar cerca de 56 milhões à EDP) estavam a ser acompanhados “com atenção” desde Pequim. Lin Chixue, que falou aos jornalistas no final de um encontro, em Lisboa, em que a EDP e a CTG assinaram novo memorando de entendimento para reforçar a sua parceria estratégica, adiantou que “o futuro e o desenvolvimento da EDP” seriam temas a discutir nas reuniões agendadas com o Presidente da República e com o primeiro-ministro.

De nada valeram nem a via diplomática nem as reclamações graciosas que, segundo o PÚBLICO apurou, a empresa foi fazendo junto da Autoridade Tributária. A proposta orçamental para este ano voltou a incluir a CESE (com uma expectativa de receita de 90 milhões), levando a EDP a seguir as pisadas da REN e da Galp e a contestar a taxa na justiça. Ainda que seja expectável que o processo se arraste por alguns anos, fica agora em aberto a possibilidade de o tribunal dar razão à empresa, obrigando o Estado a reembolsar-lhe o valor da CESE.

O rascunho desta medida foi divulgado pela primeira vez em 2013, numa apresentação com data de Outubro, poucos meses depois da entrada em funções do antigo ministro da Energia Jorge Moreira da Silva. Nessa apresentação (intitulada “Sustentabilidade do Serviço Eléctrico Nacional, Política Energética e Cumprimento do MoU [memorando de entendimento com a troika]”), o anterior Governo preconizava como uma das medidas para 2014 no sector da energia “uma contribuição sobre o sector electroprodutor, abrangendo as centrais a carvão, hídricas e grande cogeração, gerando uma receita adicional para o Estado de cerca de 100 milhões de euros”.

Porém, rapidamente a medida, que tinha sido desenhada inicialmente para aplicar aos produtores de electricidade (afectando essencialmente a EDP), acabou por estender-se a outras actividades como o transporte e distribuição de electricidade e gás e a refinação de combustíveis (passando assim a incluir empresas como a REN e a Galp). Numa outra apresentação com data de Outubro de 2013, desta vez já especificamente sobre a CESE, Moreira da Silva veio então clarificar que a taxa passava a abranger todo o sector energético (excluindo os produtores de renováveis) e que o objectivo de receita fiscal subia para 150 milhões (ainda que a execução orçamental de 2014 tenha provado que não foi além de 61,5 milhões).