Número de animais abandonados em Portugal atingiu pico em 2014

Cerca de 600 cães e gatos entraram nos centros de recolha municipais por semana. Dados provisórios de 2015 sugerem que valores podem estar a cair.

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Número de cães e gatos nos centros de recolha municipais tem vindo a aumentar todos os anos Adriano Miranda

Dados da Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) mostram que, no ano passado, chegaram aos canis e gatis das câmaras municipais quase 32 mil animais. Praticamente quatro em cada cinco (78%) eram cães.

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Dados da Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) mostram que, no ano passado, chegaram aos canis e gatis das câmaras municipais quase 32 mil animais. Praticamente quatro em cada cinco (78%) eram cães.

O número tem vindo a subir todos anos. Desde 2010, aumentou 41%. Em comparação com 2008, a subida foi de 135%.

Este ano, os valores até agora apurados são bem mais baixos. Entre 1 de Janeiro e esta segunda-feira, 17 de Agosto, os registos oficiais contabilizam a entrada de 9581 animais nos centros oficiais de recolha. Foram 7937 cães e 1644 gatos. Em média, são 42 animais por dia, cerca da metade dos 86 por dia de 2014.

Mas os dados são preliminares e o retrato do que está acontecer este ano ainda pode mudar. “Os números relativos a 2015, mesmo em relação aos sete primeiros meses, não se encontram ainda finalizados”, explica a DGAV, numa nota enviada ao PÚBLICO.

Desde Outubro passado, infligir maus tratos a um animal doméstico é um crime punível com dois anos de prisão. O abandono pode resultar em seis meses de cadeia.

Até ao final de Junho, o Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente da GNR registou 2239 queixas por maus tratos a animais, mas apenas 50 processos tiveram enquadramento criminal.

“Muitas vezes os animais não estão identificados”, afirma Joana Moreira, da Liga Portuguesa dos Direitos dos Animais, que recebe dezenas de queixas por dia. Cães e gatos têm de possuir um micro-chip por baixo da pele, pouco maior do que um grão de arroz, com um número que identifica o animal e o seu proprietário. Joana Moreira diz, no entanto, que há animais que ou não têm o chip de identificação, ou as informações não foram carregadas nas bases de dados oficiais.

Não é o caso de Sam, o cão que foi encontrado dentro de um saco de plástico num contentor do lixo em Bustelo, Vila Real, na quinta-feira. O seu proprietário já foi localizado, mas terá dito que o animal foi roubado há dois meses. Os dados foram entregues à GNR, na queixa apresentada pela Plataforma Proanimal, a associação que resgatou Sam e o levou para o Hospital Veterinário de Trás-os-Montes.

António Brandão, estudante de Veterinária que fundou a Plataforma Proanimal em 2011, disse que o caso é grave mas não é único. “É comum encontrarem-se cães e gatos bebés no lixo. Adultos nem tanto”, diz.

Há pelo menos 80 organizações semelhantes à Plataforma Proanimal em Portugal. Recebem e animais abandonados, providenciam o seu tratamento, reencaminham-nos para a adopção, fazem campanhas de esterilização. “Há cada vez mais, mas não chega”, afirma Natália Correia, presidente da Associação de Protecção aos Animais Abandonados (APCA), fundada em 1958 em São Pedro de Sintra. “As associações estão cheias de cães. Temos um abrigo com capacidade para 100, já chegámos a ter 200”, completa.

Para a Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária, o aumento no número de animais nos canis municipais “não é necessariamente sinónimo de mais casos de abandono, podendo estar  relacionado com mais ou melhores meios para os municípios lidarem com a problemática dos animais errantes”.

António Brandão, da Plataforma Proanimal, acrescenta que, com a criminalização dos maus tratos, poderá estar a haver mais atenção do público em geral e, com isso, mais queixas. “É importante que as pessoas se consciencializem que é nosso dever proteger estes animais, porque fomos nós que os domesticamos para o nosso próprio proveito”, afirma.

Sam continuava internado no Hospital Veterinário de Trás-os-Montes na segunda-feira, com graves problemas. Sofre de leishmaniose, tem os membros parcialmente paralisados, inflamações nas articulações, músculos atrofiados e várias feridas. “Pelas úlceras, tudo indica que esteve paralisado por mais de uma semana”, explica o veterinário Paulo Pimenta. “Não podemos dizer até que ponto recuperará”.