Um em cada três utentes de instituições de solidariedade ainda diz passar fome

Estudo referente a 2014 encontrou dados mais positivos do que em 2012. No entanto, as famílias têm rendimentos semelhantes e em mais de 50% dos casos admitiam não ter dinheiro suficiente para viver.

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As refeições são a principal ajuda recebida pelos inquiridos Enric Vives-Rubio

O estudo Utentes de Instituições de Solidariedade Social – Uma abordagem à Pobreza nesta população, publicado nesta segunda-feira, contou com inquéritos a 1889 utentes apoiados por 216 instituições de solidariedade social. Em metade dos casos o rendimento familiar é inferior a 400 euros mensais, com 25% das famílias a receberem ainda menos de 250 euros. Só 28% dos inquiridos recebiam mais de 28%, o que são números em linha com os obtidos num trabalho semelhante em 2012. Regra geral, os agregados com menores rendimentos correspondem também aos inquiridos com menor escolaridade.

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O estudo Utentes de Instituições de Solidariedade Social – Uma abordagem à Pobreza nesta população, publicado nesta segunda-feira, contou com inquéritos a 1889 utentes apoiados por 216 instituições de solidariedade social. Em metade dos casos o rendimento familiar é inferior a 400 euros mensais, com 25% das famílias a receberem ainda menos de 250 euros. Só 28% dos inquiridos recebiam mais de 28%, o que são números em linha com os obtidos num trabalho semelhante em 2012. Regra geral, os agregados com menores rendimentos correspondem também aos inquiridos com menor escolaridade.

No total, 53% dos utentes inquiridos disseram que “o rendimento da família nunca é suficiente para viver e 33% que às vezes é suficiente”. Só 14% disseram que o rendimento é suficiente para viver. Mesmo assim, nas perguntas relacionadas com as percepções há diferenças. Em 2010, cerca de 72% das pessoas diziam sentir-se pobres. O número disparou para os 82% em 2012 e voltou a cair agora para os 79%. Quase 40% dos inquiridos estavam desempregados e perto de 30% já reformados. Em 66% das situações havia pelo menos um desempregado no agregado familiar, que em média tinha três pessoas.

O estudo não apresenta uma explicação para esta percepção mais positiva perante rendimentos mensais semelhantes aos de 2012. Mas a investigadora Tânia Correia, uma das autoras do estudo do Centro de Estudos e Sondagens de Opinião da Universidade Católica Portuguesa, adiantou ao PÚBLICO que esta melhoria “possivelmente” pode ser atribuída a “uma adequação das expectativas a uma nova realidade que as pessoas têm vivido nos últimos anos” e a um reforço do papel das instituições de solidariedade. Mas reforça que “não nos podemos esquecer que cerca de 80% dos respondentes sentem-se pobres”.

No entanto, o estudo sublinha que “existem diferenças no sentimento de pobreza entre os vários escalões etários: o grupo dos idosos continua a ser aquele onde menos respondentes dizem sentir-se pobres” e “entre os indivíduos que se sentem pobres destacam-se sobretudo aqueles que têm idades inferiores aos 65 anos, com rendimentos baixos e com escolaridade abaixo do ensino secundário”. Tânia Correia lembra que na base destes dados podem estar situações como o “desemprego de longa duração ou a divisão do rendimento por mais elementos da família, tanto com filhos como com pais a cargo”.

Concretamente sobre a fome, o trabalho indica que 20% dos inquiridos admitiram ter tido falta de alimentos ou sentido fome alguns dias por semana nos seis meses antes do estudo. A estes somam-se os 13% que disseram ter tido fome pelo menos um dia por semana. Tânia Correia salienta que “a situação alimentar dos utentes melhorou”, mas alerta que “a situação de muitos destes utentes é ainda preocupante” já que “este é um projecto levado a cabo junto de instituições apoiadas pelo Banco Alimentar e a Entrajuda e, como tal, a ajuda alimentar é a mais procurada pelos utentes”. Aliás, em 87% dos casos a ajuda traduz-se em cabazes ou refeições.

Cerca de 28% dos inquiridos referiu não ter dinheiro para comprar comida até ao final do mês e 43% refere que tal lhes acontece às vezes. A casa e a alimentação continuam a ser as duas principais despesas, mas há ainda 39% dos inquiridos a referirem os gastos com a saúde. Isto quando 47% das pessoas referiram que “o próprio ou alguém do seu agregado familiar sofre de uma doença ou deficiência” e quando 17% referiram ter deixado de comprar medicamentos várias vezes, sempre por falta de dinheiro.