Uma estrada de seis quilómetros está a dividir Guimarães

Autarquia quer construir nova ligação ao parque tecnológico Ave Park. População e associações ambientalistas questionam custos ambientais e necessidade da obra.

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O Ave Park foi inaugurado há seis anos Paulo Pimenta

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O Ave Park é um parque de ciência e tecnologia criado pela Câmara de Guimarães, em parceria com a Universidade do Minho (UM), em 2008, que está instalado a cerca de 11 quilómetros da cidade. A ligação à saída da A11 e da A7 foi uma exigência desde o dia da sua inauguração, pela voz do então administrador Manuel Mota: “Gostaríamos de ter um acesso directo à auto-estrada para aumentar a atractividade do parque a nível internacional”. A autarquia também tem defendido este argumento. O problema de acessos “constitui a fundamental restrição e bloqueio” do Ave Park, diz ao PÚBLICO o presidente da autarquia, Domingos Bragança, segundo o qual tem havido ameaças de deslocalização de algumas empresas emblemáticas ali sediadas e desistência de instalação de outras por esse motivo.

Quando o Ave Park foi inaugurado, há seis anos, os seus objectivos eram ambiciosos: a partir de 2010, haveria 1000 empregos e um volume de negócios de dois milhões de euros anuais. Mas a realidade tem ficado muito aquém do esperado. Neste momento, segundo dados da autarquia, estão ali instaladas 32 empresas de base tecnológica, que dão emprego a 400 pessoas — das quais 75% têm, pelo menos, uma licenciatura. A grande âncora têm sido o laboratório associado 3B’s e o Instituto Europeu de Engenharia de Tecidos e Medicina Regenerativa, ambos ligados à UM.

Todavia, se os argumentos da autarquia para construir a ligação rodoviária não convencem parte da população, foram suficientes para garantir o apoio do Governo e da União Europeia. A obra deverá ser paga maioritariamente por fundos comunitários, uma vez que, apesar de o novo quadro europeu de apoio não prever financiamento de novas estradas, Guimarães conseguiu apoios de peso — do Eixo Atlântico à Comissão de Coordenação Norte — garantindo uma excepção de Bruxelas para concretizar esta obra.

O outro grande argumento contra o projecto é ambiental. Foi isso que levou a uma tomada de posição conjunta da Quercus e da Associação Vimaranense de Ecologia (AVE), que denunciam uma “grave falta de informação pública sobre a necessidade de implementação deste projecto” e a ausência de uma avaliação dos impactos económicos e custos ambientais desta obra. “O que queremos é mais informação para nos podermos pronunciar com toda a certeza sobre esta matéria”, defende o presidente da AVE, José Cunha.

Esta associação organizou, em meados de Janeiro, uma caminhada que juntou cerca de 80 pessoas, para conhecer o percurso previsto na proposta de PDM para esta ligação. “Entre estradas nacionais, municipais e caminhos de servidão são cerca de 20 atravessamentos”, conta Cunha, além de, em quase toda a sua extensão, o percurso previsto atravessa terrenos classificados como RAN e REN. Há ainda um ponto considerado sensível que é a necessidade de construção de uma nova ponte sobre o rio Ave, que na proposta actual está prevista a montante da principal captação de água para o concelho.

Para a câmara, a preocupação é extemporânea. “Nesta altura, não existe nenhum projecto, nem anteprojecto”, garante o socialista Domingos Bragança. A autarquia pediu a uma equipa da UM para estudar qual o melhor traçado que permita uma “ligação fluída” entre a saída da auto-estrada e o parque tecnológico. O que tem sido aventado na cidade é que esta ligação seria uma via dedicada, sem qualquer saída intermédia, com duas faixas de rodagem em cada sentido e um custo que podia ascender a 30 milhões de euros — mais do dobro do que custou o próprio parque. Mas, de acordo com a câmara, só com base no parecer da universidade ficarão definidas as características da via, o perfil da ligação e o traçado mais adequado.

Com esse documento na mão, será elaborado um estudo prévio que será submetido à discussão pública, garante a Câmara de Guimarães. Mas a população não esperou pelo debate formal para começar a discutir a proposta. Na semana passada, a junta de freguesia de Santa Eufémia de Prazins, uma das localidades atravessada pelo traçado previsto, convocou as populações vizinhas para um debate público sobre a via. “Percebeu-se que a maioria da população está contra”, assegura a presidente da autarquia, Natália Fernandes, eleita por uma coligação PSD-CDS.

As principais preocupações são de carácter ambiental e social. “Esta é uma zona rural. Uma estrada que rasgue estes campos vai afectar o quotidiano dessas pessoas”, ilustra. A presidente de junta decidiu também pôr a circular um abaixo-assinado em papel junto das populações das freguesias afectadas – ao todo são cinco –, que também chegou à internet.