O preço do zelo da Comissão: menos cartões e mais evasão fiscal

Se a proposta para redução das comissões de pagamentos nos cartões eletrónicos vier a ser aprovada nos moldes propostos, o impacto para o consumidor e também para as pequenas e médias empresas (PME) será profundamente negativo.

A evasão e a fraude fiscal representam perto de um quinto (19,2%) do PIB português, sendo Portugal o quarto país da OCDE com pior desempenho (Schneider 2012). Em número redondos, estamos a falar de uma verba “colossal”, acima dos 30 mil milhões de euros (quase metade da verba emprestada pela troika), que não entra no produto nacional interno e na receita do Estado e que poderia ser aplicada eficientemente em bens e serviços públicos, como a Saúde ou a Educação, ou até na retenção dos nossos melhores quadros técnicos e científicos.

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A evasão e a fraude fiscal representam perto de um quinto (19,2%) do PIB português, sendo Portugal o quarto país da OCDE com pior desempenho (Schneider 2012). Em número redondos, estamos a falar de uma verba “colossal”, acima dos 30 mil milhões de euros (quase metade da verba emprestada pela troika), que não entra no produto nacional interno e na receita do Estado e que poderia ser aplicada eficientemente em bens e serviços públicos, como a Saúde ou a Educação, ou até na retenção dos nossos melhores quadros técnicos e científicos.

Por outro lado, é amplamente sabido que Portugal dispõe de um dos sistemas de pagamentos mais eficientes do mundo, ocupando o primeiro lugar do ranking de utilização de cartões de pagamento nos países da zona euro, sendo este o meio utilizado em cerca de 70% do número total de pagamentos (BCE-Banco de Portugal, 2013). Como se costuma afirmar, em equipa que ganha não se mexe. Mas não é este o entendimento da Comissão, cuja proposta levará a uma nivelação por baixo daquele que é apontado como o case study português, pelo equilíbrio eficiente que cria entre os vértices do triângulo que compõem o sistema de pagamentos: consumidores, retalhistas e instituições financeiras.

Ora, contrariamente ao que afirma a Comissão, a alteração deste equilíbrio vai onerar, inevitavelmente, o vértice mais frágil do triângulo: o consumidor. As comissões de pagamento são uma quantia paga pelo banco do comerciante ou retalhista (adquirente) ao banco do detentor do cartão (emitente), como contrapartida pelas transações efetuadas. A dramática redução nas respetivas comissões de pagamento proposta pela Comissão representa uma quebra substancial de receita (até cerca de 80%) para os bancos. Assumindo um valor médio por cartão de 20 euros/ano, estamos a falar de uma quebra que pode atingir 645 milhões de euros e que terá de ser, inevitavelmente, repercutida em outras taxas e comissões (como, por exemplo, em taxas por levantamentos em caixas automáticas) e que conduzirá a uma drástica diminuição no uso dos cartões eletrónicos (meio que é transparente e rastreável).

Comodidade, transparência, rastreabilidade e segurança. É esta a história de sucesso dos cartões eletrónicos, uma história que é também de sucesso para todos os seus protagonistas e, acima de tudo e de todos, para os consumidores. Num país que se orgulha da panóplia de serviços que podem ser efetuados numa caixa automática, da compra de um bilhete de comboio ao pagamento da fatura da eletricidade, será que estamos prontos a abdicar de uma conquista que nos coloca ombro a ombro com o mais inovador e desenvolvido dos países?

Sócio da ABBC & Associados – Sociedade de Advogados RL e docente da Universidade Católica (Católica Tax)