Nunca um campeão do século XXI perdeu tantos titulares de uma só vez

Só os números do Sporting de Inácio e do FCP pós-Mourinho rivalizam com os do Benfica deste ano. Na altura, ambos viram sair quatro indiscutíveis. Os “encarnados” já perderam cinco pedras essenciais.

Foto
A festa do título foi há pouco mais de três meses FRANCISCO LEONG/AFP

Face ao sucesso alcançado pelos pupilos de Jesus dentro e fora de portas, era quase um dado adquirido que os “encarnados” não se livrariam da cobiça de alguns dos principais emblemas europeus e que, em nome de um passivo que continua a ser alto e da turbulência que atravessa o banco BES, um dos principais sponsors do clube, Vieira e companhia teriam de abrir mão de alguns dos activos do plantel, para garantir a estabilidade financeira.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Face ao sucesso alcançado pelos pupilos de Jesus dentro e fora de portas, era quase um dado adquirido que os “encarnados” não se livrariam da cobiça de alguns dos principais emblemas europeus e que, em nome de um passivo que continua a ser alto e da turbulência que atravessa o banco BES, um dos principais sponsors do clube, Vieira e companhia teriam de abrir mão de alguns dos activos do plantel, para garantir a estabilidade financeira.

Na realidade, o presidente do clube começou a acautelar a situação logo em Janeiro, quando assegurou a venda de Rodrigo e André Gomes ao fundo Meriton Capital Limited, de Peter Lim, por 45 milhões de euros (mais tarde, o clube comunicaria à CMVM que o montante que efectivamente receberia seria de 33,3 milhões). Na altura, os dois jogadores continuaram na Luz, mas era praticamente certo que o fim de linha no Benfica chegaria no final da época. E assim foi. Só que a este negócio seguiram-se outros que, aos poucos, têm privado a equipa de algumas das principais peças. Siqueira terminou o período de empréstimo sem que o Benfica exercesse o direito de opção, Garay seguiu viagem para o Zenit, Markovic rumou ao Liverpool e Oblak mudou-se para o Atlético de Madrid.

Ao todo, os cofres da Luz foram recheados com 64,3 milhões de euros, mas o rombo no plantel é indisfarçável: mesmo excluindo André Gomes, que não está entre o leque de jogadores que mais vezes foram chamados ao “onze”, são já cinco os titulares que não estarão às ordens de Jesus. A estas saídas, poder-se-ão ainda juntar as de Enzo Pérez e Gaitán.?Por isso, Toni, antigo jogador e treinador do Benfica, não hesita em afirmar que será necessário ter muita “paciência e persistência” para que esta equipa chegue ao nível que atingiu na época passada. “O FC Porto tem feito contratações cirúrgicas, parece estar mais forte e estruturado, o Sporting manteve a mesma base do ano passado e o Benfica, com tantas saídas, acaba por ficar mais enfraquecido”, defendeu o técnico que foi campeão pelos “encarnados” em 1988/1989 e 1993/1994. Admitindo que “não é normal” perder-se tantos jogadores, Toni fala numa “machadada profunda” que exigirá a Jorge Jesus um “trabalho ciclópico”.

Olhando à listagem dos campeões mais recentes, as duas equipas que se viram mais desfalcadas foram o Sporting de Augusto Inácio, após os “leões” terem sido campeões em 1999-2000, e o FC Porto pós-Mourinho, na altura em que os “dragões” conquistaram a Liga dos Campeões. Se o conjunto de Alvalade disse adeus a Vidigal e Saber (Nápoles), Aldo Dushcer (Deportivo) e De Franceschi (Veneza), nos “azuis e brancos”, o êxito europeu de 2003/2004 ditou as saídas de Paulo Ferreira e Ricardo Carvalho (Chelsea), Deco (Barcelona) e de Pedro Mendes (Tottenham). Alenichev também foi para o Spartak de Moscovo, mas, apesar de muito utilizado, não fazia parte dos 11 jogadores que mais vezes foram chamados ao “onze”. É certo que Maniche, Costinha e Derlei acabariam por fazer as malas e assinar pelo Dínamo de Moscovo, mas só durante a reabertura do mercado, em Janeiro.

De resto, por diversas vezes a equipa que conquistou a Liga viu fugir três dos seus habituais titulares no prelúdio da época seguinte: o Boavista ficou sem Litos, Rui Bento e Quevedo depois de ser campeão em 2000-2001; o Sporting sem André Cruz, Babb e Hugo Viana no final da temporada 2001/2002; o FC Porto sem Bosingwa, Paulo Assunção e Quaresma quando terminou a época 2007/2008 e sem Cissokho, Lucho e Lisandro na temporada seguinte; o Benfica, já com Jesus, viu sair Quim, Ramires e Di María depois de ser campeão em 2009/2010. Agora, o desafio parece ser ainda maior. Este é “o preço a pagar pelo sucesso”, admitiu o treinador do Benfica no final do jogo com o Sporting, para a Taça da Honra da AF Lisboa. Mas o técnico lá vai deixando transparecer alguma insatisfação: “Só trabalho não chega. É preciso qualidade.”