Ricos são os outros

Em Portugal não há falta de dinheiro que não resulte na sensação de que o dinheiro que falta sobra para quem já tem dinheiro de mais. "Os ricos que paguem a crise" é um refluxo ácido da esquerda que também afecta a digestão da direita empobrecida.

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Em Portugal não há falta de dinheiro que não resulte na sensação de que o dinheiro que falta sobra para quem já tem dinheiro de mais. "Os ricos que paguem a crise" é um refluxo ácido da esquerda que também afecta a digestão da direita empobrecida.

A raiz está na ideia exculpatória que até há pedintes que são ricos. Invocando a lógica lorpa que "nunca se sabe quanto dinheiro as pessoas têm" chega-se à conclusão que é provável que tenham mais do que nós.

Joseph Epstein escreveu em 2003 que "dos sete pecados mortais só a inveja não dá prazer nenhum" (Gugle "The Green-Eyed Monster"). Diz-se que a doença portuguesa é a inveja. Mas os portugueses gostam de algum prazer e daí que a nossa doença seja mais a desconfiança.

A desconfiança à portuguesa é uma posição confiante de saber mais do que os outros e de não se deixar iludir: "a mim não me enganas tu". Não só não admite compaixão - nem sequer desconfia que possa ser necessária.

É tão individualista esta atitude que qualquer solidariedade entre pobres e remediados torna-se exasperantemente difícil.

Só em Portugal é que andar de carro velho é visto como uma manobra para disfarçar a riqueza, para poder comprar as coisas mais baratas. Este mês acusaram-nos disso. Com um sorriso fetidamente cúmplice.