Refer levanta carris na linha Figueira-Pampilhosa que valem 960 mil euros. Autarcas da zona protestam

Ramal em causa foi encerrado em 2009 e, segundo a empresa gestora da infra-estrutura ferroviária, tem sido alvo de "constantes tentativas de roubo".

Foto
O Ramal da Lousã serviu os concelhos de Coimbra, Miranda do Corvo e Lousã durante 103 anos e foi encerrada há 6 para obras Adriano Miranda

Mas os municípios do Baixo Mondego contestam aquilo que consideram ser o desmantelamento de uma infra-estrutura cuja exploração tem potencial para vir ser viável, tendo contactado já a administração da Refer e o secretário de Estado dos Transportes, Sérgio Monteiro, para os tentar convencer a suspender a operação.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Mas os municípios do Baixo Mondego contestam aquilo que consideram ser o desmantelamento de uma infra-estrutura cuja exploração tem potencial para vir ser viável, tendo contactado já a administração da Refer e o secretário de Estado dos Transportes, Sérgio Monteiro, para os tentar convencer a suspender a operação.

Fonte oficial da Refer disse ao PÚBLICO que a decisão de levantar os carris tem em conta que a linha se encontra encerrada desde 2009 e que "não se perspectiva a sua reactivação, conforme disposto no Plano Estratégico dos Transportes [PET]".

Por isso, "e como medida cautelar de salvaguarda do património, a Refer irá proceder ao levantamento dos activos - que, embora tendo atingido o fim de vida útil, são ainda assim valorizados comercialmente como sucata -, nomeadamente, para evitar que estes possam ser alvo de furto e actos de vandalismo", disse a mesma fonte.

A linha tem sido literalmente atacada por ladrões de sucata que dispõem de equipamento próprio para desaparafusar e transportar os carris e que, por vezes, usam coletes da Refer, bem como placas com o logótipo da empresa nos veículos que usam para transportar o produto do roubo. Desta forma enganam as populações - que sempre se manifestaram contra o fim da linha - e confundem a própria GNR.

Mas o presidente da Câmara de Cantanhede, João Moura (PSD), disse ao PÚLICO que o argumento dos roubos "é um disparate" e quer que lhe expliquem se os benefícios deste acto de gestão da Refer são superiores à manutenção desta infra-estrutura que, sob certas condições, "pode ser um factor de dinamização da base económica da região".

As dúvidas do autarca são justificadas pelos episódios relacionados com sucata na vida político-judicial da história recente do país. O PÚBLICO fez as contas e apurou que os cerca de 50 quilómetros de via única da linha Pampilhosa-Figueira da Foz (100 quilómetros de carris) representam 3,840 toneladas de carris (cada metro pesa 40 quilos, nesta linha) que, ao preço de 0,25 euros por quilo, podem proporcionar receitas à Refer de 960 mil euros.

Ontem o presidente da Câmara de Cantanhede emitiu um comunicado contestando "a eliminação de uma infra-estrutura que os autarcas da região de Coimbra e especialistas em transportes consideram fundamental para o desenvolvimento regional".

O autarca não está só nesta luta pela manutenção da linha, pois a Comunidade Intermunicipal do Baixo Mondego também contesta esta decisão e prevê dar uma conferência de imprensa sobre este assunto no início da próxima semana.

O presidente da Câmara da Figueira da Foz, João Ataíde (eleito pelo PS), recorda que a linha que liga a sua cidade à Pampilhosa (onde entronca nas linhas do Norte e da Beira Alta) é a ligação mais directa para Espanha. "E a nós interessa-nos aprofundar as relações entre o centro e Castela e Leão, numa perspectiva de Europa das regiões", disse ao PÚBLICO.

O autarca diz que esta infra-estrutura ligada à linha do Oeste constitui um by -pass à linha do Norte e pode ser reactivada com um investimento reduzido, pois os comboios de mercadorias não precisam de andar muito depressa. O porto da Figueira da Foz está presentemente a sofrer obras que visam permitir a entrada a navios com maior calado, o que torna mais premente a ligação ferroviária directa com a Beira Alta e com a linha do Norte.

O seu colega de Cantanhede lembra que a decisão de não se avançar com o TGV entre Lisboa e o Porto reforça a necessidade de existir um corredor ferroviário pelo litoral, paralelo à congestionada linha do Norte. E recorda que é possível ir da Pampilhosa para Lisboa via Figueira da Foz e linha do Oeste. "Essa linha já existe, só tem que ser dinamizada", conclui.

Promessas que ficaram por cumprir
 
 

A linha Figueira da Foz-Pampilhosa foi subitamente encerrada em Janeiro de 2009, por indicação da então secretária de Estado dos Transportes, Ana Paula Vitorino, que apontou problemas de segurança à linha que prometeu reabrir, uma vez modernizada.
 
 

A Refer chegou a anunciar um investimento, nunca quantificado, que incluía "a substituição integral da superestrutura de via". Declarou que era seu objectivo fazer com que a linha viesse "a constituir um elo importante nas cadeias logísticas que apoiam o desenvolvimento do porto da Figueira da Foz" e garantisse "ligações ferroviárias eficazes no contexto nacional e ibérico".