João Lobo Antunes diz que testamento vital não pode deixar de fora as demências

“Sou favorável ao testamento vital e não tenho dúvida de que é importante que esteja plasmado em lei”, afirmou João Lobo Antunes, ouvido hoje na Comissão de Saúde no âmbito da audição de vários especialistas sobre esta matéria.

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“Sou favorável ao testamento vital e não tenho dúvida de que é importante que esteja plasmado em lei”, afirmou João Lobo Antunes, ouvido hoje na Comissão de Saúde no âmbito da audição de vários especialistas sobre esta matéria.

O testamento vital permite que uma pessoa deixe previamente expressa a sua vontade quanto ao futuro em caso de doença incapacitante e João Lobo Antunes considerou fundamental que se respeite esta “autonomia”.

Contudo, lembrou que se trata de uma “autonomia prospectiva” e que o que actualmente existe em projecto de lei, para a criação de um testamento vital, “esquece um problema que vai ser o problema maior: a demência”.

As propostas apresentadas pelos partidos estão muito viradas para os casos de inconsciência permanente, como os estados de coma, e deixam de fora as demências como o Alzheimer.

“O legislador devia alargar o conceito para os doentes e cumprir este aspecto, que vai ser decisivo nas próximas décadas”, afirmou o antigo membro do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida.

Especificamente sobre o que está previsto nos projectos de lei para o testamento vital, Lobo Antunes concordou que “faz sentido” a ideia da autonomia/responsabilidade partilhada e manifestou-se “muito a favor” da figura do procurador de saúde.

No entanto, defendeu que seja também consagrada a possibilidade de o médico assistente de um doente participar na sua tomada de decisão.

Para Lobo Antunes a base da relação entre o médico e o seu paciente deve ser a “confiança”. Por isso, gostaria de ver esse “conceito de confiança”, que na sua opinião é “fundamental”, reforçado nos documentos legais.

O neurocirurgião reconheceu que uma das maiores dificuldades da criação de um documento desta natureza é o facto de as pessoas mudarem de opinião.

“Um dos maiores obstáculos é que as pessoas mudam de opinião, e mudam de opinião com a maior das frequências, mudam-na de ano para ano”, afirmou, entendendo por isso que é “difícil” estabelecer um prazo.

Durante a sua audição, João Lobo Antunes deixou também claro que é contra a junção, na mesma legislação, do consentimento informado com o testamento vital.

No final, e sobre as questões jurídicas implicadas na elaboração do documento, o médico afirmou que “está a acontecer uma coisa terrível em medicina, que são os especialistas em direito médico”.

“Há uma série de aspectos fundamentais que não são legisláveis. Estão na consciência individual das pessoas”, salientou.