Robert Murat continua a ser ameaçado de morte e perdeu o sentido à vida

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Murat acusa os jornais ingleses de não quererem saber a verdade Virgílio Rodrigues

"Eu também tenho uma filha", diz Robert Murat, a recordar Sofia, de sete anos, que vive em Inglaterra com a mãe. "A minha família foi igualmente vítima - os jornalistas invadiram a localidade onde moram, e a polícia britânica teve de levar a minha filha para um lugar seguro." A ex-mulher, diz, "chegou a ter uma oferta de 220 mil euros para dar uma entrevista a dizer que eu era pedófilo". Não cedeu. Robert Murat, em defesa da sua honra e bom nome, mandou processar 13 órgãos de comunicação britânicos. Recebeu uma significativa indemnização, mas não revela a quantia.

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"Eu também tenho uma filha", diz Robert Murat, a recordar Sofia, de sete anos, que vive em Inglaterra com a mãe. "A minha família foi igualmente vítima - os jornalistas invadiram a localidade onde moram, e a polícia britânica teve de levar a minha filha para um lugar seguro." A ex-mulher, diz, "chegou a ter uma oferta de 220 mil euros para dar uma entrevista a dizer que eu era pedófilo". Não cedeu. Robert Murat, em defesa da sua honra e bom nome, mandou processar 13 órgãos de comunicação britânicos. Recebeu uma significativa indemnização, mas não revela a quantia.

Apesar das pressões e das ofertas monetárias para que falasse - ofereceram-lhe mais de 300 mil euros para se deixar filmar e falar sobre o caso Maddie -, calou-se. Agora, depois do livro A Verdade da Mentira, de Gonçalo Amaral, o responsável pela coordenação da investigação deste caso, ter visto a sua venda proibida por ordem do Tribunal Cível de Lisboa, e de os jornais britânicos voltarem ao assunto com a divulgação de imagens que alegadamente a polícia portuguesa descurou, decide falar ao PÚBLICO.

Desde que se viu envolvido neste processo, Robert Murat ainda anda à procura de um rumo a dar à sua vida. "Passei por situações horríveis. Ainda há pouco tempo, recebi uma carta com ameaça de morte, escrita em inglês, enviada de França." Quando se desencadeou este caso, preparava-se para montar uma empresa na net na área do imobiliário, "mas ficou tudo desactivado".

Entretanto, casou com uma luso-britânica, foi aos EUA, em viagem de núpcias, no final do ano passado, mas não passou incógnito: "Aqui sinto o desconforto de ver pessoas a apontarem para mim, mas lá também fui reconhecido".

Não é de estranhar. Os apelos para encontrar Madeleine McCann continuam e os pais mantêm a convicção de que a filha está viva. Por isso, criticaram a investigação conduzida pelas autoridades portuguesas, por deixarem cair a tese do rapto. Desde Marrocos aos Estados Unidos, passando por Espanha e Holanda, foram às centenas as informações encaminhadas para a PJ, dando conta de crianças alegadamente parecidas com Maddie. Correram notícias sobre os vários aparecimentos da menina e foi feita uma oferta de 2,5 milhões de euros a quem fornecesse informações.

De testemunha a arguido

Robert Murat acusa os media de terem "fabricado" notícias em busca de audiências. "Não queriam saber da verdade." "Tenho pessoas conhecidas na BBC que me disseram: "Cale-se, porque eles vão virar isto tudo"". O seu advogado, Francisco Pagarete, deu-lhe o mesmo conselho. "Essa foi a principal razão porque não falei até agora, mas foi muito difícil."


A sua vida e dos familiares - um irmão e uma irmã, que vivem em Inglaterra -, "foi vasculhada e recheada de mentiras". No Verão de há três anos, a Praia da Luz transformou-se numa batalha campal entre as principais cadeias de televisão do mundo, na luta pelas audiências. "Houve uma grande pressão dos media ingleses para obrigarem a polícia portuguesa a apresentar um rosto", diz Robert Murat, lamentando a sua sorte: "Quis ajudar, acabei por ser apontado como suspeito".

Este inglês, que fez a escola em Portugal, afirma: "Sempre gostei de ajudar as pessoas, é o meu feitio". Em Inglaterra, onde residiu durante 15 anos e trabalhou como vendedor de automóveis, também colaborou com as autoridades britânicas. "Fui tradutor da polícia e no tribunal."

Quando se deu o desaparecimento da criança na Praia da Luz, a 3 de Maio de 2007, tinha regressado dois dias antes ao Algarve para lançar a empresa Romigen. Participou nas buscas e foi, juntamente com a mãe, uma das pessoas que mobilizaram a comunidade local para encontrar a menina.

Passados 11 dias, entrou como testemunha nas instalações da Polícia Judiciária em Portimão, saiu como arguido. Sobre o interrogatório a que foi submetido, recorda: "Fazia-me lembrar um filme do KGB, senti que me estavam a tentar tramar". Porém, reconhece que a PJ "sofreu muita pressão para encontrar um culpado". Ele, cidadão inglês, que desempenhou, primeiro, o papel de tradutor junto da GNR, depois da própria PJ, "a seu pedido", foi aquele que melhor encaixou nas notícias que iam sendo divulgadas: "Fui o bode expiatório", enfatiza. Os media ingleses, evoca, "já vinham a dizer que iria haver desenvolvimentos antes de ser constituído arguido". Uma jornalista britânica disse que Robert Murat tinha comportamentos "estranhos" e denunciou-o à Judiciária.

Ele e mãe, uma enfermeira, de 73 anos, foram duas das pessoas que estiveram na primeira linha da campanha de solidariedade que se desencadeou à volta do casal McCann. Ao lado da GNR, ou de forma independente, muitas pessoas participaram em sucessivas buscas, nos arredores de Lagos, à procura de Maddie. Mas o esforço não foi reconhecido, acusa. "Há uma coisa que, de certa forma, me desagrada - às pessoas que andaram envolvidas nas buscas, ninguém disse obrigado". Quem acha que devia ter agradecido? "Isso não tem a ver comigo, mas acho que alguém devia ter dito obrigado."